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Fonte: Blog do Ethevaldo Siqueira / Estadão
[07/03/11] Bernardo
nas Comunicações - por Ethevaldo Siqueira
Paulo Bernardo é uma grata surpresa, como ministro das Comunicações. Posso estar
enganado, mas a primeira impressão que me passou foi a de um homem público
realmente sério e interessado na solução dos problemas e do progresso desse
setor, que, segundo suas palavras, é considerado “absolutamente vital” – na
visão do governo, “pois o mundo e o País dependem cada vez mais da informação,
no momento em que o Brasil se prepara para ser a quinta economia do planeta”.
Conversei durante quase uma hora com o ministro Paulo Bernardo, das
Comunicações, com a participação de meu colega, repórter Renato Andrade, da
Sucursal do Estadão em Brasília, em entrevista exclusiva que nos concedeu no dia
24 de fevereiro. A conversa foi a mais franca, aberta e transparente, sem fugir
a nenhuma pergunta.
Depois de oito anos, acho que temos um ministro das Comunicações realmente
disposto a trabalhar com seriedade pelo desenvolvimento do setor, sem distorções
ideológicas, sem chavões e com propostas adequadas ao mundo atual.
Não se surpreendam, leitores, com este elogio. Minha escola de jornalismo não me
proíbe de aplaudir, ainda que de forma contida, tudo que me parece positivo e
elogiável em qualquer governo ou homem político. Como tenho afirmado em outras
oportunidades, torço, sim, como brasileiro, para que o ministro Paulo Bernardo
faça a melhor gestão, resgate não apenas o Ministério que dirige – tão esvaziado
e degradado nos últimos oito anos – mas, principalmente, o setor de
Comunicações, como um todo.
Marco regulatório
Analisemos sua entrevista, publicada na íntegra neste blog, começando pelo tema
da legislação setorial. Tenho afirmado neste blog que a maior prioridade das
Comunicações no Brasil hoje é um novo marco regulatório, isto é, uma nova Lei de
Comunicações, moderna e que contemple, acima de tudo, o processo de convergência
digital que, praticamente, eliminou as fronteiras entre telecomunicações e
radiodifusão. Paulo Bernardo havia dito na manhã daquele dia 24, em palestra
proferida no evento Políticas de (Tele)Comunicações, em Brasília, que não
pretende fazer uma Lei de Comunicação, um marco regulatório abrangente, mas
prefere legislar por etapas. (“Governo
não vai investir bilhões em banda larga” )
Na entrevista ao Estadão, retificou: “Isso ainda não está definido. Sei que
poderíamos fazer um projeto abrangente, com todos os aspectos de forma coerente.
Mas será muito mais difícil aprová-lo porque teremos todos os interesses
contrários, unidos, contra muitos desses aspectos. O que eu disse foi apenas uma
ideia, uma sugestão, em resposta a uma pergunta do auditório, sobre a questão da
produção independente nacional e regional”.
O grande risco de se fazer um marco regulatório em etapas, com diversas leis
específicas e segmentadas, é resultar, no final, em uma espécie de Lei
Frankenstein, um monstro com olho na testa, quatro braços e pernas muito finas.
Considero, no entanto, muito positiva a disposição deste governo de dar
prioridade à elaboração de uma Lei Geral de Comunicações. E mais: que não se
resuma ao texto deixado pelo ex-ministro Franklin Martins. “Aquele texto pode
ser um ponto de partida. Mas eu ainda não tive a oportunidade de lê-lo com
cuidado. Por isso, acho até que pode conter alguma besteira. É claro que vamos
submetê-lo a uma discussão mais ampla”.
Na mesma linha da presidente Dilma Rousseff, o ministro Paulo Bernardo diz que
não concorda com o chamado controle de conteúdo dos meios de comunicação em
geral: “Uma coisa é regulação. Outra é controle. Temos que aprender a conviver
com a crítica mais ampla. Qualquer tentativa de limitá-la será inócua.”
A disposição do ministro Paulo Bernardo é partir do que for aproveitável do
anteprojeto de Franklin Martins e ouvir a sociedade como um todo.
“O Brasil privatizou”
Será que caberia mesmo ao governo federal investir bilhões na infraestrutura de
banda larga – em especial via Telebrás? Muitas pessoas têm defendido essa tese,
mas a todas elas o ministro dá um recado bem claro e objetivo: ”O Brasil
privatizou as telecomunicações. Cabe, portanto, às concessionárias privadas
fazer os investimentos necessários à implantação da infraestrutura de banda
larga de que necessita o País. Depois, vamos ver o que é preciso fazer.”
