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Fonte: ClippingMP - Origem: Valor Econômico
[28/06/11]
Pacote (de desoneração tributária) reduzirá taxação na área de telecomunicações
- por André Borges e Cristiano Romero (Entrevista com Paulo Bernardo)
O governo prepara um pacote de desoneração tributária para o setor de
infraestrutura de telecomunicação. Nos moldes da Lei do Bem, que reduziu a carga
de impostos sobre computadores e modens, o objetivo é estimular a produção
nacional de equipamentos pesados de rede, como fibras ópticas, roteadores e
antenas de transmissão de dados.
Em entrevista ao Valor, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, disse que a
meta é fazer com que, em 2014, a velocidade média da internet no país seja de 5
megabits por segundo - hoje, 70% dos acessos são feitos com menos de 1 megabit.
As medidas fazem parte da política industrial a ser anunciada possivelmente na
segunda quinzena de julho.
O governo quer atrair fabricantes de equipamentos para o Brasil, mas exigirá em
troca um índice de nacionalização, ainda a ser definido. Bernardo revelou também
que o governo está trabalhando num plano ambicioso para oferecer internet
ultrarrápida nas 12 cidades-sede da Copa do Mundo em 2014.
A estatal Telebrás entrará no projeto. "Ela vai se concentrar em investimentos
na construção de redes de fibra óptica e na venda de tráfego. Fará isso sozinha
e também em parcerias", informou o ministro.
Paulo Bernardo quer fechar, ainda nesta semana, a negociação com as operadoras
sobre o Plano Geral de Metas de Universalização da telefonia fixa.
Paralelamente, pretende licitar a exploração de redes de internet sem fio na
zona rural, iniciativa que já atrai o interesse de empresas estrangeiras.
O ministro informou que o governo vai exigir capacidade financeira dos
detentores de concessões de rádio, para evitar fraudes, como o uso de laranjas,
que escondem o verdadeiro proprietário das empresas. Paulo Bernardo gostaria,
também, de proibir a concessão de rádios a políticos, mas ressalvou que a
mudança dependeria da lei.
Ele declarou ser favorável à reabertura do mercado de TV a cabo, regulamentada
recentemente pela Anatel, e acredita que o PL 116, que autoriza as empresas de
telefonia a atuar nesse segmento, será aprovado até o fim do ano. "Foi feito um
acordo em relação ao conteúdo. As teles não poderão produzir conteúdo, apenas
distribuí-lo", disse.
Entrevista: Orçamento de R$ 200 milhões será usado para instalar uma rede
sofisticada nas 12 cidades-sede
A construção de aeroportos e estádios está longe de ser a única preocupação do
governo entre os projetos de infraestrutura ligados à Copa do Mundo. As
prioridades também passam diretamente pela pasta das Comunicações, onde uma
estratégia começou a ser desenhada para atender a demanda por internet e
transmissão de dados em tempo real.Por meio da Telebrás, o governo vai instalar
uma rede sofisticada de internet nas 12 cidades que sediarão os jogos de 2014,
um projeto que, pelo orçamento inicial, é estimado em cerca de R$ 200 milhões. O
projeto é parte de um conjunto de medidas desenhadas pelo governo para
disseminar o acesso à internet rápida pelo país.
Para fazer com que, nos próximos três anos, boa parte da população tenha acesso
a um serviço de até 5 megabits por segundo, o governo vai desonerar a aquisição
de equipamentos de rede para as teles, licitar novas redes de acesso sem fio e
estimular a competição no setor com a abertura do mercado de TV a cabo. Em
contrapartida, o Planalto cobrará o cumprimento de padrões mínimos de qualidade
na entrega dos serviços.
Na entrevista concedida ao Valor, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo,
afirmou ainda que irá trabalhar na publicação do polêmico marco regulatório para
a mídia. Bernardo refuta qualquer intenção de censura ou controle da imprensa.
"Somos contra qualquer ação nesse sentido. Estamos falando de questões como
exigências de regionalização do conteúdo e fiscalização contra a discriminação
racial", disse.
Valor: Que exigências o governo fará às teles no projeto de massificação da
banda larga?
Paulo Bernardo: Todas as empresas, de telefonia móvel e fixa, vão oferecer
internet por R$ 35, com velocidade mínima de 1 megabit por segundo. Onde elas
tiverem dificuldades para fazer isso, poderão usar tecnologia móvel. Há
aproximadamente 3 mil municípios com tecnologia 3G implantada. Isso serve para
fazer internet também.
Valor: As teles ainda reagem ao plano oficial?
