O governo está costurando um projeto para criar uma mega rede de
telecomunicações utilizando os 16 mil quilômetros de fibras ópticas da
combalida Eletronet, empresa criada pela AES Bandeirante Empreendimentos no
auge da bolha da internet.
A empresa faliu em 2003 e o objetivo, quando foi criada entre 1999 e 2000,
era vender serviços de transmissão de dados em alta velocidade.
A Eletrobrás é sócia do negócio que utiliza as linhas de transmissão das
empresas controladas pela estatal, que tem 49% das ações da Eletronet por
meio da LightPar.
A Eletrobras é também uma das empresas credoras da massa falida.
Boa parte do projeto da infovia está sendo idealizado na Casa Civil.
A proposta é que a infra-estrutura seja utilizada pelo governo, que
questiona os preços praticados pelas empresas privadas de telecomunicações.
O projeto tem o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) envolvido
e a estratégia seria utilizar para criação de uma rede para atender escolas
públicas e as Forças Armadas.
O Ministério de Minas e Energia está hoje com a proposta, que prevê a
compra, pela Eletrobrás, das dívidas da Eletronet com deságio.
Na estatal, tem havido dissidência com relação ao plano. O presidente
interino, Valter Cardeal, evita o assunto. Procurado pelo Valor desde
sexta-feira, por meio da assessoria de imprensa, não respondeu às perguntas
sobre o andamento das negociações, a estruturação do negócio e nem o
montante de investimentos que está sendo discutido.
Procurado, o ministro Silas Rondeau disse ontem que o assunto ainda está
discutido e por enquanto ele prefere não se pronunciar. Para tornar o
projeto operacional será necessário equacionar a dívida da Eletronet.
As condições estudadas até agora seriam tão desfavoráveis para a Eletrobrás
que teriam motivado o pedido de demissão, na quinta-feira passada, de José
Drumond Saraiva da diretoria financeira da Eletrobrás e da presidência
interina da Eletrosul.
Oficialmente, Saraiva alegou motivos pessoais, mas fontes próximas ao
executivo disseram ao Valor que a Eletronet foi preponderante.
Essa é uma das perguntas que o presidente interino da Eletrobrás ainda não
respondeu.
A Eletronet está em processo de falência conduzida pelo advogado Isaac
Zveiter .
Tinha em 2003 uma dívida de R$ 600 milhões.
A maior parte é devida à Furukawa e à americana Lucent, hoje Alcatel-Lucent,
pois se fundiu com a empresa francesa.
Mas há informações de que já prosperou negociação para ajuste do valor, que
pode cair para um valor entre R$ 130 milhões a R$ 160 milhões.
Para as empresas haveria ganho, porque já teriam contabilizado a dívida como
não paga.
Em 2003, a AES entregou a Eletronet para a Eletrobrás, que declarou em
seguida a falência da empresa.
O presidente da Eletrobrás naquela época, Luis Pinguelli Rosa, reiterou
diversas vezes que a estatal não assumiria a dívida da empresa com os
fornecedores.
Sabendo do movimento do governo, entre as operadoras de telecomunicações o
estágio atual é de espera até que sejam procuradas pelo governo.
As empresas identificaram que a ação está avançada com a notícia publicada
em 23 de março pelo site especializado em telecomunicações Telesíntese,
praticamente replicada no blog do ex-ministro José Dirceu.
Um executivo do comando de uma das concessionárias de telefonia disse ao
Valor que acha qualquer processo de reestatização muito ruim, mesmo se a
causa for pela educação.
Para ele, a operação sinaliza uma ação parecida com as da Venezuela, de Hugo
Chávez e da Bolívia, de Evo Morales, que ontem estatizou a operadora de
telefonia.
Este executivo, que pede para não ser identificado, informou que há cerca de
18 meses as operadoras foram procuradas para fazer proposta no sentido de
atender ao projeto do governo federal de interligar com banda larga as
escolas públicas de todo país.
Fizeram proposta, mas as negociações não prosperaram. As operadoras
estimaram custo de R$ 1,5 milhão na montagem da infra-estrutura de rede de
banda larga para as escolas.
Em relação aos computadores, a sugestão foi de que deveriam ser licitados
pelo governo. Mas as estimativas de gastos com o uso da infra-estrutura da
Eletronet dão conta de que só com a interligação da rede de banda larga
seriam necessários R$ 4.5 bilhões, pois a rede da Eletronet não tem, em
vários pontos, infra-estrutura em torno da chamada última milha, a chegada
no ponto do acesso. E quanto aos computadores os números que circulam
indicam que seriam necessários R$ 5,5 bilhões.