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Leia na Fonte: AMARC Brasil
[31/01/13]
Rádio Digital: padrão será escolhido no Brasil em 2013? - por Arthur William
* Arthur William é representante no Brasil da Associação Mundial de Rádios
Comunitárias (Amarc) e integra o Conselho Consultivo do Rádio Digital.
Com atual lei, digitalização não é possível para rádios comunitárias
DRM, IBOC, HD Radio, DMB, DAB, ISDB-TSB… a digitalização do rádio parece uma
sopa de letrinhas restrita a engenheiros e se arrasta há anos. Em 2012, o
Ministério das Comunicações realizou testes e criou um Conselho Consultivo, o
que parecia dar um desfecho para a novela. Porém uma série de lacunas,
principalmente para as rádios comunitárias, ainda dificulta a decisão por um
padrão de rádio digital no Brasil.
1 – Faltam critérios para análise dos testes
A primeira falta é de critérios para a análise dos testes. A Portaria 209 de
2010, que criou o Sistema Brasileiro de Rádio Digital (SBRD), define 14
objetivos do serviço, mas a orientação do Ministério é que os testes sejam
avaliados levando em conta apenas aspectos técnicos, como alcance e robustez do
sinal. Um desperdício de tempo para o Conselho que reúne empresários e
movimentos sociais, além de ser um fator que empobrece o debate sobre a
importante escolha do rádio digital, a qual deve orientar dezenas de países em
suas decisões, como ocorrido no caso da TV Digital e já revelado informalmente
por integrantes dos governos do Chile e Angola.
Foram criadas três comissões no Conselho Consultivo de Rádio Digital: Análise de
Testes; Inovação Tecnológica; e Políticas Industriais. Assim como o Conselho,
sem prazo definido para término dos trabalhos e sem abordar objetivamente os
critérios da Portaria do SBRD como transferência tecnológica, melhor uso das
frequências, custos reduzidos e interatividade.
Há ainda os novos parâmetros definidos pelo chamado Marco Regulatório das
Comunicações, cujo texto está com o Ministério e sua divulgação é prometida há
mais de dois anos. O processo do rádio digital poderia corrigir problemas como
monopólio dos meios comerciais, venda\aluguel de frequências, concessão para
políticos e pouca oferta de emissoras públicas\comunitárias, mas sem uma nova
lei geral como a da Argentina, vamos continuar trabalhando com base em
referências legais ultrapassadas dos pontos de vista político e histórico.
2 – Digitalização impossível para Rádios Comunitárias
A Lei de Rádios Comunitárias (9.612 de 1998) é conservadora e o processo de
atualização tecnológica só reforça isto. Como não há permissão para publicidade
do comércio local e fundo público para financiamento das rádios, as comunitárias
não têm condições de se digitalizarem. Os equipamentos de transmissão são caros
e, sem mecanismos de sustentabilidade, será impossível uma migração tecnológica
para essas estações.
Hoje no Brasil, há mais emissoras comunitárias que comerciais: são mais de 4600
estações. Uma política pública para garantir a sustentabilidade financeira das
comunitárias e subsidiar os equipamentos contribuiria decisivamente para o
sucesso do rádio digital no país. Sem isso, apenas as poucas grandes redes
migrariam para o digital, deixando de fora as comunitárias, além das pequenas e
médias rádios comerciais.
Outro ponto é a incompatibilidade dos testes com a realidade das rádios
comunitárias. No Brasil, a lei diz que são emissoras de muita baixa potência
(25W) e que dividem uma mesma frequência. Se no analógico, uma programação acaba
interferindo na outra gerando o que chamamos de “linha cruzada”, no digital
nenhum dos áudios seria ouvido. Esse teste de interferência de cocanal não foi
realizado, por exemplo. Além disso, os testes do Recanto das Emas
(cidade-satélite de Brasília) e de Xerém (zona rural de Duque de Caxias-RJ) não
conseguem reproduzir a realidade de grande parte das comunitárias, que ficam em
ambientes urbanos repletos de interferências. Como no digital a potência é bem
menor que a analógica, ruídos urbanos podem gerar um verdadeiro “apagão” das
rádios comunitárias que já operam em muita baixa potência nas transmissões
analógicas.
A participação nas reuniões gerais e temáticas não é garantida pelo Ministério
das Comunicações, além disto setores essenciais para o debate ficaram de fora do
Conselho, como academia e radialistas. Consequência disto é a frequente
impossibilidade de participação de conselheiros e interessados de fora de
Brasília, seja por limitações financeiras de determinado grupo ou devido à
dificuldade de liberação do trabalho.
As reuniões não são transmitidas pela internet, ou seja, quem não pode ir à
capital federal fica de fora do debate. O Ministério criou um espaço em seu site
para divulgar os documentos e permite a presença de ouvintes nas reuniões, mas é
preciso mais transparência e mecanismos de participação nas discussões.
3 – Convergência, interatividade e Ondas Curtas
Outras lacunas permanecem existindo, contudo seus esclarecimentos podem definir
uma escolha segura entre os dois padrões testados (DRM e HD Radio\IBOC), já que
o resultado das análises técnicas mostrou poucas diferenças entre eles.
O Ministério não realizou nenhum teste oficial de Ondas Curtas e a EBC (Empresa
Brasil de Comunicação), que administra a Rádio Nacional da Amazônia, solicitou a
digitalização destas transmissões, mas não obteve resposta. Apenas o padrão
europeu DRM possui rádio digital em OC atualmente.
Outro interesse é que o rádio digital possua interatividade como a da TV
Digital. O Ginga (middleware responsável pela interatividade na TV) já foi
demonstrado em funcionamento com o DRM durante uma reunião do Conselho. Já o HD
Radio\IBOC disse também possuir a capacidade, mas ainda não realizou nenhuma
exibição pública.
A convergência com outros sistemas e aparelhos é outro ponto essencial para o
sucesso do rádio digital, que se permanecer isolado em um receptor próprio, como
o rádio AM, tende a entrar em crise rapidamente. O DRM possui tecnologia de
áudio similiar à usada pela TV Digital brasileira, o que facilitaria a criação
de receptores conjuntos, como também a audiência em smartphones. O mesmo já
acontece no Japão e na Coreia do Sul com o ISDB-Tsb e o DMB\DAB+,
respectivamente, padrões que não foram testados no Brasil. Já o HD Radio\IBOC
diz ter a potencialidade de convergência, mas nada comprovado ainda.
Será que 2013 vai ser o ano do Rádio Digital no Brasil? A próxima reunião do
Conselho Consultivo está marcada para 28 de fevereiro, depois do Carnaval.
Estamos perto de uma definição, mas sem o esclarecimento dos pontos acima, a
escolha poderá não atender a interesses públicos e muito provavelmente resultará
na decadência de um dos mais importantes meios de comunicação.