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Fonte: Ethevaldo Siqueira
[27/05/10] O
fim do Ministério das Comunicações - por Ethevaldo Siqueira
Não há hoje no Brasil ministério mais esvaziado e sem poder do que o Ministério
das Comunicações (MiniCom) deste final de governo. Em seu lugar, está de facto
hoje a Nova Telebrás, comandada por Rogerio Santanna, o homem forte do governo
nessa área, e que exerce, praticamente, o papel e as funções de ministro das
Comunicações.
Faça um teste comigo, leitor. Qual é o nome do novo ministro das Comunicações?
Apenas dois em cada 10 profissionais da área de telecomunicações aos quais fiz
essa pergunta me responderam que é José Filardi – ou melhor, José Artur Filardi
Leite. Ele era chefe de gabinete do ex-ministro Hélio Costa, de quem adquiriu a
Rádio Sucesso, de Barbacena, Minas Gerais. No entanto, dentro do próprio MiniCom
havia profissionais muito mais qualificados para chefiar esse ministério. Mas,
como a pasta foi implodida, isso não faz nenhuma diferença.
Diante desse quadro, com todo o respeito, vamos chamar o presidente da Nova
Telebrás de ministro Rogerio Santanna, até porque ele tem falado com a maior
desenvoltura sobre qualquer tema do setor, desde o Plano Nacional de Banda Larga
(PNBL) ao celular, à internet, à qualidade dos serviços, às tarifas e aos
investimentos públicos e privados na área. Ele sabe tudo. Daqui a pouco ele
passará a falar sobre Radiodifusão, TV3D, comunicação holográfica e outras
áreas.
O importante é que o novo ministro é o homem forte da banda larga do governo
federal. Nos últimos meses, com o apoio direto e explícito do presidente Lula,
dos ministros do Planejamento, Paulo Bernardo, e da ex-ministra da Casa Civil,
Dilma Rousseff, Santanna cresceu como pipoca na panela.
Antes de assumir a presidência da estatal, Santanna era secretário de Logística
do Ministério do Planejamento, de 2003 a 2010, mas, mesmo nesse cargo, se
destacou como a pessoa que já lutava pela reativação da Telebrás.
Santanna implodiu o Ministério das Comunicações (MiniCom) e deixou seu
ex-titular, Hélio Costa, falando sozinho ao longo da disputa pela liderança na
elaboração do PNBL. Se me perguntarem qual dos dois estava com a razão, eu
responderei que, em minha opinião, nenhum deles. Santanna é um petista brigador,
ousado, radical, xenófobo e estatizante. Hélio Costa tem muito mais o perfil do
político populista, à moda mineira, que estava no MiniCom apenas para fazer
carreira.
Santanna quebrou todo o formalismo legal que havia nas Comunicações. Restringiu
o debate do PNBL aos setores governistas ou petistas. Convenceu o governo a
mudar a lei da Telebrás por decreto. Ignorou solenemente o fato de a Telebrás
ser vinculada por lei ao MiniCom e atropelou o ministro Hélio Costa, contrário à
reativação da estatal.
Aliás, a participação do Ministério das Comunicações na elaboração do PNBL foi
praticamente reprovada e seu projeto de plano foi sepultado – embora tenha sido
o único texto publicado sobre o tema antes do decreto. O documento tinha um
pecado mortal: não recomendava a reativação da Telebrás e, pior, sugeria uma
grande parceria entre o governo e as operadoras de telecomunicações, em frontal
oposição ao pensamento do ministro Santanna.
Três concordâncias
O ministro Santanna fala muitas verdades. O Brasil inteiro concorda com pelo
menos três pontos de seu discurso, a saber:
a) com sua crítica à banda larga no Brasil, pois ela é estreita, cara e escassa;
b) com a necessidade fundamental e urgente de maior oferta, melhor qualidade e
menores preços para banda larga no Brasil;
c) com a necessidade urgente de se levar a banda larga às populações de menor
renda e às regiões menos desenvolvidas do País.
