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Leia na Fonte: Teletime
[12/12/12]
Entrevista com o presidente da Unicel, José Roberto Melo da Silva
"Para Unicel, transação com Nextel viabiliza pagamento de dívidas e estimula a
competição"
A Unicel voltou a ocupar destaque na mídia e nas pautas da Anatel desde que, há
pouco mais de um mês, protocolou junto à agência um pedido de anuência prévia
para que sua outorga de SMP (e as respectivas frequências) seja transferida para
a Nextel. O que se sabe, até aqui, é que a área técnica e a área jurídica da
agência são contrárias à operação. Consideram que há sobreposição de licenças
entre as duas empresas e avaliam que, com o processo de cassação da outorga da
Unicel, a transferência perderia o objeto. Há algumas semanas TELETIME procurava
a empresa, sem sucesso. Esta semana, contudo, a empresa concordou em falar. Em
entrevista concedida por e-mail, o presidente da operadora, José Roberto Silva,
concordou em dar a sua versão para os recentes episódios envolvendo a empresa.
Em essência, o que ele diz é que ao vetar a transferência da Unicel para a
Nextel a agência não estaria sendo zelosa, nem com a competição nem com os
credores da empresa, governo incluído. "Vetar a transação viola o direito difuso
do consumidor em SP por mais competição, do vendedor que quer pagar suas
dívidas, do comprador que tem o direito de procurar condições isonômicas com
mais espectro, dos empregados de receber seus créditos trabalhistas, dos
credores privados e da própria União, Tesouro, INSS, FGTS e a própria Anatel",
diz ele. São mais de R$ 600 milhões em dívidas, sendo a maior parte (R$ 300
milhões) com os credores (que segundo José Roberto Silva já renegociaram, em sua
maioria, um desconto com a Nextel) e depois com a própria Anatel (R$ 270
milhões, sendo R$ 150 milhões já vencidos).
A empresa ainda critica a Anatel por ter demorado a adotar medidas
pró-competição, diz ter sido prejudicada pelas atitudes da Superintendência de
Serviços Privados da agência e acusa as operadoras de telecomunicações de
manterem um cartel. A seguir, a íntegra da entrevista, no formato de perguntas e
respostas.
Teletime - Quem são, atualmente, os acionistas da empresa Unicel? Quais as
licenças que vocês têm junto à Anatel?
José Roberto Silva - A UNICEL possui autorização SMP na área 011, com outorgas
de radio frequências associadas nas faixas de 1,8 GHz e 900 MHz. Desde sua
fundação em 2003 até a cessão de 100% do controle para NEXTEL, pendente de
aprovação pela ANATEL, todas as cotas pertenceram à minha família.
Teletime - Por que o projeto da Unicel não deu certo? A empresa ainda mantém
alguma operação?
José Roberto Silva - O projeto Unicel deu certo. Ela investiu R$ 500 milhões e
montou, com tecnologia nacional, a primeira operadora transparente de baixo
custo do Brasil. Entramos em operação em 2008 com tarifação e extrato online
para pré-pago, depósito, transferência e saque de dinheiro entre contas.
Serviços que as grandes operadoras não oferecem até hoje. Cumprimos todos os
compromissos de cobertura, além de outros acessórios. Em três anos de operação
havíamos recebido uma multa, por erro no registro de coordenadas de um site.
Mas, infelizmente, intermináveis conflitos com a SPV (Superintendência de
Serviços Privados da Anatel) destruíram a janela de oportunidade como negócio.
Sempre tratada como "precária", a Unicel amargou 18 meses de disputa até
garantir, por força de acórdão do TRF1, sua licença. Com este tempo perdido,
aquela que seria a quarta operadora em SP, entrou no mercado sendo atropelada
pela Oi fazendo "dumping" das chamadas "ilimitadas" para qualquer lugar do
Brasil. Não tivemos chance. Os conflitos continuaram e outros eventos
regulatórios não tinham fim, a licença do interior do Estado de SP, crucial para
atratividade da operadora, licitada em dezembro de 2007, acabou negada em meados
de 2011... Só para encerrar o assunto, mesmo quando ganhamos, como no caso da
VU-M (valor pago pela interconexão entre redes fixas e móveis) maior por conta
do não PMS (Poder de Mercado Significativo), ganhamos este ano, cinco anos
depois do início do processo. Enfim, as medidas pró-competição recém anunciadas
chegaram tarde demais para a Unicel. Ela definhou por mais de três anos, até que
todos os seus clientes migrassem para outras operadoras e os controladores
fossem obrigados a vender a empresa para um operador estabelecido.
