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Fonte: Blog do Ethevaldo
[16/11/10]
Visita ao berço da web - por Ethevaldo Siqueira
Nunca supus que 20 anos pudessem abalar tanto nosso mundo — na economia, na
política, na cultura e na educação. É sobre esse tema que eu gostaria de
convidar o leitor a uma reflexão. Vale a pena fazer um breve balanço sobre as
transformações a que assistimos nessas duas últimas décadas, começando pela
mudança mais importante delas: a internet.
Nesse sentido, 2010 tem um significado especial, pois marca os 20 anos da
criação da teia mundial ou worldwide web (WWW), pelo físico inglês Tim
Berners-Lee, que, em 1990, trabalhava no Centro Europeu de Pesquisas Nucleares,
ou CERN, sigla em francês de Centre European de La Recherche Nucleaire, primeira
denominação da entidade que hoje se chama Laboratório Europeu de Física de
Partículas, da Organização para a Pesquisa Nuclear, localizado em Genebra.
É claro que a internet não nasceu em 1990. Mas só a partir daquele ano ela teria
condições de popularizar-se como popularizou-se. De apenas algumas centenas de
milhares de usuários – acadêmicos, militares e burocratas – ela saltou nestes 20
anos para 2 bilhões de pessoas de todos os países, idades e profissiões que dela
se utilizam todos os dias.
Se você quer relembrar comigo um pouco desse progresso, ao longo dos últimos 20
anos, comece por visitar o primeiro site do mundo, preparado exatamente pelo
inventor da web, Berners-Lee. O endereço desse site é http://info.cern.ch (que,
curiosamente, começa por lembrar o significado daquele ano para a humanidade).
“O ano de 1990 – diz a abertura do site – foi um dos mais momentosos em eventos
mundiais. Em fevereiro, Nelson Mandela foi libertado depois de 27 anos de
cárcere. Em abril, o ônibus espacial Discovery transportou ao espaço e colocou
em órbita o Telescópio Espacial Hubble. Em outubro, a Alemanha foi reunificada.
E, então, no final de 1990, teve lugar uma revolução que mudou o modo que
vivemos.”
Protocolo IP
Antes de Tim Berners-Lee, é preciso relembrar o trabalho de outro pioneiro que
tornou possível a comunicação entre todos os computadores do mundo: Vinton Cerf.
Foi esse matemático americano que quebrou a barreira à comunicação entre
computadores de arquiteturas diferentes, ao inventar em 1973 o protocolo TCP-IP
(sigla de Transport Control Protocol-Internet Protocol), hoje conhecido apenas
como protocolo IP.
A comunicação entre computadores passou, então, a ser feita pela chamada
comutação por pacotes, na qual os bits se agrupam em pacotes, formando conjuntos
parecidos com envelopes, que contêm até endereço por fora e mensagens por
dentro. Resultado: o protocolo IP possibilita hoje que todos os computadores se
comuniquem, não apenas com outros computadores na internet, mas com celulares,
equipamentos de vídeo, iPods, tablets, notebooks, bancos de dados e outros
dispositos ou equipamentos.
Tim Berners-Lee criou a Worldwide Web, com base na linguagem Hypertext Markup
Language (HTML) em 1990. Seu trabalho havia sido começado em 1989, quando propôs
ao laboratório CERN um projeto de comunicação com o uso de hipertexto, em que
vários documentos poderiam ser interligados por referências eletrônicas.
Trabalhando num computador pessoal NeXT, o físico desenvolveu então a HTML, além
do Hipertext Transfer Protocol (HTTP, protocolo para troca de arquivos), a
Universal Resource Locator (URL, sistema de endereços) e o primeiro navegador
Em 6 de agosto de 1991, ele tornou o projeto público, permitindo que as pessoas
baixem o servidor e o navegador que ele desenvolveu. O primeiro website do mundo
foi, então, o do Laboratório Europeu de Física de Partículas (CERN), no endereço
http://info.cern.ch. Inicialmente, o site passou a trazer explicações sobre o
que é a web, como obter um navegador e como configurar um servidor de web.
Berners-Lee torna suas idéias disponíveis livremente, sem patentes ou cobrança
de royalties.
