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Fonte:
Observatório do Direito à Comunicação
[29/11/07]
Porque a volta da Telebrás é uma boa notícia - por Vilson Vedana
* Vilson Vedana é consultor legislativo da Câmara dos Deputados e foi membro do
Conselho Consultivo da Anatel
O Governo anunciou, em diversos pronunciamentos de ministros, neste mês de
novembro/2007, que vai reativar a Telebrás para que ela explore uma rede
nacional interurbana de telecomunicações para unir todos os municípios
brasileiros.
Isto é uma boa notícia porque, paradoxalmente, a volta da estatal na prestação
de serviços de telecomunicações não significa a volta do monopólio do Estado,
mas a instauração efetiva da concorrência entre as empresas prestadoras de
telefonia, de banda larga para acesso à Internet e outros serviços.
Esta é, dependendo da forma de sua implementação, a melhor notícia para as
telecomunicações brasileiras desde aprovação da Lei Geral de Telecomunicações em
1997.
No Brasil, após 10 anos da privatização do sistema Telebrás, a infra-estrutura
interurbana de telecomunicações brasileira é deficiente, e está impactando a
Inclusão Digital e o próprio desenvolvimento econômico e social do País. Além
disso, embora a telefonia fixa chegue a mais de 34 mil localidades com mais de
100 habitantes, a telefonia móvel só chega a pouco mais da metade da sede dos
5.564 municípios brasileiros e uma banda larga para a Internet só pode ser
assinada na cidade sede de menos de 1.000 municípios, os maiores.
A penetração de banda larga no País é muito baixa, mesmo quando comparada com
países como México, Chile e Argentina. No Brasil ela só chega da 5,6 milhões dos
54,6 milhões de domicílios e tem, por exemplo, um preço médio duas vezes
superior ao da Argentina. Na Europa, uma assinatura com capacidade de 2 Mbps
custa cerca de 10 euros (R$ 26,00) mensais. No Brasil custa três vezes mais, sem
contar que aqui conexões a velocidades inferiores a 1 Mbps, as mais usadas,
custam proporcionalmente muito mais caro (por Kbps). É difícil encontrar uma
conexão por menos de R$50,00 mensais.
Além de deficiente, a infra-estrutura de telecomunicações é um monopólio das
concessionárias da telefonia fixa, que detêm praticamente toda a infra-estrutura
de telecomunicações do País. Isto é agravado pela falha da atuação da Anatel,
que não conseguiu instituir a desagregação das redes, isto é, permitir que
qualquer um usasse a rede das concessionárias pagando um preço justo, ou mesmo,
simplesmente, definir preços de conexão (backhaul) para que qualquer um pudesse
montar seu sistema local de provimento de banda larga e conectá-lo à rede das
concessionárias. Só há regras razoáveis para a interconexão de telefonia. A
Anatel, de forma equivocada em nosso entender, implementou a LGT como uma Lei da
telefonia e não das telecomunicações, o que ajuda a explicar o atraso na banda
larga. A Anatel não percebeu que o serviço do futuro, o mais desejado e o mais
necessário para a população, não é mais a telefonia, mas a banda larga, mesmo
porque ela pode conter a telefonia.
Como exemplo citamos o caso de Duas Barras – RJ. A Prefeitura local alugou da
Telemar uma conexão dedicada de 2 Mbps por R$4.315,87,00 mensais, montou um
sistema de Internet local sem fio (WiFi) e passou a fornecer o acesso gratuito a
toda a população. Com o aumento de usuários, surgiu a necessidade de expansão da
conexão. Após longa insistência, a Telemar propôs, em 17/10/2006, o preço de
R$17.678,34 por 4 Mbps. A cidade ficou sem expansão, ante o preço extorsivo,
pois não há outra opção.
O fato é que nas telecomunicações brasileiras não há concorrência, à exceção da
telefonia móvel. Mesmo aí ela é relativa, pois os proprietários das empresas
fixas e móveis são praticamente os mesmos. A telefonia fixa ainda é,
basicamente, um monopólio das concessionárias, que detêm 92% das linhas. A mesma
coisa ocorre com a banda larga: 75% são via linha telefônica (ADSL), dominadas
pelas concessionárias da telefonia local e 21% via TV a Cabo, onde o domínio é
da NET/Embratel, esta também uma concessionária de telefonia (Longa Distância).