Teletime - Qual é hoje o tamanho e a natureza da dívida da empresa? Pode-se
dizer que seja uma empresa falida ou existe um processo de recuperação judicial
em curso?
José Roberto Silva - Em números aproximados, a dívida corrigida passa de R$ 600
milhões. São R$ 270 milhões com ANATEL, sendo R$ 160 milhões vencidos. Cerca de
R$ 30 milhões em débitos trabalhistas, R$ 10 milhões em impostos e R$ 300
milhões com credores privados. Não há falência decretada ou sequer requerida.
Como o negócio não deu certo, a dívida tinha que ser reestruturada para
viabilizar a venda, e a opção de recuperação judicial esbarrou no vácuo jurídico
pois a Nova Lei de Falência e Recuperação é mais recente que a LGT. Pela nova
lei, a ANATEL é credor quirografário, ou seja, não garantido, e em caso de
deferimento do pedido de recuperação, a ANATEL teria sua dívida reestruturada,
diga-se descontada, nos mesmos percentuais de todos os demais credores. Um
inferno astral que o comprador preferiu evitar fazendo a chamada recuperação
branca, ou seja diretamente com os credores e fora dos tribunais. O problema é
negociar individualmente com centenas de credores, foi um processo longo.
Teletime - Como é o acordo com a Nextel? O acordo com a Nextel prevê algum
pagamento para os sócios da Unicel? Quem são os principais credores da empresa?
José Roberto Silva - Não posso dar detalhes do acordo, mas no mundo dos
negócios, quando os credores têm sua dívida descontada o capital foi embora há
muito tempo. Os sócios perderam tudo.
Teletime - Quando esse acordo com a Nextel começou a ser desenhado? A Anatel e
os credores da Unicel foram informados dessa negociação?
José Roberto Silva - As conversas começaram em meados do ano passado quando a
base de clientes minguou. Ninguém dá início a um processo deste sem avisar
antecipadamente a ANATEL, mas quanto aos credores, souberam quando a negociação
com cada um deles começou. O processo foi muito discreto.
Teletime - Quando foi pedida a anuência prévia junto à agência?
José Roberto Silva - 26 de outubro.
Teletime - A área técnica da Anatel alega que a sobreposição de licenças entre
Nextel e Unicel por si só já impediria a anuência. Como vocês respondem a isso?
José Roberto Silva - A livre iniciativa é a base da atividade econômica,
conforme a Constituição Federal e a própria LGT. Estão invertendo a ordem das
coisas. A ANATEL só pode vetar a transação se ela ofende a lei ou o direito de
outrem. No caso, ou a ordem econômica por atentado à competição, ou no risco
para prestação do serviço de interesse público. Vetar a transação viola o
direito difuso do consumidor em SP por mais competição, do vendedor que quer
pagar suas dívidas, do comprador que tem o direito de procurar condições
isonômicas com mais espectro, dos empregados de receber seus créditos
trabalhistas, dos credores privados e da própria União, Tesouro, INSS, FGTS e a
própria ANATEL. Só ganha o cartel das operadoras que dão ao Brasil serviços
entre os piores e mais caros no mundo.
Teletime - De outro lado, há um processo em andamento na Anatel para cassar a
licença de SMP e o espectro correspondente da Unicel por falta de pagamento pela
outorga. Vocês procuraram a Anatel para regularizar a situação?
José Roberto Silva - Tivemos acesso ao processo na segunda feira, com falta de
diversos documentos. Um PADO comum foi transformado em processo de caducidade da
noite para o dia e apenas depois do pedido de anuência ter sido protocolado...
Ao que sabemos, as operadoras devem em conjunto mais de R$ 25 bilhões e ninguém
corre risco de caducidade por isto.
