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Fonte: guia das Cidades Digitais
[10/12/09] Massificação
da banda larga: missão para as três esferas - por Luciano Costa
Luciano Costa é advogado em São Paulo e Brasília, especializado em
telecomunicações e concorrência. (luciano.costa@caldaspereira.adv.br)
É crescente a percepção de que disponibilizar o acesso banda larga a uma maior
parte da população deve ser uma prioridade para a sociedade brasileira. O
Governo Federal está trabalhando em um Plano Nacional de Banda Larga, que parece
combinará esforços estatais e privados em prol desse importante objetivo de
interesse público. Os governos estaduais também têm suas iniciativas, merecendo
destaque a desoneração tributária promovida pelo Governo de São Paulo para banda
larga popular, que deve permitir a oferta de conexão de até 1 Mbps por menos de
R$ 30.
E, ainda, as ações relacionadas às Cidades Digitais, em municípios de vários
portes em todo o País, estão deixando de ser projetos experimentais e isolados
para se tornarem uma realidade capaz de transformar a gestão municipal e levar
as facilidades do mundo digital a um número cada vez maior de pessoas.
Entretanto, falta ainda uma orientação ampla, capaz de coordenar todas essas
ações em prol da massificação do acesso banda larga no Brasil. É certo que o
plano federal deve – ou deveria – exercer tal papel. No entanto, as notícias que
se tem até o momento não indicam que as ações estaduais e municipais serão
necessariamente integradas ao plano nacional.
A massificação da banda larga – o termo universalização é inadequado, pois
aplicável somente aos serviços públicos, como a telefonia fixa prestada pelas
concessionárias – exige a solução para algumas questões fundamentais. Primeiro,
a falta de um backbone nacional capaz de levar banda larga aos municípios em
condições técnicas e econômicas razoáveis. Segundo, a altíssima carga tributária
que incide sobre serviços de telecomunicações. E, terceiro, a dificuldade em
implementar a última milha, para levar ao usuário final o acesso à internet em
alta velocidade.
Claro que aqui fazemos uma simplificação. Há inúmeros outros aspectos, menos ou
mais complexos, como, por exemplo, a correta orientação aos usuários, o
treinamento de funcionários públicos, a criação de instrumentos capazes de
aumentar a eficiência administrativa dos governos, etc. Mas o objetivo neste
breve texto é defender uma ideia principal, e que talvez intuitivamente já tenha
sido percebida pelos agentes públicos e privados interessados neste tema:
somente uma atuação coordenada dos três níveis da Federação será capaz de
viabilizar um projeto real de massificação da banda larga.
Seja no âmbito jurídico, político, ou até mesmo técnico, cada esfera de governo
– federal, estadual e municipal – tem um papel a ser preenchido neste processo,
o qual não poderá ser usurpado por nenhum dos outros entes, sob pena de fracasso
para toda a iniciativa.
Vamos nos concentrar nos aspectos jurídicos. Somente a União –
constitucionalmente competente para legislar sobre telecomunicações – tem
condições de erigir um arcabouço jurídico-regulatório com vistas a implementar
uma infraestrutura nacional de banda larga, capaz de permitir que todos os
municípios tenham condições de prover banda larga aos seus cidadãos.
Sem entrar no mérito dos modelos que vêm sendo discutidos (com empresa estatal,
com parcerias público-privadas ou com subsídios às operadoras), o fato é que
somente o Governo Federal tem a estrutura e o comando necessários para
capitanear essa discussão e promover o modelo que lhe parecer mais adequado.
A troca dos Postos de Serviços de Telecomunicações (PSTs) por “backhaul” para
banda larga e a tentativa de dar um fim útil à rede da Eletronet são tentativas
legítimas de endereçar a questão da infraestrutura em âmbito nacional. As
prestadoras de serviços de telecomunicações – especialmente as concessionárias,
com sua altíssima capacidade de investimento – são atores essenciais nesse
processo. Porém, o mais importante é o reconhecimento de que essa parte da
questão deve ser enfrentada pelo Governo Federal, em especial diante das
desigualdades regionais, que podem exigir algum tipo de subsídio cruzado entre
regiões ricas e pobres.