Bernardo: As empresas estão aderindo. Onde há telefone fixo de uma
concessionária, a tendência é que a tele ofereça um pacote para diminuir os
custos da internet ou da assinatura básica. Provavelmente, as empresas vão
diminuir o valor da assinatura básica. Informamos à presidenta que estamos
fazendo uma mudança na oferta de serviço. Isso vai significar a oferta de
internet pela metade do preço atual. Um estudo da Firjan [Federação das
Indústrias do Rio de Janeiro] mostrou que o custo médio no Brasil para internet
de 1 megabit por segundo é R$ 70,85. Com o programa que vamos lançar, o preço
vai cair à metade e vamos aumentar a velocidade de acesso.
Valor: Em quanto?
Bernardo: Hoje, quase 70% do acesso à internet no Brasil é feito com velocidade
inferior a 1 megabit por segundo. Teremos medidas de caráter regulatório e de
incentivo para, em 2014, oferecer internet com maior velocidade. Todo mundo
concorda que 1 megabit não é muito. Esse é o pacote básico que estamos
preparando, mas é só o primeiro passo. O que realmente sensibiliza a presidenta
é outra coisa.
Valor: O quê?
Bernardo: Ela acha que isso já deveria ter sido feito há muito tempo. Estamos
preparando medidas regulatórias e investimentos públicos, além de incentivos ao
setor privado, para superar esse cenário nos próximos anos.
Valor: De que forma?
Bernardo: Estamos trabalhando para ter, em 2014, internet com velocidade mínima
de 5 megabits, por exemplo. É isso o que a presidenta acha relevante. Então,
para chegar lá, a Anatel tem que votar alguns regulamentos que vão estimular a
competição entre as empresas. O governo, por sua vez, adotará medidas para
incentivar a construção de redes de telecomunicação. Na política industrial que
estamos elaborando, já está acertado que haverá um regime tributário
diferenciado para a construção de redes.
Valor: O que vai prever esse regime?
Bernardo: Vamos diminuir os impostos para a fabricação de fibras ópticas,
roteadores, transmissores, enfim, de todos os equipamentos de infraestrutura
pesada necessários para montar uma rede.
Valor: O governo vai zerar os impostos?
Bernardo: Vamos reduzir em cerca de 30% tributos federais como IPI, PIS e Cofins.
Vai funcionar nos mesmos moldes da Lei do Bem. A presidenta quer que a gente
exija conteúdo nacional. Vamos dar incentivos para que os equipamentos sejam
produzidos no Brasil.
Valor: Já foi definido o índice de nacionalização?
Bernardo: Há uma consulta pública da Anatel falando em 30%, mas, como estamos
discutindo a política industrial, o índice vai ser definido lá. A presidenta vai
querer um índice maior de nacionalização. Além disso, vamos adotar medidas
regulatórias para melhorar a qualidade dos serviços. A ideia é licitar este ano
uma frequência que serve para internet banda larga baseada em rádio e, no ano
que vem, o chamado LTE (Long Term Evolution), a quarta geração de telefonia
celular, que vai atender à Copa do Mundo.
Valor: Como será a atuação da Telebrás nesse projeto?
Bernardo: Ela vai se concentrar em investimentos na construção de redes de fibra
óptica e na venda de tráfego. Fará isso sozinha e também em parcerias.
Valor: E como está hoje a relação entre a Telebrás e as operadoras privadas?
Bernardo: Hoje, todo mundo quer conversar com a Telebrás para comprar tráfego.
Estamos dizendo às teles que a Telebrás tem condições de oferecer tráfego mais
barato, mas vamos exigir que a empresa trabalhe nos moldes do nosso plano de
banda larga. A gente dá internet no atacado, mas as empresas têm que vender no
varejo em condições que sejam condizentes com o que o governo está propondo. As
teles achavam que nós queríamos montar outra empresa para ficar concorrendo no
varejo. Nós não temos condições de fazer isso, nem queremos. As empresas também
achavam que íamos vender serviços de banda larga sem licitação para órgãos
governamentais. Esse temor está sendo superado, porque todos reconhecem que o
país precisa fazer muito investimento em infraestrutura, senão, vai estrangular.
Valor: Qual será o tamanho desse pacote de desoneração?
Bernardo: Não temos a estimativa ainda, mas é bastante. Se considerarmos só o
que Telebrás pretende coordenar - porque não terá dinheiro apenas dela, haverá
associações -, até 2015 serão investidos R$ 10 bilhões. Outro setor
importantíssimo para fomentar a banda larga é o de TV a cabo.
Valor: Por quê?
Bernardo: Quem faz infraestrutura para fornecer TV também tem possibilidade de
levar internet de alta qualidade e telefonia. Acontece que estamos desde o ano
2000 sem dar licença de TV a cabo. Fizeram uma legislação, a meu ver errada, que
inibiu o número de empresas que podiam atuar nos municípios, dependendo do
tamanho de cada um. Isso congelou o setor, não entrou mais ninguém. Hoje, temos
um serviço caro e concentrado.
