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Fonte: Acerto de Contas - Origem: Valor Econômico
[05/01/10]
Telebrás provoca arrepios - por Heloísa Magalhães, chefe da redação do Rio
de Janeiro
Ficou para fevereiro o lançamento pelo governo federal do Plano Nacional de
Banda Larga. Estava previsto para o fim de janeiro mas, devido ao período de
férias presidenciais e do ministro das Comunicações, Helio Costa, as agendas
precisaram ser revistas, diz Cezar Alvarez, assessor direto do presidente Lula e
coordenador das políticas de inclusão digital do governo. De qualquer forma, o
plano ainda não está totalmente pronto. Alvarez contou que uma equipe trabalhou,
entre os feriados de Natal e Ano Novo na montagem do projeto. Mas uma definição,
por enquanto, parece clara: a rede da Eletronet vai ser incorporada ao Plano
Nacional de Banda Larga e o novo veículo para prestar o serviço deverá ser a
Telebrás.
O que se sabe é que, além da reação de boa parte da sociedade civil brasileira,
que sente arrepios quando se fala em reviver estatais, dentro do próprio governo
o assunto causa polêmica. O Ministério das Comunicações lidera as reações
contrárias quando o tema é a volta da Telebrás, a presença estatal em mercados
que exigem pesados investimentos e que podem ser operados pelas empresas
privadas.
A discussão no setor é que mesmo ativando a rede da Eletronet não seria
necessário reviver a Telebrás. Os argumentos contra passam pela constatação de
que existem Eletronorte, Eletrosul, Furnas e Chesf, estatais que já oferecem
capacidade de rede para telecomunicações. Bastaria criar um mecanismo de
coordenação, como um comité do próprio setor elétrico onde estão as empresas.
Aliás, as quatro companhias fecharam contratos com a Eletronet quando esta foi
criada. Mas hoje a questão é política. A área de energia está ligada ao PMDB e a
infraestrutura de rede voltada para a oferta de banda larga ficaria atrelada ao
ministro das Minas Energia, Edison Lobão, e seus aliados.
Por outro lado, ainda não está claro o que Telebrás vai fazer. Há dúvidas se irá
operar um serviço ou vai oferecer infraestrutura. Se for serviço de banda larga
existe um complicador jurídico, pois enquadram-se em serviços privados. Ou no
Serviço de Comunicação Multimidia (SCM), que é prestado em regime privado, ou no
Serviço Móvel Pessoal (SMP), mas, como diz o nome, é móvel e onde está hoje a
terceira geração da telefonia celular.
A Telebrás foi montada para coordenar o planejamento integrado e a estrutura
financeira das concessionárias em regime público, e para passar para regime
privado, como é definido para quem presta banda larga, seria necessário uma lei
para garantir a transformação, avaliam especialistas.
Outro complicador é de ordem técnica e econômica. Uma empresa para realizar
prestação de serviços e causar impacto no mercado precisa de expressivo
orçamento de investimentos e projeto operacional em horizonte de médio prazo. A
pergunta ainda não respondida é qual o orçamento que o governo federal estaria
planejando para ativar a Telebrás, se este for realmente o plano gestado no
Planalto.
Alvarez, que é moderado em suas posições, nega-se a divulgar números e detalhar
a proposta. Argumenta, entretanto, que não faz sentido deixar de lado uma rede
com pouco uso como a da Eletronet. Frisa que serão usadas "todas as
infraestruturas disponíveis do governo para transformar o ativo de fibra óptica
do sistema Eletronet". Admite que também não faria sentido e nem há recursos
para replicar as redes das operadoras privadas, mas a proposta é o governo atuar
como "elemento regulador para dar conta das discrepâncias do mercado privado de
banda larga", afirma.
É conhecido que onde não há concorrência o preço do serviço de banda larga sobe.
As operadoras não escondem que, quando não têm exigências fixadas pela Anatel,
buscam privilegiar a presença nas cidades mais populosas e nas áreas onde é
maior o poder aquisitivo da população. Alvarez cita estudo do J.P. Morgan. O
resumo, publicado pelo noticiário "Teletime News", mostra que, onde há apenas as
concessionárias de telefonia, o preço do serviço de banda larga de 1 a 2 Mbps é
R$ 118, e pode cair para pouco mais de metade, quando há a presença da Net e da
GVT.
De acordo com o assessor do presidente Lula, o que vem sendo montado é a
articulação de uma política pública com serviços privados, mas estimulando a
competição, passando pelo "constrangimento da indução e do subsídio" e que
"nenhum instrumento está fora da cesta de hipóteses" do plano de governo.
Alvarez destaca que a questão da rede é um ponto de uma proposta muito mais
ampla e ambiciosa para reduzir o fosso do acesso ao mundo digital entre os de
baixa e alta renda .Um lado interessante do projeto é toda uma articulação de
políticas públicas para ampliar o acesso da população não só à banda larga como
também ao computador, uma vez que é grande o percentual de pessoas que não sabe
usar e, talvez por isso, acabe não tendo interesse de navegar pela internet. A
estratégia é também criar condições para que o preço dos computadores continue
caindo - em dezembro, o ministro Mantega anunciou a reedição da medida de
isenção de PIS e Cofins.
Ontem, foi publicada no "Diário Oficial da União" portaria interministerial para
criação de novos 3 mil telecentros no país, que serão somados aos 5,5 mil
existentes. Os interessados em sediar, sejam prefeituras ou organizações não
governamentais, têm 60 dias para apresentar propostas. O governo fica
responsável pelo investimento, que prevê a instalação em local de fácil acesso,
uma área com 10 estações de trabalho, 11 estabilizadores, um roteador wireless,
uma impressora a laser, uma câmera para monitoramento remoto. Também é oferecido
treinamento e apoio-bolsa aos monitores.
Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (Pnad) relativa ao ano de 2008 mostrou
o fosso digital. O volume de pessoas que usam a internet vem crescendo, mas os
dados mostraram que 65,2% da população brasileira (104,7 milhões de pessoas) não
utilizou a rede nos três meses anteriores à data da entrevista. Os principais
motivos foram a falta de interesse, com 32,8% do total; a falta de conhecimento
para navegar, com 31,6% do total; e a falta de acesso a um microcomputador, com
30% do total.
Heloísa Magalhães é chefe da redação do Rio de Janeiro