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Fonte: Estadão
[22/05/10]
Retrato da Nova Telebrás - por Ethevaldo Siqueira ("Telebrás enfrenta
três sérios desafios. O primeiro é de ordem legal. Os outros dois são casos
típicos de corrupção, a serem apurados")
Muito antes de proporcionar o tão sonhado acesso de alta velocidade à internet
aos brasileiros de baixa renda e das regiões mais remotas, com serviços da
melhor qualidade e pelos menores preços – a Telebrás enfrenta três sérios
desafios. O primeiro é de ordem legal. Os outros dois são casos típicos de
corrupção, a serem apurados.
Examinemos o primeiro caso. Diversos juristas de renome argumentam que uma
empresa criada por lei não pode ter seu objeto ou atividade-fim modificado por
decreto. Criada por lei em 1972, a Telebrás nunca foi operadora nem teve
autorização legal para operar diretamente serviços de telecomunicações, mas
apenas por intermédio de subsidiárias. Sua principal função no passado foi como
empresa controladora (holding) de 27 subsidiárias (as Teles). O entendimento dos
juristas é de que as finalidades da empresa só podem ser mudadas por nova lei do
Congresso.
Corrupção
O segundo caso é o da indecorosa manipulação das ações da Telebrás que chegaram
a valorizar-se 36.000%, ao longo dos últimos sete anos. Segundo especialistas,
caberia à própria Telebrás comunicar a possibilidade de sua reativação à
Comissão de Valores Mobiliários (CVM), como um fato relevante, para que a CVM
determinasse a suspensão das negociações das ações da estatal na Bolsa. Como
nada disso foi feito, a cada declaração dos porta-vozes do governo envolvidos no
PNBL, as ações subiam mais e mais. Cabe à própria CVM e à Justiça apurarem quem
se beneficiou dessa valorização e punir os responsáveis.
Como justificar uma valorização tão grande das ações de uma empresa sem
patrimônio, sem receita, sem quadro mínimo de funcionários e enterrada em
dívidas judiciais?
Mais corrupção
O terceiro caso é ainda mais espantoso e já se arrasta há 4 anos. É mais um caso
indenização milionária contra empresa estatal. Vamos aos fatos.
Segundo parecer do Ministério Público Federal, mesmo em fase de liquidação, a
Telebrás foi lesada em R$ 170 milhões por não ter recorrido de uma sentença
condenatória, em 2006. Em parecer do procurador Marinus Marsico, ao Tribunal de
Contas da União (TCU), conclui que a Telebrás foi lesada no acordo extrajudicial
celebrado em 2006 com a empresa VT-Um, que prestou serviços de valor adicionado
do tipo 0900 à Embratel por poucos meses e cujo dono é Uadji Moreira, amigo do
então ministro das Comunicações, Hélio Costa. Com capital registrado de apenas
R$ 1 mil, a empresa VT-Um, só operou serviços 0900 por menos de um ano e entrou
na Justiça contra a Embratel e a Telebrás.
A sentença, acreditem, condenou a Telebrás a pagar a absurda indenização de R$ 1
bilhão, o que poderia levar a estatal à falência. Nesse momento, a VT-Um fez
acordo em separado com a Embratel, por um valor considerado simbólico, e
conseguiu da Justiça a homologação do pagamento, reduzindo a indenização à
metade, ou seja, R$ 506 milhões a título de lucros cessantes, a serem cobrados
da Telebrás.
Ainda assim, a Telebrás concluiu que não teria condições financeiras de pagar
tal indenização à VT-Um. Em lugar de recorrer da sentença, a estatal preferiu
renegociar o valor da indenização, reduzindo o valor final à metade, para R$
253,9 milhões, mas, com prejuízo de R$ 170 milhões aos cofres públicos, segundo
o Ministério Público;
O Ministério Público refez os cálculos da indenização e apurou que seus valores
estavam superestimados e que a indenização chegaria, no máximo, a R$ 84 milhões,
valor idêntico ao calculado pela Procuradoria Regional da Advocacia-Geral da
União (AGU), em nota interna de setembro de 2007. Mais grave: o acordo teve o
respaldo do ministro Hélio Costa e da consultoria jurídica do Ministério das
Comunicações, ao qual a Telebrás está vinculada administrativamente.
Com base naquela nota interna, o procurador Marsico baseou sua representação
encaminhada ao TCU, há duas semanas, em que pede a rejeição das contas da
Telebrás de 2006 e a punição dos responsáveis pelos danos ao erário, no caso o
presidente da Telebrás, na época, Jorge da Mota e Silva, e o ministro Hélio
Costa.
O que era desconfiança agora é fato. Está comprovado que o acordo foi
extremamente danoso para a União disse o procurador. A AGU encontrou erros
considerados graves no laudo pericial que serviu de base para o acordo. Para
AGU, perito que calculou os valores do lucro cessante usou critérios obscuros. O
valor do faturamento bruto mensal da TV-Um usado como referência pela perícia é
totalmente incompatível com informação prestada pela própria empresa em outra
ação judicial movida por ela contra as subcontratadas Tecplan e TV-I, que a
sucederam na prestação de serviços à Telebrás.
Com base nessa análise, o procurador concluiu que o valor da indenização que
seria devida à VT-Um chegaria, no máximo, a R$ 84 milhões, um sexto do valor
indicado pela perícia. Por outras palavras, o acordo final com a VT-Um,
reduzindo à metade a indenização de R$ 506 milhões da dívida apurada, que
parecia vantajoso à Telebrás, em um primeiro momento, foi na verdade lesivo,
segundo a conclusão da AGU e do procurador Marsico. Além de tudo, a Telebrás
fechou o acordo com a VT-Um sem encaminhar primeiro o processo para análise da
AGU, procedimento obrigatório a ser adotado, por força de lei.