Valor: O que o governo pretende fazer nessa área?
Bernardo: Estamos fazendo algumas coisas. A Anatel herdou a tarefa de regular o
setor, com base em um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), que estabeleceu
que esses serviços não são mais concessionários, mas, sim permissionários. A
partir dessa definição, a Anatel passou a emitir autorizações a empresas para
construir rede própria, abrindo o mercado, sem impor limites para investimentos
no setor. Essa decisão causou barulho. Chegou a ser dito que o Estado, por não
fazer novas concessões, estaria abrindo mão de receita.
Valor: E não está?
Bernardo: Não é verdade.
Valor: As empresas que estão no mercado pagaram bilhões pelas concessões.
Bernardo: A realidade é que queremos a ampliação dos serviços. Agora uma empresa
paga R$ 9 mil pela autorização e pode montar sua estrutura para concorrer. Sou
favorável à resolução da Anatel que definiu essa regra. Além disso, há um
projeto no Senado [o PL 116] que consolida a abertura do mercado para as
empresas de telecomunicação e retira qualquer restrição ao capital estrangeiro.
Valor: O senhor acredita que o PL 116 vai ser aprovado?
Bernardo: Vai passar. Foi feito um acordo em relação à questão do conteúdo. As
teles não poderão produzir conteúdo, apenas distribuí-lo. Para isso, terão de
comprar esse material dos produtores de conteúdo. Isso protege a produção. As
empresas de telecomunicação não poderão ter mais que 50% do capital das empresas
de TV a cabo. Com isso, buscamos um equilíbrio. Hoje, há cerca de 10 milhões de
assinantes de TV a cabo. Com as mudanças, prevemos que nos próximos quatro anos
sejam acrescentados 4,5 milhões de assinantes. Isso também significa internet
para muita gente. O PL, sendo votado, estará já regulado. Até o fim do ano, as
teles devem entrar no mercado de TV a cabo. Há mais de mil pedidos de empresas
para atuar nesse mercado.
Valor: A Copa do Mundo exigirá infraestrutura sofisticada de telecomunicação.
Como o governo pretende tratar desse tema?
Bernardo: Estamos trabalhando em um projeto específico para as 12 cidades que
receberão os jogos da Copa. Teremos internet ultrarrápida nesses locais. Vamos
montar links de grande porte, com alta capacidade de tráfego de dados. Serão
redes especiais, capazes de atender não só a demanda das pessoas, mas de
jornalistas, emissoras de rádio, TV e internet. Já conversei com a presidenta
sobre esse plano, que será um dos grandes legados que a Copa vai deixar para o
país.
Valor: Qual será o papel da Telebrás nesse plano?
Bernardo: A Telebrás vai oferecer estrutura para quem quiser ofertar serviços de
telecomunicação nessas cidades. Ela vai ter a responsabilidade de organizar
isso. Os estudos já começaram. Enviamos técnicos até Londres, onde vai ocorrer a
Olimpíada de 2012. Também estamos fechando o orçamento de tudo o que será
necessário. A Telebrás tem a expectativa inicial que esse projeto custará cerca
de R$ 200 milhões.
Valor: A qualidade atual do acesso à internet é precária. O governo prevê alguma
ação sobre isso?
Bernardo: A presidenta está preocupada. Ela quer que tenhamos regras exigindo
melhor qualidade. Hoje, uma empresa oferece internet com velocidade de 5
megabits, mas quando o usuário faz a conexão está usando 1 megabit. Estamos
analisando alternativas para regular isso. Vamos exigir um padrão claro que
estabeleça a velocidade mínima e média que a empresa tem de entregar ao
consumidor. Teremos novidades também na área de concessão de rádio.
Valor: Quais?
Bernardo: Estamos fazendo uma mudança por decreto. A ideia é estabelecer uma
exigência maior com relação à capacidade financeira de quem ganha a outorga.
Vamos coibir o uso de laranjas e tornar o processo mais transparente. Não
precisamos mudar a lei para isso. As alterações mais de fundo estão ligadas ao
marco regulatório, que estamos discutindo.
Valor: O governo pretende limitar o acesso de políticos à concessão de rádio?
Bernardo: Hoje não há essa proibição, só se houver mudança na lei. O que eu acho
é que deveríamos separar o sistema político-eleitoral do sistema de radiodifusão
de informações.
Valor: O que significa isso?
Bernardo: Isso quer dizer que deveria ser proibido político ter rádio.
Evidentemente, é algo que teria, primeiro, de ser aprovado pelo Congresso.
