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Fonte: "Ethevaldo
Siqueira" e Estadão
[19/07/09]
Um governo que se
lixa para o debate público - por Ethevaldo Siqueira
Não é só o deputado Sérgio Morais (PTB-RS) que se lixa para a opinião pública.
Na área das comunicações, o governo Lula faz o mesmo, ao ignorar solenemente
todas as tentativas de debate da polêmica iniciativa de recriar a Telebrás. E
vai em frente, sem nenhuma discussão aberta do tema.
Depois de alguns avanços e recuos, o projeto volta a caminhar em ritmo
acelerado, mesmo com todas as dúvidas sobre seus aspectos legais. Reanimada com
uma injeção de R$ 200 milhões do Tesouro Nacional, a Telebrás abre licitações e
contrata pessoal. Mas tudo sem fazer muito ruído, o que levanta sérias suspeitas
sobre o projeto.
O desprezo pelo debate democrático chegou ao máximo há um mês, quando três
ministros – Dilma Rousseff, da Casa Civil, Paulo Bernardo, do Planejamento e
Hélio Costa, das Comunicações – deixaram de comparecer, sem dar nenhuma
justificativa, a uma audiência pública promovida pela Comissão de Ciência e
Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados, para
discutir a eventual recriação da Telebrás. Nem Rogério Santanna, ideólogo do
projeto, se dispôs a comparecer.
Para criar uma operadora estatal de serviços de telecomunicações governamentais
em todo o País, serão necessários investimentos de alguns bilhões de reais.
Caminho muito melhor seria a contratação de serviços via parceria
público-privada (PPP), que poderia reduzir o investimento e o custo dos serviços
a valores muito menores do que se pretende gastar.
HISTÓRIA DE 37 ANOS
A história da Telebrás tem duas fases bem distintas. Na primeira, de 1972 até
1985, ela prestou bons serviços ao País, quando era dirigida por administradores
profissionais competentes e probos, como o comandante Euclides Quandt de
Oliveira e o general José Antônio de Alencastro e Silva.
Na segunda fase, que vai de 1985 e 1994, tudo mudou. À medida que as diretorias
da Telebrás e de suas 27 subsidiárias eram loteadas para apadrinhados políticos,
em lugar de seus melhores dirigentes profissionais, a estatal perdia sua
eficiência e sua capacidade de investimento. Diante desse quadro, a privatização
acabou tornando-se a única solução possível, não apenas para o aparelhamento
político, mas, sobretudo, para a escassez de recursos de investimento do Estado
brasileiro.
Em janeiro de 1995, depois de 23 anos de monopólio estatal, o Brasil era um país
profundamente carente de telecomunicações. Esse cenário só seria revertido com a
profunda reestruturação setorial que culminou com a privatização do Sistema
Telebrás, em julho de 1998. De lá para cá, a densidade telefônica do País saltou
de 14 telefones por 100 habitantes para os atuais 104 por 100 habitantes. Ou
seja, o número de telefones no Brasil supera sua população.
HÁ PROBLEMAS, SIM
Essa universalização não significa que as coisas vão às mil maravilhas.
Absolutamente, não. Como usuário, estou profundamente preocupado com os
problemas da banda larga da Telefônica, em São Paulo, com os inaceitáveis
padrões de tratamento da maioria das operadoras privadas e com a mediocridade
dos serviços de acesso à internet em todo o Brasil.
A Telebrás não é a resposta a esses problemas. A solução está na ampliação cada
vez maior da competição e na fiscalização mais rigorosa e proativa. O governo
Lula, sem quadros competentes e sem um grande projeto setorial, nada tem feito
de relevante pelas telecomunicações. Não moderniza a legislação nem aprimora o
modelo vigente. Ao contrário, esvazia o poder político da Agência Nacional de
Telecomunicações (Anatel) e baixa seu nível profissional. A simples indicação de
um nome para preencher uma vaga no conselho diretor da agência tem levado até
sete meses.
QUESTÕES BÁSICAS
Melhor seria se o presidente e seus ministros respondessem às seguintes questões
básicas:
* Que sentido terá promover a volta de uma estatal com alto risco de
ineficiência, corrupção e empreguismo, se não há escassez de oferta de serviços,
de tecnologia ou de infraestrutura?
* Por que antes de defender um projeto de inclusão digital, não lutar por uma
verdadeira revolução educacional, capaz de transformar radicalmente a qualidade
do ensino, das instalações escolares e da carreira do professor?
* Há muita demagogia em torno das redes de banda larga e do acesso à internet.
Se o governo se dispõe realmente a apoiar a universalização da internet, por que
não investe nesse objetivo o mesmo montante que confisca do Fundo de
Universalização das Telecomunicações (Fust), numa apropriação injusta que já
supera os R$ 7 bilhões, além dos R$ 2 bilhões embolsados anualmente do Fundo de
Fiscalização (Fistel)?
Por que não aprimora o modelo setorial, de modo a incentivar a competição,
reduzir os impostos mais altos do mundo e fortalecer a Anatel?
Essa bem poderia ser a pauta de um grande debate nacional, para mostrar o
verdadeiro papel das telecomunicações, da convergência digital e do que é
prioritário nessa área.