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Fonte: Valor Online
[19/01/09]
Reativação da Telebrás provoca disputa entre grupos do governo - por Talita
Moreira
Mais de dez anos após a privatização do setor de telefonia, a Telebrás volta a
estar no centro de uma disputa silenciosa entre grupos do governo que têm visões
divergentes sobre o destino que deve ser dado à estatal.
Uma vertente defende a revitalização da Telebrás, para que ela volte a ser uma
empresa com atividades operacionais. A idéia seria transformá-la numa gestora
dos serviços de telecomunicações do governo federal e uma provedora de
infra-estrutura para redes de banda larga. Essa proposta é encabeçada pelo
secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do
Planejamento, Rogério Santanna, e conta com a simpatia de alguns funcionários do
Ministério das Comunicações.
Outra ala avalia que o melhor é que a estatal permaneça como está, cumpra suas
obrigações judiciais e caminhe para a extinção, conforme prevê a Lei Geral de
Telecomunicações (LGT). O ministro das Comunicações, Hélio Costa, está mais
alinhado a esse grupo.
As divergências ficaram mais nítidas na virada do ano, quando a Telebrás
comunicou ao mercado que receberia um aumento de capital de R$ 200 milhões da
União, sua controladora. O mesmo aporte chegou a ser anunciado no fim de 2007,
mas não foi feito. Na época, o governo alegou que os recursos serviriam para
restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro da estatal e investir no
"Programa de Inclusão Digital e da Universalização da Banda Larga no Brasil".
Agora, é mais provável que a injeção de recursos seja realizada. Uma fonte
ligada ao Ministério das Comunicações afirmou que o dinheiro já está disponível.
Falta apenas a formalização em assembléia geral extraordinária. Porém, no
comunicado mais recente, a Telebrás não fez nenhuma menção à existência do plano
de expansão da banda larga.
Santanna é engenheiro mecânico e trabalhou com a atual chefe da Casa Civil,
Dilma Rousseff, no governo do Rio Grande do Sul. O secretário já se reuniu
algumas vezes com a ministra para debater o tema. Estão também envolvidos os
Ministérios da Ciência e Tecnologia e da Educação. Desde 2006, há estudos de
profissionais da Rede Nacional de Pesquisa sobre formas de usar a rede da
Eletronet desde 2006. Eletrobrás também acompanha as discussões.
O grupo ligado a ele acalenta o plano de utilizar a rede da Eletronet para a
prestação de serviços de telecomunicações, sob a gestão da Telebrás. Não é a
primeira vez que essa idéia vem à tona e não seria fácil colocar o projeto de
pé. A tentativa mais recente foi em 2007.
A Eletronet, que está em processo de falência, tem 16 mil quilômetros de fibras
ópticas nas linhas de transmissão de empresas de energia controladas pela
Eletrobrás. O controle da companhia pertencia à AES Bandeirante, mas ela foi
afastada da gestão em 2002 por não pagar fornecedores. A Eletrobrás detém a
participação restante e defende, na Justiça, o direito de retomar para si a
infra-estrutura da Eletronet que está ociosa - ou seja, quase a sua totalidade.
Um interlocutor favorável ao plano de reativar a Telebrás afirma que as fibras
da Eletronet poderiam funcionar como um backbone para redes de banda larga.
Backbone é o nome que se dá ao núcleo de uma rede de telecomunicações, ou seja,
à parte que tem grande capacidade de transmissão de dados.
Outra atividade importante da companhia seria prestar serviços de comunicação
aos órgãos de governos e gerir a contratação de empresas, hoje dispersa em uma
série de processos de licitação.
Uma proposta ainda mais ambiciosa, defendida por uma ala mais radical, prevê
tornar a Telebrás a responsável pela comunicação estratégica do país - como a
das Forças Armadas. "Daqui a alguns anos, ela poderia operar satélites. Por que
não", observou fonte que acompanha o assunto. Hoje, os satélites de comunicação
das Forças Armadas são controlados pela Star One, subsidiária da Embratel, que
por sua vez pertence à mexicana Telmex.
"Ninguém quer tirar mercado das operadoras privadas e o governo nem teria
condições de competir com elas. Mas podemos oferecer esse backbone como um
insumo", afirmou essa fonte. Segundo esse interlocutor, a Telebrás poderia
alugar essa rede para pequenos provedores interessados em construir redes locais
para oferecer acesso à internet em determinadas áreas. As próprias operadoras
poderiam utilizar essa infra-estrutura para chegar a regiões onde ainda não têm
redes de banda larga por não ser economicamente viável bancar o investimento.
Embora esse grupo argumente que não há interesse em competir com as teles
privatizadas, duas delas têm seus próprios backbones de alcance nacional: a
Embratel e a Oi (após a compra da Brasil Telecom).
"Esse dinheiro (R$ 200 milhões) não dá nem para começar um projeto desse porte",
afirmou fonte de uma operadora privada.
Após a privatização, a Telebrás deixou de ter uma atividade operacional que lhe
servisse como fonte de receita. A estatal passou a se manter com o rendimento de
aplicações financeiras que fazia com o dinheiro que tinha em caixa.
A empresa, hoje, é apenas uma casca. Com o intuito de preparar o terreno para a
privatização do setor de telecomunicações, em 1998, o governo promoveu uma cisão
parcial da Telebrás. A companhia foi dividida em dezenas de companhias
operacionais - que foram levadas a leilão - e uma não-operacional, que
permaneceu estatal e manteve o antigo nome.
A essa pequena Telebrás remanescente caberia preparar um plano para sua futura
liqüidação - o que incluía equacionar uma série de ações judiciais existentes
contra a estatal e até contra as partes privatizadas. A empresa também cedeu boa
parte de seus funcionários para a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel),
que ainda não tinha uma estrutura própria.
Mas a situação deteriorou-se sensivelmente a partir de 2006, quando perdeu uma
ação movida contra ela pela VT UM, que, no início dos anos 90, promovia serviço
de 0900 na TV (sorteios de que os espectadores participavam por meio de ligações
tarifadas) e tinha como principal acionista o empresário Uajdi Moreira.
A Telebrás fechou acordo por meio do qual deveria pagar R$ 95,5 milhões à VT UM,
além de ceder a ela quase R$ 160 milhões em direitos creditórios que poderia
obter em outras ações judiciais.
O secretário Rogério Santanna foi procurado pelo Valor na semana passada, mas
estava em férias. No Ministério das Comunicações, a informação era de que o
ministro Hélio Costa também estava em férias e voltaria ao trabalho hoje. A
reportagem tentou falar diretamente com o ministro, mas não foi atendida. Na
sexta-feira, o Valor procurou o presidente da Telebrás, Jorge da Motta e Silva,
mas ele não concedeu entrevista até o fechamento desta edição.
As especulações intermitentes sobre os novos rumos da Telebrás alimentam a alta
das ações da estatal. Embora os negócios sejam poucos, notam-se picos de
valorização nos momentos em que notícias sobre a retomada das atividades da
estatal vêm à tona. (Colaborou Heloisa Magalhães, do Rio)