Segundo, isso tem de ser balizado. Uma pessoa pode ganhar uma concessão de rádio
e depois decidir sair candidato. A regulação tem de ser muito fina. A lei
eleitoral já cuida de condições de igualdade durante as eleições.
Valor: Como estão as negociações com as operadoras em relação às metas de
universalização de telefonia fixa e internet?
Bernardo: Temos discutido o Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU). Nos
contratos das empresas, está prevista a cada cinco anos uma revisão das metas. A
negociação deveria ter sido fechada em dezembro, adiamos para abril, maio e
agora para o dia 30 de junho. Nesse plano, estamos fazendo uma redistribuição
dos "orelhões" (telefones públicos) porque há lugares com sobra de equipamentos
- os shopping centers, por exemplo - e outros que nem têm aparelhos.
Valor: O governo vai exigir o aumento da oferta?
Bernardo: Não. É só uma redistribuição. Vai ter que aumentar em áreas onde não
tem atendimento, como em escolas rurais e postos da Polícia Rodoviária Federal.
Além disso, estamos criando uma assinatura de telefone fixo para baixa renda.
Foi criado há dois ou três anos o Acesso Individual de Classe Especial (Aice),
mas não funcionou.
Valor: E como essa assinatura vai funcionar?
Bernardo: Vai ser um telefone fixo, cuja assinatura vai custar R$ 13,70 por mês.
Se os Estados abrirem mão do ICMS, custará R$ 9,50. O usuário vai ter direito a
uma franquia de 90 minutos mensais de ligação de fixo para fixo. Com isso, vamos
oferecer uma alternativa a pessoas de baixa renda, especificamente para os que
estão no cadastro único de programas sociais do governo federal.
Valor: No Brasil, disseminou-se o uso de telefone celular. Há demanda nova por
telefonia fixa?
Bernardo: Há demanda e capacidade instalada. Achamos que não haverá um custo tão
grande para as operadoras. Esse serviço atende um segmento importante da
população que não pode pagar uma assinatura básica de R$ 44 por mês.
Valor: Quantas famílias deverão ser beneficiadas?
Bernardo: Se acrescentarmos à telefonia fixa 3 milhões de famílias, já teremos
um resultado muito relevante.
Valor: As teles vão abrir mão da assinatura básica de R$ 44?
Bernardo: Não abrirão mão de nada, porque hoje elas não têm esse serviço
funcionando. Nós acreditamos que não haverá um problema orçamentário. Ainda na
área de telefonia, vamos estabelecer metas para a área rural.
Valor: Haverá algum incentivo fiscal para as empresas oferecerem esse produto?
Bernardo: Não. O incentivo é o próprio aumento do tráfego. As teles vão ganhar
dinheiro com isso. Hoje elas têm linhas instaladas que não estão sendo usadas. A
nossa estimativa é que, da rede de telefonia fixa, em torno de 25%, quase 12
milhões não têm telefone instalado. É relevante. Ainda na área de telefonia,
vamos estabelecer metas para a área rural.
Valor: Como isso vai ser feito?
Bernardo: Vamos definir, primeiro, que tecnologia usar. A tendência no governo e
na Anatel é utilizar a radiofrequência de 450 megahertz, que está desocupada e é
boa para isso, porque tem longo alcance e serve também para banda larga. Nossa
ideia é fazer uma licitação para atender a área rural com telefone e internet.
Devemos levar de seis a oito meses para ter uma definição completa disso.
Valor: O projeto de criação de um marco regulatório para a mídia será retomado?
Bernardo: Sim, mas é importante esclarecer que nós nunca quisemos fazer controle
de mídia. É uma regulação que a própria Constituição prevê. Estamos falando de
questões como exigências de regionalização do conteúdo e fiscalização contra a
discriminação racial. Isso não pode ser confundido com censura ou tentativa de
controle. A própria Constituição, no artigo 220, deixa claro que nenhuma forma
de censura será admitida e, independentemente disso, somos contra qualquer ação
nesse sentido.
Valor: Mas o ex-presidente Lula tem sido apontado como um defensor do controle
da mídia.
Bernardo: Não se trata de controle de mídia. O que o Lula defende se aplica mais
a uma regulamentação do direito de resposta, de uma lei para assegurar isso. Não
há relação com o projeto de regulação da mídia, que, aliás, também não se aplica
a jornal impresso, revista e internet, mas apenas a rádio e televisão, que são
concessões. O projeto vai sair, mas nossa prioridade agora é resolver a situação
do acesso à internet. Na virada do ano passado, circulou a ideia de que o
governo queria, de alguma forma, cercear o direito de expressão ou controlar o
que é veiculado na mídia. Nunca quisemos isso, sempre brigamos por mais
democracia.