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Leia na Fonte: Website de Ethevaldo Siqueira
[28/02/10]  As duras lições da recriação da Telebrás - por Ethevaldo Siqueira

Fico imaginando qual seria a verdadeira intenção de alguém que compra uma dívida de mais de R$ 200 milhões por uma pequena moeda de R$ 1, e assume esse ônus em lugar da sócia estrangeira (AES) da estatal falida, Eletronet, dona de uma rede de 16 mil quilômetros de cabos de fibras ópticas.

No entanto, foi exatamente o que fez Nelson dos Santos, dono da empresa Star Overseas, cliente dos serviços de consultoria do ex-ministro José Dirceu, de quem se diz amigo. Esse investidor ousado pagou no mínimo R$ 620 mil, entre 2007 e 2009, ao consultor, ex-ministro e ex deputado cassado sob a suspeita de chefiar o mensalão.

Meu primeiro espanto é que poucos consultores brasileiros de grande competência e notório saber ganham tanto por um trabalho de consultoria, cujo conteúdo ninguém conhece. José Dirceu é exceção. É claro que o investidor e o ex-ministro estão altamente interessados na reativação da Telebrás – que, segundo planos do governo, deverá assumir a rede de fibras ópticas da falida Eletronet.

Como jornalista especializado desta área, eu já havia informado, pelo menos três vezes, que um aventureiro havia comprado as dívidas da estatal falida por apenas R$ 1, fato agora reconhecido por sua empresa. Mas Nelson dos Santos não quis falar ao Estado.

Seria ingenuidade pedir explicações ao presidente da República sobre os aspectos estranhos dessa história, visto que, quase sempre, ele confessa não saber de nada a respeito dos fatos mais graves que ocorrem no governo. Ou diz que foi traído por aloprados das telecomunicações.

CONGRESSO
O melhor caminho para debater e esclarecer a questão da banda larga passa pelo Congresso Nacional. Seria oportuno, portanto, que deputados e senadores discutam em profundidade o Plano Nacional de Banda Larga e a reativação da Telebrás.

Cabe, também, aos parlamentares esclarecer três questões básicas relacionadas com o escândalo em gestação:
1) Que tipo de consultoria e relacionamento vem mantendo José Dirceu com um investidor que compra uma dívida de milhões por apenas um real?
2) Que interesse poderia ter um ex-deputado cassado no negócio da Eletronet e na recriação da Telebrás?
3) Finalmente, a quem beneficia a indecorosa elevação de 35.000% da cotação das ações da moribunda Telebrás, no governo Lula, com valorização totalmente manipulada pelas declarações dos interessados?

Diante desse último fato, qualquer estudante de economia perguntaria: “Como podem valorizar tanto as ações de uma empresa em liquidação, sem receita, cheia de dívidas judiciais – a não ser por meios heterodoxos?”

Fiz essa pergunta a um assessor do Ministério do Planejamento e a resposta cínica foi a seguinte: “As ações da Telebrás podem valorizar, sim, com base no valor futuro da empresa”. Isso só seria possível no caso de uma empresa petrolífera que, mesmo em situação financeira difícil, tivesse descoberto reservas de óleo superiores às do pré-sal.

A Telebrás não tem nenhuma perspectiva de lucratividade ou de sucesso econômico. Não há, portanto, nenhum valor futuro a respaldar a explosão de suas ações.

A face imoral dessa história é o fato de, ao longo dos últimos sete anos, muita gente ter obtido e ainda estar obtendo ganhos escandalosos com a manipulação das ações da Telebrás, com base em especulações, boatos e rumores. Quem comprou por últimos tais papéis, contudo, poderá ficar com o mico.

BALANÇO TRÁGICO
A banda larga está sendo tratada como “grande ativo de campanha da companheira Dilma”, diz um dirigente petista, para quem o presidente Lula e sua ministra da Casa Civil “vão passar à história como os líderes que deflagaram uma nova revolução nas telecomunicações, ao democratizar o acesso à banda larga a todos os brasileiros”. É algo puramente eleitoreiro e escandaloso.

O açodamento dos defensores da volta da Telebrás decorre ainda do fato de, ao longo de mais de 7 anos de governo, o presidente Lula ter ignorado solenemente as grandes prioridades das telecomunicações, em especial a necessidade de completar a reestruturação legal das diversas áreas sob responsabilidade do Ministério das Comunicações.

Além disso, esvaziou politicamente a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), bem como outras agências, ao desprofissionalizar seus quadros. Lembram-se do que ocorreu com a diretoria da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) nos tempos do apagão aéreo de 2007/2008?

Mesmo sabendo que o projeto da banda larga não foi discutido no Congresso nem pela opinião pública, o presidente afirmou, por estar mal assessorado, em recente entrevista ao Estadão, que o governo já promoveu suficiente debate de todos os aspectos do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL). Além disso, ao apoiar a volta da Telebrás, mesmo depois da revelação das estranhas negociações que estão por trás do projeto, o presidente da República prova mais uma vez que não conhece os bastidores de seu próprio governo. No final, é provável que talvez diga que “não sabia de nada”. Ou que foi traído.