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Leia na Fonte: Blog de Orlando Barrozo
[26/02/12]
O golpe do Ginga
- por Orlando Barrozo
Pode-se aguardar para as próximas semanas a ação judicial dos fabricantes de
televisores contra a portaria que obriga a introdução do DTVi (Ginga)
nos aparelhos a partir de 2013. Essa é uma novela que não deve terminar tão
cedo. O governo cansou de ouvir as queixas dos fabricantes e decidiu dar uma
sonora rasteira em todos eles: publicou a portaria no
Diário Oficial, na última quinta-feira, e agora não há mais negociação. A
decisão foi dos ministros do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, e de Ciência e
Tecnologia, Marco Antonio Raupp – este, na verdade, acabou de assumir o cargo,
no lugar que era de Aloizio Mercadante, e mal sabe o que está acontecendo; na
verdade, Mercadante era um importante interlocutor da indústria eletrônica, que
agora se vê ainda mais distanciada do governo federal.
A questão tem seu lado técnico, mas também fortes implicações políticas.
Tecnicamente, o governo exige que todo o parque instalado de televisores seja,
até a Copa do Mundo, compatível com interatividade. Parte dos ministros e seus
assessores técnicos acha que isso irá gerar empregos, atendendo a uma antiga
(desde 2007) reivindicação da indústria de software. Equipados com o Ginga, os
TVs podem receber, por exemplo, aplicativos de interesse do governo, que pensa
com isso modernizar os serviços públicos até 2014. Com um TV desses, o usuário
poderia acessar em casa informações de setores como saúde, previdência etc.
Parece bonito, mas – como tudo que vem do governo – é bom desconfiar. Primeira
ressalva: o preço dos TVs deve aumentar. Segunda: vários fabricantes já lançaram
TVs com
interatividade, e o consumidor simplesmente ignora esse recurso; a maioria,
por sinal, nem tem interesse nele, como de resto acontece no mundo inteiro.
Interatividade é coisa de computador, e o governo faria muito melhor se
ampliasse seus serviços pela web. Um terceiro ponto de questionamento é que a
portaria faz distinção entre TVs comuns e TVs conectados (os chamados Smart
TVs). Para os primeiros, estipula que 75% dos itens produzidos no Brasil deverão
ter o Ginga em 2013; para os conectados, o percentual é de 100%. Mais: os
fabricantes devem “abrir” os códigos IP dos TVs para os desenvolvedores
indicados pelo governo.
Aí é que o problema passa a ser, também, político. Embora a indústria não tenha
chegado ainda a um consenso, é praticamente certo que os principais fabricantes
não vão aceitar abrir seus códigos, pois é isso o que os diferencia da
concorrência. Do ponto de vista mercadológico, essa exigência não faz o menor
sentido. Seria como pedir a um técnico de futebol que antecipe sua estratégia
antes do jogo começar. No mínimo, dá uma boa briga na Justiça.
O maior problema, a meu ver, é que o governo tomou essa decisão sem nem se dar
ao trabalho de saber quais conteúdos interativos será possível ao consumidor
acessar. O ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, disse ao site
Convergência Digital que irá chamar as emissoras para conversar a respeito,
o que é mero jogo de cena. Nenhuma das grandes redes tem interesse em oferecer
interatividade em sua programação, pelo bom motivo de que ela atrapalha, e não
ajuda, o telespectador. Todas as pesquisas já feitas mostram que o usuário,
quando está assistindo a sua novela ou a seu jogo de futebol, não quer ser
interrompido. É consenso no meio publicitário que ninguém irá investir nesse
tipo de mídia; e, sem publicidade, nenhuma emissora irá manter esse conteúdo no
ar.
Impressionante como, na área de tecnologia, este governo cria problemas onde
eles não existem. Dá até a impressão de que esses ministros não têm coisas
importantes com que se preocupar!!!