A segunda “perna” de um plano nacional de banda larga deve tratar da questão
fiscal. E aí entram necessariamente os governos estaduais. O elevadíssimo
Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para o setor de
telecomunicações é, no mínimo, incoerente com uma política pública de expansão
da banda larga. O poder público oferecer incentivos – que inevitavelmente
significam custos para o Estado – à banda larga em um cenário de 50% de
tributação, em média, seria, como se diz no jargão popular, tirar de um bolso (o
incentivo estatal) para por no outro (o próprio Estado), com um enorme dispêndio
de recursos e tempo, e sem benefício real para a sociedade.
Assim, a louvável iniciativa do Estado de São Paulo, que reduziu o ICMS para
produtos de banda larga “popular” (ou seja, velocidade de acesso entre 200 Kbps
e 1 Mbps), deve ser melhorada e difundida entre outros estados da Federação.
“Melhorada” pois a velocidade mínima estipulada para o benefício fiscal, de 200
Kbps, já é muito baixa para os padrões de hoje em dia. Que dirá nos próximos
anos. Seria importante a assunção de compromissos, pelas operadoras, de aumento
constante da velocidade.
Cabe, dessa forma, aos governos estaduais, estabelecer seus incentivos e
programas capazes de reduzir a carga tributária sobre o acesso banda larga, com
efetiva contrapartida das operadoras, de modo a que a população seja
efetivamente beneficiada com tal renúncia.
É claro que também há um papel estadual na implantação de infraestrutura. No
entanto, dentro de uma política nacional, a questão fiscal é, no momento, o
maior entrave.
Por fim, não há melhor ente público para atuar no que se refere à “última milha”
do que o município. Atualmente, o maior custo na implantação das redes locais
está relacionado às obras de engenharia necessárias e, no que tange a tais
obras, as posturas municipais são as que devem ser observadas. Facilitar a
implantação de infraestrutura é um papel importante dos municípios, que devem
estabelecer instrumentos para reduzir o tempo e o custo destas empreitadas.
Em um segundo vetor, os municípios também são os mais capazes de estimular o uso
eficiente de tais infraestruturas, fomentando, por meio de políticas locais
direcionadas, o compartilhamento de dutos, antenas, centrais, etc.
Embora regular o compartilhamento de infraestrutura esteja dentre as
competências legais da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), seria
perfeitamente possível – e até recomendável – o estabelecimento de convênios e
acordos de cooperação com as municipalidades para a troca de informações e a
adoção de medidas específicas com vistas a facilitar o compartilhamento das
infraestruturas.
Ainda, é inegável a capacidade – já demonstrada pelas várias iniciativas de
cidades digitais existentes – dos municípios de, mesmo com recursos limitados,
implementar redes de acesso à internet para seus cidadãos. Assim, incumbir as
prefeituras, que têm efetivo conhecimento quanto às necessidades e capacidades
locais, de estabelecer suas redes metropolitanas – seja por conta própria seja
em parceria com operadores privados – tende a ser uma boa solução.
A chance de um projeto pensado considerando as circunstâncias locais sair do
papel é muito maior do que no caso de um plano de âmbito nacional padronizado,
elaborado distante da realidade de cada município.
Atingir o grau de coordenação necessário para congregar os três entes da
Federação certamente não é tarefa fácil. Mas deve ser feito por uma ampla
iniciativa, conduzida pelo Governo Federal e ajustada com Estados e municípios.
Uma política pública que, parece-nos, ainda está por vir. Pode-se também pensar
em uma ação de âmbito do Legislativo. O estabelecimento de um marco legal para a
massificação da banda larga, centrado no incentivo às Cidades Digitais e que
focaria, portanto, do local para o nacional, compilando e sistematizando o papel
de cada ente público a partir das experiências e necessidades locais. Uma
política pública positivada em lei, contendo as estratégias mais adequadas e
criando os instrumentos – políticos e financeiros – para uma expansão planejada
do acesso à banda larga no Brasil.
Portanto, uma atuação coordenada destas três esferas, cada qual atuando
juridicamente no âmbito de sua competência – e também política e tecnicamente,
pontos que não aprofundamos aqui – configurará um impulso único para a
massificação da banda larga no País, otimizando os recursos materiais e humanos
nessa empreitada e, por meio da combinação inteligente de investimentos e
esforços, estatais e privados, atingir os resultados de interesse público que a
sociedade brasileira espera e necessita.