Um idealista
Numa entrevista que concedeu a este jornalista no ano 2004, Berners-Lee explicou
por que não registrou a patente de seu invento: “Diversos colegas me
aconselharam a registrar a patente da WWW. Mas eu não quis. Achei que deveria
doar à humanidade aquela ferramenta tão útil à comunicação. Nunca pensei em
ficar milionário. Ganho bem e tenho tudo que mais desejo”.
Berners-Lee é, portanto, um idealista. Abriu mão dos direitos de propriedade
intelectual da invenção da World Wide Web, deixando deliberadamente de
patenteá-la. Se o fizesse, poderia ser hoje o homem mais rico do mundo.
O governo da Finlândia homenageou-o em 2004 com o Prêmio de Tecnologia do
Milênio, oferecendo-lhe também um cheque de 1 milhão de euros (US$ 1,350
milhão). Fundou o World Wide Web Consortium em 1994, no Instituto de Tecnologia
de Massachusetts (MIT). Esse consórcio é uma reunião de empresas que têm como
objetivo criar padrões e recomendações para aprimorar a qualidade da web. Em
dezembro de 2004, Berners-Lee aceitou também o convite para assumir a cátedra de
Ciências da Computação, School of Electronics and Computer Science, da
Universidade de Southampton, na Inglaterra, para conduzir o novo e ambicioso
projeto da web semântica.
Tim Berners-Lee está à frente do World Wide Web Consortium, organismo
internacional situado em Boston, nos Estados Unidos, criado para definir padrões
para a internet. Segundo o físico, o próximo passo da rede mundial está na
criação de uma web semântica. A proposta é que os computadores não somente
apresentem as informações contidas numa página, como ocorre hoje, mas também
possam “entender” cada informação, classificada de maneira acessível às
máquinas, com ferramentas como a eXtensible Markup Language (XML) e a Resource
Description Framework (RDF).
“A web semântica é uma extensão da web atual em que a informação recebe um
significado bem definido, permitindo que computadores e pessoas trabalhem melhor
em cooperação”, escreveu Berners-Lee em artigo na revista Scientific American,
publicado em maio de 2001.
Ao longo de 1991, surgiram os primeiros servidores instalados em outras
instituições europeias e, em dezembro do mesmo ano, era instalado o primeiro
servidor nos Estados Unidos no Centro do Acelerador Linear de Stanford (Slac, na
sigla em inglês). Em novembro de 1992, havia 26 servidores no mundo. Já em
outubro de 1993, eram 200 máquinas em funcionamento – então com o nome de web
servidores (servidores da web ou da internet).
Em fevereiro de 1993, a Universidade de Illinois, em Urbana Champaigne, lançou a
primeira versão do browser Mosaic, que tornou a internet acessível aos usuários
de PCs e, em especial, do Macintosh da Apple.
No Brasil, em 1993
A Universidade de São Paulo (USP) sempre acompanhou de perto o desenvolvimento
das redes de comunicação, primeiro com a BitNet, no final dos anos 1980 e começo
dos 1990, e, depois, com a própria internet. Pessoalmente, passei a utilizá-la,
ainda na Escola de Comunicações da USP, como professor de Telemática. Os alunos
ficavam encantados com a possibilidade de conectar-se com o mundo, apesar das
dificuldades e da pobreza de recursos da web naquele tempo.
Um dos pioneiros da internet no Brasil foi Aleksandar Mandic, que começou
exatamente com uma empresa de BBS (Bulletin Board System).
Mandic abriu um negócio em 1990 onde o capital era um micro 286, uma linha
telefônica e ele próprio. Do começo, no quarto de sua casa, à venda em 1997, a
Mandic virou case em Harvard e agora abre novamente suas portas com outra idéia
inovadora: oferecer serviço de e-mail diferenciado para aqueles que precisam do
e-mail para trabalhar.
O risco do monopólio
Testemunhei também uma das definições mais importantes do papel da internet no
Brasil, em 1995, quando o ex-ministro Sérgio Motta se interessou pessoalmente
pelo futuro da internet. Naquela época, começava no País uma discussão –
semelhante à do sexo dos anjos – baseada na pergunta: “Internet é informática ou
telecomunicação?”
