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Fonte: Portal G1 - Coluna do Silvio Meira
[15/09/07]   Rádio Digital: a indústria acorda - por Silvio Meira
 
O processo de escolha do padrão brasileiro de rádio digital andava meio morno. Parece que os interessados estão começando a dizer o que querem. Mas querem muito pouco...
 
A ABINEE, associação nacional dos fabricantes de produtos eletro-eletrônicos, está começando a entrar no debate sobre a escolha do padrão brasileiro de rádio digital. O representante da indústria na audiência pública da Câmara dos Deputados sobre os testes com os padrões de rádio digital disse recentemente que... "Não vejo a intenção dos americanos (do padrão IBOC) em transferir tecnologia. A questão da transferência de conhecimento precisa ser negociada inclusive para que os preços dos produtos atendam a realidade do país. Se isso não acontecer, estamos fadados a extinção” .
 
Nós, no caso, são os fabricantes nacionais de transmissores de rádio, segundo a ABINEE responsáveis por 90% do mercado brasileiro de rádio analógico. O padrão IBOC é fechado, propriedade de uma empresa, que cobra para que se fabrique ou use equipamentos que dependem de sua propriedade intelectual. No que está muito certa, por sinal: arriscou, investiu e quer seu rico dinheirinho de volta.
 
Pelo andar da carruagem, quem vai errar, de novo, é o Brasil. A preocupação da indústria é a fabricação -- agora -- de equipamentos e a correspondente receita, no mercado, de preferência fechado à competição internacional. A das emissoras, principalmente as pequenas, também explicitada no debate da Câmara, é do custo de transição do sistema de transmissão analógica para o digital. Como não poderia deixar de ser, há promessa de financiamento público, facilitado, para que isso aconteça. Se o leitor não sabe, quase toda estação de rádio tem um deputado, senador ou, de resto, político por trás. Até Renan tem pelo menos uma. Mesmo que não seja no nome dele. Mas isso é outra história, outro processo. Voltemos à nossa discussão.
 
Do ponto de vista de uma política para rádio digital, o que o Brasil deveria estar fazendo? Deveríamos pensar no mundo e no futuro. Ao contrário do que fizemos em TV digital, ao desenhar um mercado digital semelhante ao definido pela nossa escolha analógica por PAL-M. Nosso padrão de TV digital, como o analógico, é brasileiro mesmo: só vai existir aqui. Mas... como pensar grande?
 
O Brasil é grande o suficiente para ter um impacto considerável na globalização de qualquer padrão. Somos quase 200 milhões e nosso mercado interno de produtos universalizáveis, como rádio ou TV, é significativo. Ocorre que nenhum dos fabricantes locais de produtos eletrônicos é global ou capaz, minimamente, de interferir de fato em padrões mundiais. Até agora, justamente por causa disso, nossos fabricantes olham somente para o mercado interno; sabem que não conseguirão competir no externo. Em certos casos, não terão licenças, que seja, para produzir daqui para outros mercados.
 
Uma política real para o Brasil, no cenário de rádio e convergência digitais, é nos associarmos a padrões abertos que tenham a chance de se tornarem realmente globais (o que não é o caso, definitivamente, do padrão IBOC). E fazer isso em dois passos: 1) introduzir, aqui, o estado da prática de um padrão global, seja lá qual escolhermos, sem nenhuma modificação e 2) participar, desde já, da criação da próxima versão de tal padrão, fazendo acordos e criando condições para introdução de conhecimento e propriedade intelectual nacionais nas versões futuras, para o que é necessário um investimento alinhado, entre governo, academia e indústria, em inovação e empreendedorismo.
 
Trazer um padrão aberto, global, não modificado, nos faria entrar na escala global de custos e investimento em sistemas e dispositivos. Tirar, daí, recursos para investir na evolução do próprio padrão é questão de inteligência e sobrevivência. Só que nossas decisões recentes de política industrial não primam por nenhuma destas qualidades. No caso de rádio digital, agora é esperar pra ver. Ou nem isso: a indústria parece só querer saber o que vai fabricar agora, as estações dinheiro bom e barato para trocar os transmissores e o governo, até agora, não tem política e estratégia, de mercado ou indústria, do tamanho do Brasil, para se contrapor às pressões e criar uma visão de mundo. Nihil novum super terram...