A grande polêmica, no entanto, é com os caminhos propostos pelo novo ministro, a
começar por sua preferência pelo solução estatal. Em segundo lugar, é muito
difícil concordar com sua obsessão em transformar a Telebrás numa empresa
operadora das telecomunicações da rede do governo federal e gestora do PNBL. Em
terceiro, com sua facilidade extrema em fazer promessas de difícil cumprimento,
como banda larga de boa qualidade a R$ 15 por mês (agora já reduzida para R$
10). Em quarto, com sua idéia de “regular” o mercado, introduzindo uma
competição que, a seu ver, determinará a queda dos preços, mesmo com a
permanência da maior tributação sobre serviços de telecomunicações do mundo.
Promessas mil
Mais do que político em palanque, o ministro Santanna faz promessas delirantes
sobre a capacidade futura da Telebrás. Alguns críticos bem-humorados dizem que a
maior crueldade que poderemos fazer com o ministro Santanna num futuro próximo
será exigir ou cobrar dele o cumprimento dessas promessas.
Para este final de governo Lula e para a campanha da candidata Dilma Rousseff,
no entanto, o mérito do ministro Santanna foi muito grande, ao mostrar ao PT e
seus aliados o filão eleitoral que poderá ser um projeto ambicioso com promessas
mirabolantes sobre banda larga.
A banda larga foi uma descoberta providencial para o governo Lula na área de
telecomunicações. Assim como Marta Suplicy decidiu prometer “acesso à internet
em banda larga grátis para todos os paulistanos”, durante a campanha para a
Prefeitura de São Paulo há dois anos, o ministro Santanna está prometendo coisas
quase tão utópicas quanto a internet da líder petista.
Aliás essa tem sido a marca do governo Lula nas telecomunicações: nada fazer de
sério durante longo tempo e só descobrir um filão eleitoral do setor às vésperas
das eleições. Dos 8 anos de administração do presidente Lula, 7 anos se passaram
sem o menor interesse ou prioridade pelas telecomunicações e sem uma agenda
clara sobre banda larga. Apenas duas vozes eram ouvidas em alguns eventos
setoriais em nome do governo federal: a de Rogerio Santanna, ainda no Ministério
do Planejamento, e de Cezar Alvarez, assessor especial do presidente Lula para
inclusão digital.
Tudo que se fez de 2003 a 2009 se resumiu ao projeto da TV digital, que
mobilizou inicialmente os ministros anteriores – Miro Teixeira e Eunício
Oliveira – e, por último, Hélio Costa, defensor explícito e apaixonado do padrão
japonês ISDB. Ninguém pensou em banda larga e PNBL, nem formulou projetos de
políticas públicas que cuidassem mais seriamente da própria qualidade dos
serviços.
É claro que a grande discussão hoje no mundo é a importância da banda larga como
um direito do cidadão e, portanto, sujeito a metas de universalização. Ora, nos
contratos de concessão das operadoras brasileiras não há ainda nenhuma
obrigatoriedade de atendimento da demanda de banda larga, nem de qualidade, nem
de oferta abundante, nem de velocidade mínima, nem de preços acessíveis, nem,
muito menos, de metas de universalização.
Ao longo de 7 anos, o governo Lula não moveu uma palha no tocante à banda larga.
Não fez sua lição de casa. Não cumpriu seu papel nem formulou as políticas
públicas capazes de mudar esse quadro. De repente, o ministro Santanna –
passando por cima do ministro das Comunicações e da Agência Nacional de
Telecomunicações (Anatel) — resolveu deflagrar uma verdadeira guerra contra as
operadoras. Aliás, uma guerra típica de quem quer mudar o modelo, porque bateu
sempre na tecla de que a privatização fracassou e que o mercado não resolve
todos os problemas.
É o óbvio: o mercado nada faz por si só – se não é forçado pela lei ou por
políticas públicas a atender aos objetivos sociais e aos programas de inclusão
digital. Pior ainda quando o governo é omisso, frouxo, passivo, preguiçoso,
despreparado e incapaz até de fiscalizar o setor privatizado e punir os abusos.