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Fonte: AESP -
Associação das Emissoras de Rádio e TV do Estado de São Paulo - Origem: O Estado
de S.Paulo - Economia & Negócios
[21/10/07] A
polêmica do rádio digital no Brasil - por
Ethevaldo Siqueira
Para o Ministério das Comunicações, a escolha do padrão de rádio digital
deveria ter sido feita em setembro. E tudo fazia crer que opção seria pela
tecnologia In band on channel (Iboc), criada pela empresa norte-americana
Ibiquity. Hoje, já não há tanta certeza nesse padrão porque os testes conduzidos
pelas emissoras não satisfazem às exigências mínimas de qualidade.
As próprias autoridades federais estão chegando à conclusão de que a tecnologia
Iboc para o rádio digital ainda apresenta numerosos problemas. Sua adoção nos
Estados Unidos, depois de vários anos, não obteve a adesão de mais do que 10%
das emissoras daquele país. Diferentemente do rádio digital via satélite, uma
forma de rádio por assinatura que faz sucesso entre os norte-americanos, a
radiodifusão digital aberta está longe de alcançar a maioria da população.
Depois de ter participado de audiência pública no Senado, na terça-feira
passada, André Barbosa Filho, assessor especial da Casa Civil da Presidência da
República, revelou sua preocupação com as possíveis conseqüências da adoção de
um padrão de rádio digital que ainda está sujeito a interferências, que tem
reduzido alcance do sinal, falta de sincronia entre as transmissões analógicas e
digitais e que impossibilita o uso de receptores portáteis por causa do
excessivo consumo de baterias.
Se for adotada pelo Brasil nesse estágio, essa tecnologia pode trazer muito
mais conseqüências negativas do que benefícios às emissoras e aos ouvintes.
Depois de debater diversos temas da legislação de comunicação eletrônica com
especialistas, na Comissão de Educação do Senado, André Barbosa tomou
conhecimento dos obstáculos que ainda impedem a digitalização das transmissões
em amplitude modulada (AM) e freqüência modulada (FM) e sugeriu o adiamento por,
pelo menos seis meses, para que o governo decida pelo padrão a ser adotado.
Essas conclusões contrariam frontalmente as avaliações anteriores do Ministério
das Comunicações, que tem defendido a tecnologia Iboc como a mais adequada para
a radiodifusão brasileira. André Barbosa reconhece ainda que não há critérios
uniformes nos testes conduzidos pelas emissoras. E para que essa avaliação seja
isenta e confiável, seria necessário que o governo constituísse um grupo
incumbido de testar e comparar os resultados da tecnologia Iboc com outros
padrões, com a participação majoritária de cientistas e acadêmicos da
Universidade brasileira e do CPqD.
O assessor lembrou ainda que “a Casa Civil não quer tomar nenhuma decisão de
afogadilho” e que o ministro das Comunicações, Hélio Costa, está ciente das
preocupações do governo, tendo sugerido até a visita de uma delegação brasileira
aos Estados Unidos para reunir-se com representantes das emissoras de rádio, de
universidades e do órgão regulador americano, a Comissão Federal de Comunicações
(FCC, na sigla em inglês).
MINHA EXPERIÊNCIA
Participei também como convidado, na semana passada, da mesma reunião da
Comissão de Educação do Senado, e debati essa questão com senadores e com André
Barbosa.
Na oportunidade, relatei minha experiência pessoal com receptores digitais do
padrão Iboc que instalei em meu automóvel, em São Paulo. Citei, então, os três
maiores problemas detectados, na transmissão FM:
1) atraso de oito segundos entre o sinal analógico e o digital, causando a
repetição ou a eliminação de palavras essenciais ao entendimento de notícias ou
à audição de música;
2) ocorrência de ruídos e interferências em canais vizinhos, tanto em AM como
em FM, especialmente à noite;
3) diferença de alcance das transmissões analógicas e digitais: como o sinal
digital tem alcance 40% menor, surgem problemas de instabilidade no limite das
duas transmissões.
A maior limitação, no entanto, é a impossibilidade atual de se produzirem
receptores portáteis, porque o consumo de energia do padrão Iboc é tão grande
que descarrega as baterias em duas ou três horas. Os receptores têm que
permanecer plugados no carro ou na tomada doméstica, para funcionar.
Num país onde a maioria é pobre, não será fácil convencer os ouvintes a comprar
um novo receptor analógico-digital, para usufruir as vantagens futuras da nova
tecnologia. Nesse aspecto, parecem remotas as perspectivas de produção de
receptores digitais do padrão Iboc pela indústria brasileira por preços
acessíveis à grande maioria da população. Nos Estados Unidos, mesmo com a escala
já alcançada e subsídios dados pelas cadeias de rádio, o receptor custa cerca de
US$ 150 para o consumidor. No Brasil, dificilmente seria vendido por menos de R$
400.
O rádio é praticamente a última forma de comunicação eletrônica a ser
digitalizada em todo o mundo. No entanto, para surpresa de muitos, tem sido a
mais difícil. O maior desafio é transmitir simultaneamente, no mesmo canal de
freqüência, tanto o programa analógico quanto o digital. A única tecnologia que
se propõe a fazê-lo até aqui é a da Ibiquity. Mas a empresa não conseguiu até
agora eliminar os problemas identificados no Brasil e nos Estados Unidos.