A Telebrás irá usar os cabos de fibras óticas das empresas de transmissão de
energia elétrica, da Petrobrás e outros. Como os cabos de fibras óticas
transmitem informação por pulsos de luz e não por ondas eletromagnéticas, as
comunicações não são afetadas por interferências causadas por condutores de alta
tensão. Isto fez com que se desenvolvessem cabos para a transmissão de energia
elétrica em alta tensão cujo centro é um cabo de feixes de fibras óticas. O
custo final da rede elétrica é pouco afetado, pois toda a infra-estrutura teria
que ser construída da mesma forma. Isto foi feito no Brasil, nos últimos anos, e
há uma grande rede de cabos de fibras óticas cobrindo o País, bastando apenas
instalar os equipamentos iluminadores das fibras nas pontas para se ter uma rede
de alta capacidade de telecomunicações. No Paraná, por exemplo, a rede de fibras
óticas da Companhia Paranaense de Eletricidade só não chega à sede de 7
municípios. Os cabos de fibras óticas da Petrobrás foram instalados nos
oleodutos, quando da sua construção e têm, também, grande extensão.
Para entender porque a volta da Telebrás não é a volta do monopólio estatal, mas
a efetiva instauração da concorrência, é preciso entender que as
telecomunicações se compõem de dois sistemas: O Sistema de Longa Distância, que
pode ser dividido em Interurbano e Internacional e o Sistema Local, em cada
cidade, chamado também de Sistema de Última Milha, por ser o que faz a ligação
com o usuário final.
Entendemos que a nova Telebrás deve se limitar ao backhaul (no Sistema de Longa
Distância, especialmente a interurbana nacional), não entrando na última milha.
Com isso ela passará a colocar a conexão (backhaul) à disposição de todos os
interessados, a preços justos, baseados em custos, e não discriminatórios.
Teremos, assim, uma efetiva neutralidade da rede interurbana - o que não ocorre
hoje, seja por alguma deficiência da LGT, seja pela não atuação da Anatel - o
que instalará a concorrência efetiva entre os operadores de última milha.
Com conexão abundante, neutra e a preço justo, qualquer um poderá montar um
sistema local, seja de telefonia fixa, seja de telefonia via Internet (VoIP),
seja de banda larga. Com isso se evitarão casos como os de Duas Barras – RJ. As
cerca de 60 empresas de telefonia fixa concorrentes das concessionárias (as
chamadas “espelho” e “espelhinho”) poderão concorrer efetivamente com as
concessionárias, a telefonia VoIP ganhará grande impulso, a banda larga também,
o mesmo ocorrendo com os novos serviços de telecomunicações que surgem a cada
dia, tudo acompanhado de uma grande queda nos preços dos serviços de
telecomunicações, absurdamente caros no Brasil, para o que os altos impostos
também muito contribuem.
Com a “nova” Telebrás, a concorrência se instalará duplamente, tanto na última
milha, como vimos, pois serão viabilizadas milhares de pequenas empresas, muitas
restritas a uma só localidade, quanto na infra-estrutura interurbana, aqui entre
as concessionárias e a Telebrás. Afinal, com a entrada da Telebrás no segmento
interurbano, as teles, para não perder mercado, terão que investir, melhorar os
serviços e baixar os preços. Este costuma ser o resultado da concorrência.
Um dos benéficos resultados será a Inclusão Digital da população brasileira, não
só com Internet nas escolas e Telecentros, benéficos, sem dúvida, mas de
resultados limitados na Inclusão Digital, que é a Internet na casa das pessoas.
Será possível fornecer a Internet a preços justos para quem pode pagar por
velocidades mais altas, e uma Internet básica para todos, gratuita, fazendo,
para esta última, bom uso dos recursos do FUST – Fundo de Universalização dos
Serviços de Telecomunicações, para o que é preciso mudar a lei.
Preços de backhaul justos tornarão possível implantar, a nível nacional, a
experiência do pequeno município paulista de Sud Mennucci, hoje seguido por uma
dezena de pequenos outros municípios, de levar a Internet gratuita, a uma
velocidade limitada, a todas as casas. Desde 2002 a prefeitura locou uma conexão
junto à Telefonica e implantou um sistema sem fio de acesso à Internet, gratuito
para todos. Hoje, metade das casas tem computador conectado à Internet, média
igual a de muitos países desenvolvidos. No Brasil a média é 20% (a metade com
Internet Discada). Hoje o preço do computador ajuda na Inclusão Digital. Há no
mercado computador, com monitor de LCD, a R$899,00, em suaves prestações.
As reações serão fortes. O monopólio é um filé saboroso e quem o tem quer
saboreá-lo diariamente. O irônico da situação é que o monopólio, agora privado,
será quebrado com a volta de uma empresa estatal. Como a Anatel não cumpriu sua
missão na desagregação de redes e em obrigar as concessionárias a disponibilizar
o backhaul universal e a preços justos, a “nova” Telebrás poderá ser uma bela
saída, desde que se faça uma mplementação correta.