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Fonte: Estadão
[24/02/10]
Equívocos da banda larga - Editorial Estadão
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem manifestado reiterado apoio à
reativação da Telebrás, com o propósito alegado de que essa estatal "coordene e
gerencie a oferta de serviços de banda larga pelo menor preço possível a todos
os brasileiros". Por louvável que seja esse objetivo, há uma distância muito
grande entre os fins visados e os meios propostos para alcançá-los.
Como em ano de eleições tudo se promete, o presidente diz que a intenção é
oferecer o acesso à banda larga a R$ 10 mensais. Só não diz como fazer esse
milagre.
Para que se tenha ideia do disparate, é bom lembrar que a mais avançada e mais
barata rede de banda larga do mundo é da Coreia do Sul, onde 97% dos domicílios
podem acessar a internet à velocidade de 50 Megabits por segundo (Mbps) ? quase
100 vezes a velocidade da banda larga brasileira ? por apenas US$ 25 (R$ 47),
como mostrou o jornalista Ethevaldo Siqueira no Estado de domingo.
Também é estranho que o presidente tenha afirmado que o governo já promoveu
suficiente debate sobre todos os aspectos do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL).
Ora, nem o Congresso nem a sociedade tiveram a oportunidade de participar da
discussão aberta e ampla desse tema. Nem mesmo o ministro das Comunicações,
Hélio Costa, tem participado de todas as reuniões internas para a elaboração do
PNBL. E mais: já manifestou sua discordância quanto à reativação da Telebrás e a
outros pontos do PNBL. Houve apenas duas reuniões com operadoras de
telecomunicações.
As redes de banda larga são as grandes rodovias do conhecimento e da informação
do século 21. Por sua importância, elas interessam a toda a população brasileira
e não podem ser discutidas apenas por burocratas interessados em cargos neste e
no próximo governo.
O principal argumento do presidente da República para defender a recriação da
Telebrás é que o Estado precisa de um instrumento para poder universalizar a
banda larga. Mas não é esse o caminho adequado. Já existe no Brasil uma
infraestrutura moderna de redes fixas e móveis, de fibras ópticas e sem fio,
terrestres e via satélite. E o governo só dispõe de 20% da infraestrutura de
cabos ópticos do País.
O governo praticamente nada investe em telecomunicações, nem nas áreas mais
carentes do País, embora arrecade mais de R$ 40 bilhões por ano em impostos
sobre telefonia e, na prática, confisque boa parcela dos fundos setoriais de
telecomunicações. O melhor exemplo do pouco interesse do governo pela inclusão
digital é o que ocorre com o Fundo de Universalização dos Serviços de
Telecomunicações (Fust), cujo valor acumulado já se aproxima dos R$ 10 bilhões,
sem nada ter sido aplicado naquilo para que foi criado.
A tese da estatização da banda larga chega a ser contraditória, pois os maiores
instrumentos de ação do governo deveriam ser a Agência Nacional de
Telecomunicações (Anatel) ? que o governo Lula tem enfraquecido e
desprofissionalizado ? e o Ministério das Comunicações ? que deveria formular
políticas públicas para o setor, mas foi colocado em segundo plano até na
elaboração do Plano Nacional de Banda Larga.
A experiência mundial tem provado que o verdadeiro papel do Estado moderno em
telecomunicações não é gerir ou operar diretamente os serviços ou os
investimentos. Para que possa contribuir, realmente, para a transformação da
realidade econômica e social, o Estado deve, acima de tudo, regular, fixar
normas, formular políticas públicas, elaborar programas, estabelecer metas e
objetivos ? além de supervisionar, fiscalizar e agir com rigor e eficiência para
a manutenção da qualidade, a redução dos preços dos serviços e a intensa
utilização das novas tecnologias e da infraestrutura existente. Cabe ainda ao
governo implementar o chamado governo eletrônico e negociar Parcerias
Público-Privadas, com a participação das empresas operadoras, bem como estimular
as empresas privadas a inovar e a investir em pesquisa e desenvolvimento
tecnológico.
Há ainda, no caso, um ponto que beira o escândalo: a manipulação das cotações
das ações da velha e moribunda Telebrás, que já tiveram valorização de até
35.000% desde 2003. Cabe não apenas à CVM, mas também ao Congresso, ao
Ministério Público e à Polícia Federal investigar quem está ganhando dinheiro
com essa indecorosa especulação.