Fonte: Clipping MP -
Origem: Estadão
[02/02/09] Vocação
estatizante - Editorial Estadão
O governo admitiu, na semana passada, que quer reativar a Telebrás, tornando
a empresa a responsável pelo acesso à internet, por banda larga, em todo o
território brasileiro.
A volta da Telebrás foi defendida pelo secretário de Logística e Tecnologia
da Informação do Ministério do Planejamento, Rogério Santanna, sob a
alegação de que "o País precisa de rede própria para interligar com banda
larga não só escolas, mas delegacias e hospitais em todos os lugares". Dia
26/12, a Telebrás já havia comunicado aos acionistas a disposição da União
de capitalizar a empresa, aportando-lhe até R$ 200 milhões, por subscrição
de ações novas.
Os defensores do projeto alegam ainda que a Telebrás propiciaria maior
economia ao governo e maior segurança aos serviços de telecomunicações
governamentais, além de operar com um satélite estatal brasileiro, para
atender ao governo e às comunicações da aeronáutica. Sobretudo, alegam eles,
poderia operar uma rede de 16 mil quilômetros de cabos de fibra óptica que
está ociosa, pois pertence a uma empresa falida, a Eletronet, cujo controle
acionário é da Eletrobrás e da AES Bandeirante.
A verdade é bem diferente do que sugerem os defensores da Telebrás.
Ressuscitar a estatal, que já deveria ter sido liquidada por falta de
atividades desde a privatização da telefonia, em 1997, e hoje é deficitária,
conflita com o previsto na Lei Geral de Telecomunicações.
Em sua coluna de domingo, dia 25 de janeiro, no Estado, Ethevaldo Siqueira,
especialista em tecnologia da informação, denuncia a inconsistência dos
argumentos dos defensores da Telebrás e alerta para os riscos de que seja
realizada uma operação nebulosa e, eventualmente, danosa ao País, por
envolver uma companhia (a Eletronet) cujo único resultado concreto foi dar
um enorme prejuízo aos credores, estimado em cerca de R$ 600 milhões.
Ignorou-se, diz o jornalista, na proposta de reativar a Telebrás, que o
Brasil já dispõe de uma excelente infraestrutura e de oferta de serviços que
poderiam atender ao governo. A segurança das comunicações militares é
conferida por sistema de criptografia e codificação, não pelo fato de a
operadora ser uma companhia estatal.
Além disso, acrescenta Ethevaldo Siqueira, na verdade a Telebrás nunca foi
operadora, mas apenas uma holding de empresas telefônicas; o marco
regulatório é contrário à presença de estatais como operadoras de serviços,
salvo em casos excepcionais; e o Estado não tem razões plausíveis para
retornar ao setor de telecomunicações, pois a estrutura privada do segmento
mostrou-se altamente eficiente.
Aliás, mesmo no âmbito oficial, não há unanimidade quanto à conveniência de
reativar a Telebrás. O ministro das Comunicações, Hélio Costa, por exemplo,
estaria alinhado a outro grupo, para o qual a estatal deveria apenas cumprir
suas obrigações judiciais e caminhar para a extinção.
A Telebrás, ademais, não teria condições de atender diretamente os usuários
de telecomunicações, pois a rede da Eletronet não lhe faculta este acesso.
Como afirmou o ex-ministro das Comunicações do governo Fernando Henrique
Cardoso Juarez Quadros, seria no mínimo arriscado transformar a Telebrás em
prestadora de serviços de telefonia: "Por um momento, pode até parecer
competitiva, mas depois vai precisar de dinheiro para modernizar a
infraestrutura e aí não vai haver garantias. É difícil concorrer com a
iniciativa privada." Ao ressuscitar a Telebrás, portanto, o governo terá de
aumentar as despesas públicas, num momento de queda de receitas tributárias.
A única certeza é que se abriria espaço para a criação de centenas de
empregos para os correligionários e amigos do governo, como se tem visto nas
demais agências reguladoras, inclusive na Anatel, responsável pela área de
telecomunicações.
Em 25 anos, a Telebrás investiu cerca de R$ 40 bilhões, instalando o total
de 24,5 milhões de acessos telefônicos, entre fixos e móveis. Em pouco mais
de uma década, as operadoras privadas já investiram quatro vezes mais do que
a Telebrás, passando a oferecer uma linha de telefone por habitante, pois
atingiu 193,2 milhões de acessos fixos e móveis, densidade seis vezes maior
do que quando a telefonia foi privatizada.