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Fonte: Estadão
[09/09/07]   Esqueletos e sacos sem fundo nas Comunicações - por Ethevaldo Siqueira
 
Tenho pena do próximo presidente da República, pois ele irá receber uma herança terrível nas Comunicações. Ao invés de modernizar e harmonizar a legislação setorial, o governo Lula deixará ao sucessor uma colcha de retalhos de disposições contraditórias e geradoras de conflitos potenciais, além de fundos e tributos extorsivos que sugam bilhões, sem qualquer retorno.
 
Há um imenso descompasso entre o desenvolvimento da tecnologia e a legislação de Comunicações no Brasil. Numa época em que a digitalização domina todos os segmentos da eletrônica e das comunicações e em que a internet, o celular e as redes de banda larga se expandem em escala planetária, o Executivo e o Congresso insistem em esvaziar as agências reguladoras em favor do fortalecimento político dos ministérios, e em discutir questões menores e interesses de grupos.
 
O fato é que o governo Lula paralisou de vez a modernização institucional do setor por falta de projeto, de quadros competentes e de orientação. Esse cenário começou a desenhar-se no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, que interrompeu o projeto de reestruturação das Comunicações, iniciado pelo ex-ministro Sérgio Motta.
 
Para comprovar essa situação, convido o leitor a analisar, sucintamente, quatro pontos da gestão estatal no setor de Comunicações: Telebrás, Eletronet, Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) e Fundo de Fiscalização de Telecomunicações (Fistel).
 
Comecemos pela Telebrás. Não se surpreenda, leitor: a Telebrás, embora privatizada há 9 anos, ainda não foi extinta. Mesmo inativa, a empresa tem existência legal e tem diretores que cuidam de uma montanha de papéis ligados a questões pendentes, ao quadro de funcionários - cedidos, em sua maioria, à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) - e a responsabilidades judiciais, entre as quais, as dívidas resultantes de condenações e indenizações milionárias, inclusive os R$ 254 milhões que está pagando a uma minúscula empresa, como a VT Um Produções. E pior: o governo quer ressuscitar a Telebrás, para operar diversos serviços.
 
Outro esqueleto é a Eletronet, uma estatal falida, ligada à Eletrobrás e a um sócio estrangeiro. Detentora de uma rede de cabos de fibra óptica de 16 mil quilômetros, que cruza o País de norte a sul, a empresa está paralisada desde 2003 e tem dívidas de mais de R$ 600 milhões com os fornecedores de infra-estrutura. Seus cabos de fibra óptica foram instalados sobre a rede de energia elétrica das estatais do grupo Eletrobrás (Chesf, Eletronorte, Furnas e Eletrosul).
 
Mas o governo considera a Eletronet uma empresa estratégica e pensa em reestatizá-la, por intermédio do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro).
 
SACOS SEM FUNDOS
 
Além desses dois esqueletos, o governo federal administra diversos fundos que, contrariamente à sua finalidade legal, se transformam em mero sugadouro de recursos, encarecendo os serviços de telecomunicações, sem qualquer contrapartida à sociedade.
 
O caso mais revoltante é o Fust, sob cujo rótulo já foram arrecadados mais de R$ 5 bilhões, desde sua criação no ano 2000, sem ter aplicado um único centavo em benefício do País. Esses bilhões já foram para o ralo, sem qualquer possibilidade de utilização futura. O ministro Hélio Costa, desde 2005, vem prometendo utilizar cerca de R$ 600 milhões por ano em projetos do Fust. Mas até agora, zero.
 
Arrecadar um fundo e não aplicá-lo é um procedimento imoral. Caberia ao governo devolvê-lo aos contribuintes ou reaplicá-lo na mesma área nos exercícios seguintes. Mas isso não acontece.
 
Como o governo não aprova projetos segundo as regras do Fust, seus recursos acabam sendo engolidos pelo Tesouro Nacional sob a rubrica de superávit fiscal.
 
Outro fundo mal gerido é o Fistel, que deveria ser utilizado única e exclusivamente para cobrir as despesas de fiscalização da Anatel. Para se ter uma idéia de outro confisco absurdo e inconstitucional, é bom lembrar que o orçamento anual da Anatel é pouco superior a R$ 300 milhões, enquanto o governo se apropria ilegalmente de mais de R$ 1,5 bilhão arrecadados (e não aplicados na fiscalização) do Fistel a cada ano.
 
CORTE DE RECURSOS
 
Além de confiscar o equivalente a cinco orçamentos da Anatel por ano, o governo impõe à agência cortes cada vez mais drásticos em seus recursos, impedindo-a de aparelhar-se adequadamente para cumprir suas obrigações legais, como, por exemplo, fiscalizar e coibir as 20 mil ou 30 mil rádios piratas que infernizam os maiores aeroportos do País, pondo em risco a vida de milhares de passageiros de aviões e bloqueando comunicações de emergência, como as da polícia, do corpo de bombeiros e dos prontos-socorros.
 
E o último lembrete: o Brasil é campeão mundial em tributação sobre serviços de telecomunicações. Mais de 40% do valor de nossas contas telefônicas representam ICMS, PIS e Cofins, entre outros tributos.
 
Eis aí o cenário da gestão estatal de nossas Comunicações que não vai mudar até 2010.