Teletime - A Lei Geral diz que, em caso de falência, a Anatel retoma o espectro
e as licenças de uma empresa. Não seria essa a situação atual?
José Roberto Silva - Reiterando, não há falência decretada ou sequer requerida.
Teletime - Em que momento a Unicel começou a se relacionar com a Anatel? Qual
foi a primeira outorga pleiteada e quando ela foi liberada?
José Roberto Silva - São doze anos de dor e agonia. Fomos os primeiros a
pleitear MVNO em outubro de 2000. Em fevereiro de 2003, o pedido já no Conselho,
aprovado pela Procuradoria e por incrível que pareça pela própria SPV, foi
arquivado para que se criasse regulamento específico. Outubro de 2000, mais de
dez anos se passaram até se criar a figura da MVNO. Em dezembro de 2003,
peticionamos para usar a frequência de 450 MHz, já como Unicel. A ANATEL
respondeu que faria chamamento público para uma frequência diferente, 410-430,
pois a 450 MHz estava ocupada. Concordamos, participamos do Chamamento em 2004 e
fomos surpreendidos com a interrupção do processo. Começava ali a longa
sequência de conflitos com a SPV. Derrotada no Conselho, que adjudicou a Unicel
como vencedora do lote por inexigibilidade de licitação, a SPV acionou o TCU,
aonde foi derrotada novamente. "Fontes" da ANATEL foram a revista Veja e depois
a CGU, que sem contraditório, questionou o processo. A mídia marrom diz que o
Conselho já decidiu enterrar o caso, mas acreditamos no devido processo legal e
vamos nos manifestar no momento e na forma apropriada.
Teletime - A Unicel ainda mantém algum vínculo contratual, operacional ou
projeto conjunto com as Forças Armadas, Polícia Federal ou Ministério da Defesa?
José Roberto Silva - A Unicel obteve em 2004, licença experimental para faixa de
450 MHz em SME. Por um ano realizou testes com a Polícia Federal, Ministério da
Defesa e Presidência da República. Após o sucesso dos testes, refletidos em
atestados, a continuidade da relação com os órgãos de Estado ficaram no aguardo
da licença comercial, bloqueada até hoje.
Teletime - Em que momento a Unicel passou a pleitear uma licença de SMP? Quando
conseguiram a outorga?
José Roberto Silva - A licitação 001/2005 ocorreu em fevereiro de 2006, a
decisão do TRF1 em outubro de 2006, a abertura de proposta em fevereiro de 2007
e a assinatura de contrato em agosto de 2007.
Teletime - Qual o investimento feito pelos acionistas da Unicel nos projetos de
400 MHz e no projeto de SMP? Que ativos a empresa ainda tem?
José Roberto Silva - Contabilizados, R$ 40 milhões. Quanto aos ativos são os de
Rede, Core, Sites, ERBs e outros ativos relacionados.
Teletime - O marido da ex-ministra Erenice Guerra, José Roberto Campos, foi ou
ainda é acionista da Unicel? Que função ele desempenhou dentro da empresa? Ele
teve ou tem alguma interface com a Anatel?
José Roberto Silva - Campos é um engenheiro eletrônico sênior, formado pela
Unicamp, e veterano de Alcatel, Promon, entre outras empresas. Foi contratado em
2004 para implantar a rede 450 MHz em Brasília, muito antes de se casar e sua
esposa chegar ao poder. Depois foi o engenheiro responsável pela instalação da
rede GSM em São Paulo. Morador do DF, uma vez, teve procuração para retirar
cópia de processo na biblioteca da Anatel, como vários colaboradores também
tiveram. Nunca representou a empresa em qualquer órgão publico, mas por
homonímia, gerou o boato de que a Unicel era do marido de Erenice. Seria cômico,
se não fosse trágico.
Teletime - Os órgãos de defesa ou a Polícia Federal chegaram a interceder em
favor da Unicel junto à Anatel ou ao governo?
José Roberto Silva - Órgãos de Estado, afetados pela falta de alternativas de
mercado, trocaram ofícios com a Anatel.
Samuel Possebon