Qual é o papel do Estado na área de Comunicações? Paulo Bernardo não tem dúvida:
“Nessa área, muito mais do que realizar, o Estado deve definir políticas
públicas, envolvendo, entre outros segmentos, a internet e a política
industrial. O governo tem que cuidar do lado fiscal. Não lhe cabe investir
pesadamente em banda larga. E não vamos fazê-lo”.
Em lugar de contestar o novo modelo setorial – como fizeram seus antecessores
nos últimos oito anos – o ministro relembra que o papel do Estado, num sistema
privatizado, não é investir bilhões, nem realizar aquilo que as concessionárias
privadas são capazes de fazer.
Além disso, é bom lembrar que o governo federal vive um período de contenção de
gastos. Por outras palavras, o governo não dispõe de recursos para investir
pesadamente em telecomunicações ou banda larga. Só para se ter uma ideia, é bom
lembrar que as operadoras privadas de telecomunicações têm este ano planos de
investimentos muito superiores aos de todo o PAC.
Diante dessa realidade, o papel da Telebrás não pode ser muito ambicioso, quanto
ao volume de investimentos previstos para a implantação do Plano Nacional de
Banda Larga (PNBL).
Rádios e TVs de políticos
Louvável é também a posição do ministro Paulo Bernardo sobre o setor de
radiodifusão, por sua clareza ao condenar as concessões de rádio e TV a
políticos, e defender a revisão do modelo, “de modo a torná-lo mais
descentralizado e mais democrático”. A seu ver, o problema vem de longe, pois,
“durante a Constituinte, centenas de concessões de rádio e TV foram distribuídas
àqueles parlamentares que votassem em favor de certas teses”.
O ministro lembra que o problema das concessões de emissoras de rádio e TV a
políticos vêm de longe. “Até 1988, durante a Constituinte, centenas de
concessões de rádio e TV foram distribuídas àqueles parlamentares que votassem
em favor de certas teses”. Mas adverte: “Esse modelo precisa ser revisto, de
modo a torná-lo mais descentralizado e mais democrático”.
No caso de emissoras em nome de terceiros, ou seja, de laranjas, “a legislação
atual já tipifica esse procedimento como crime”. O ministro acha até que “o
Ministério Público e a Polícia Federal deveriam estar cuidando disso”.
Eis aí um bom recado às autoridades que têm por dever apurar essas
irregularidades. Um dos instrumentos para se combater e corrigir o problema será
a nova Lei de Comunicações, que impedirá a concessão de novas emissoras a
políticos e a renovação de concessões àqueles que se beneficiaram desse recurso.
Isso significa que, progressivamente, o problema poderá ser superado,
provavelmente num horizonte de 8 a 10 anos, estima Paulo Bernardo.
Nomeações políticas
Para o ministro, as nomeações deveriam apoiar-se sempre no critério da
competência em todas as nomeações de diretores das empresas estatais, como
Petrobrás, Banco do Brasil, Caixa Econômica, Correios e outras. “É claro que
sim. Mas nós temos também um sistema político.”
Esse sistema político, argumenta Paulo Bernardo, acaba prevalecendo na maioria
dos países, seja nos países europeus, nos Estados Unidos de Barack Obama ou de
George W. Bush.
Em teoria, o ministro acha que as nomeações para os cargos de confiança e, em
especial, as diretorias das estatais, deveriam ser baseadas exclusivamente na
competência e na probidade comprovadas dos candidatos. Na prática, entretanto,
nem sempre isso acontece. Vejamos o caso dos Correios: é claro que as nomeações
de dirigentes menos qualificados por pressão do PMDB e do ex-ministro Hélio
Costa foram as causas principais dos escândalos dos Correios.
Paulo Bernardo tem outra explicação: “O que houve foi um descuido, com sérios
problemas de gestão. Hoje temos uma diretoria com currículos bem selecionados e
que não foi indicada por ninguém, nenhum partido”.
A tragédia fiscal
O problema fiscal parece ser o mais sério que as telecomunicações enfrentam no
Brasil. O ministro sugere amplo diálogo entre governo federal e os governadores
para negociar uma redução do ICMS, em especial nos serviços de banda larga. A
tributação sobre telecomunicações no Brasil é uma das maiores do mundo e alcança
a alíquota média de 43% sobre o valor dos serviços.
Outra distorção nas telecomunicações vem desde os anos 1990. É o confisco da
maior parte dos fundos setoriais, que deveriam, por lei, ser investidos na
universalização dos serviços, na fiscalização e no desenvolvimento tecnológico.
Nos últimos 10 anos, entretanto, eles têm sido apropriados pelo Tesouro Nacional
num montante que já supera os R$ 32 bilhões. Se investidos na implantação de uma
rede de banda larga, esses R$ 32 bilhões permitiriam ao Brasil contar com uma
das melhores infraestruturas nessa área. “Sim, mas continuaríamos a ter
problemas de desequilíbrio e juros mais altos” – justifica o ministro.