Prezado Glauber,
Embora não conheça trabalho relacionado com
estudo de impacto mercadológico do Unbundling nas operadoras brasileiras
- suponho que a inexistência decorra do fato de jamais se ter, até o
momento, implementado a prática de qualquer das modalidades reais de
unbundling no Brasil, tal como previsto, em sua forma pura, no art. 155 da
LGT - estou enviando, abaixo, dois links onde você poderá colher detalhes
analíticos da prática da desagregação nos EUA.
Envio também link de notícia sobre a
implantação do unbundling na Nova Zelândia.
Você poderá ver que o ponto comum entre estas
duas realidades estrangeiras é o de que, estando em prática efetiva, no
mercado norteamericano de serviços locais de telecomunicações desde 1.999
(apesar de inserido, de fato, no Ato de 1996), o unbundling gerou imensa
discussão, focada, quase toda, na questão de se ter, por sua imposição a
certos serviços da última milha, contribuído para a inércia inovativa, já
que os investimentos em inovação tecnológica e upgrades de rêdes e
tecnologias recrudesceram significativamente após sua implementação, na
medida em que as "incumbents" se aperceberam do aspecto de que teriam de
repartir, com concorrentes, todo e qualquer benefício inovador que
promovessem em suas próprias rêdes locais....e simplesmente pararam de
fazê-lo.
A questão chegou ao seu ápice com a medida
judicial que foi levada a julgamento da Suprema Côrte/EUA - o caso AT&T v.
Iowa Utilities Board - na qual o Juiz da Suprema Côrte, Stephen Breyer,
teceu severa crítica ao ato da FCC que implantara o unbunbling em 1999,
dizendo da necessidade de que ele fosse regrado minimamente, em preservação
da própria concorrência (dos concorrentes) e, principalmente, dos
consumidores americanos, que estavam perdendo acesso à modernidade.
A FCC, então, após análise alongada da
questão, editou, em agosto/2003, a "Order 03-36", que pode ser colhida do
site da agência (tenho a íntegra desse ato, e acho que vale a pena dar uma
lida pelo menos na fundamentação inicial dele....mas ele tem mais de
oitocentas páginas, e o arquivo passa de dois megas...se quiserem posso
disponibilizá-lo aqui, ou mesmo enviar para o Hélio Rosa diretamente, a fim
de que seja acessado diretamente do site).
Nesta nova determinação, a FCC analisa,
profundamente, os prejuízos, para a inovação tecnológica, que o unbundling
causou nas LECs, e, assim, nos interesses dos consumidores norteamericanos, salientando
que, de acordo com o que decidira a Suprema Côrte, o unbundling deveria ser
retirado dos serviços locais de banda larga, e detalhado quanto a outras
aplicações.
Fixo-me, portanto, Glauber, nesse importante
aspecto para intuir que, como aqui no Brasil, nada se gerou de unbundling
até o momento, senão uma ácida polêmica de contrários ("incumbents" que não
o desejam; "players" que o querem de imediato), deve-se atentar para os
detalhes desta nova ordem da FCC, que, me parece, constitui um inafastável "leading
case" internacional, talvez o mais importante sobre esta questão, sobretudo
para países, como o nosso, que não experimentaram, ainda, a novidade.
Gostaria de ressaltar que, assim como você,
não tenho dúvida de que a competição em telecomunicações é absolutamente
necessária (escrevi sobre isso artigo, monografia, e um livro que detalha o
embricamento do FUST com interesses de consumidores), que toda forma de
monopólio é censurável - seja natural, seja estatal - mas acho que a questão
em si da desagregação exige prudência e cautela, e deve passar um pouco pela
reflexão e muito pela idéia de que, como entendeu o ente regulador
americano, "tudo que é demais sobra".
Acho que, sem que haja um ato normativo
detalhista - quanto à definição dos elementos das rêdes que se sujeitarão à
desagregação; quanto aos termos desta desagregação; quanto aos mecanismos de
solução dos conflitos que surgirem, no âmbito da própria agência reguladora
(inclusive o de mediação e arbitramento, como ocorre hoje com a
interconexão) - e finalmente a firme decisão da agência, e do próprio Cade,
de agirem em policiamento da prática do unbundling, corremos o risco de
repetirmos a parte ruim da experiência norte-americana, que acaba,
justamente por seus maus resultados, de ser significativamente revista.
Abs.,
Fernando Botelho