Se fosse informática, não caberia nenhuma providência do Ministério das
Comunicações. Depois de dois meses, chegaram à conclusão brilhante de que a rede
poderia ser o primeiro grande exemplo de convergência de três grandes áreas:
tecnologia da informação, telecomunicações e multimídia (ou conteúdo).
Em abril de 1995, a Embratel, ainda monopolista e estatal, decidiu assumir a
frente do processo de implantação da infraestrutura de rede destinada ao
funcionamento comercial da internet no Brasil. Só havia um pequeno equívoco: a
empresa pleiteava o monopólio do transporte e do acesso da web no País. Havia
milhares de interessados em obter um endereço na web, mas a Embratel ainda não
estava preparada para atender à demanda e ainda proclamava sua intenção de
monopolizar o acesso e o uso das redes públicas.
Em debates acalorados, diversos especialistas levaram a Sérgio Motta não apenas
o protesto mas, também, as sugestões para que o ministro impedisse a operadora
de longa distância ou qualquer outra empresa privada ou estatal, do Sistema
Telebrás ou não, de exercer qualquer tipo de monopólio ou exclusividade de
operação da internet.
O problema deu tanta dor de cabeça aos dirigentes da Embratel na época que o
assunto passou a ser chamado de infernet – especialmente quando uma portaria
publicada no dia 1° de junho de 1995, assinada por Sérgio Motta, abriu o uso das
redes públicas ao acesso da web, definindo também a internet como sendo o “nome
genérico que designa o conjunto de redes, meios de transmissão e comutação,
roteadores, equipamentos e protocolos necessários à comunicação entre
computadores, bem como o software e os dados contidos nestes computadores”.
Obter um endereço eletrônico e o acesso aos serviços na Embratel, nesses
primeiros meses de 1995, era um exercício de paciência que poderia levar meses
de espera. Vários amigos estimularam até uma das filhas de Sérgio Motta a
pleitear os serviços, sem mencionar seu parentesco com o ministro, para mostrar
com maior realismo e credibilidade a lentidão no atendimento à demanda pela
Embratel estatal. O exemplo dentro de casa funcionou do ministro foi a gota
d’água final na persuasão de Serjão, que se convenceu definitivamente da
inconveniência do monopólio na internet.
No Brasil, 75 milhões
A expansão da internet ocorrida de 1995 até hoje no Brasil pode ser resumida nos
seguintes números. De pouco mais de 50 mil usuários no final de maio de 1995, o
Brasil alcançou 75 milhões no final de outubro de 2010. Mesmo depois do fim da
“bolha” e de suas consequências catastróficas no começo da década, no mundo e no
Brasil – eliminando centenas ou milhares de empresas ponto-com que não tinham
estrutura nem condições de sucesso – a internet brasileira consolidou sua
posição e seu papel na sociedade.
Com a privatização das telecomunicações, a oferta de meios de transporte dos
sinais, bem como de acesso e conteúdo, fez explodir o desenvolvimento da
internet no País. Passando a competir num novo ambiente, a Embratel acabou
mostrando sua competência e a qualidade de sua infra-estrutura, na implementação
do maior backbone da América Latina.
O que nos faltou até há pouco foi uma política nacional de desenvolvimento da
banda larga. É claro que, se o governo tivesse elaborado políticas públicas, com
metas de universalização, legislação adequada, desoneração fiscal desses
serviços e, principalmente, um plano nacional de banda larga – sério e digno
desse nome – em comum acordo com as operadoras, caberia exigir dessas empresas o
cumprimento de objetivos e metas, em lugar de ficar simplesmente criticando
essas prestadoras de serviço.
Quando o governo é frouxo e omisso no cumprimento de seu papel de regulador,
fiscalizador e formulador de estratégias de desenvolvimento setorial, quando
deixa tudo por conta das operadoras, sem nenhuma política pública e nenhum
plano, o resultado é sempre insatisfatório, em qualquer país do mundo. Foi o que
aconteceu no Brasil até o começo de 2010.
Ora, banda larga para internet é comunicação de dados e não telefonia. Assim, as
operadoras alegam que seus contratos de concessão nunca previram nenhuma
obrigação de oferecer acesso de banda larga. E elas têm razão – porque o governo
Lula não moveu uma palha na formulação de uma política nacional de banda larga
ou de um plano setorial.
Vale a pena voltarmos a esses aspectos para aprofundá-los, num próximo artigo.