FERNANDO NETO BOTELHO
TELECOMUNICAÇÕES - QUESTÕES JURÍDICAS
Junho 2005 Índice (Home)
04/06/05
• Fim da Assinatura Básica (1)
----- Original Message -----
From: "Fernando Botelho" <fernandobotelho@terra.com.br>
To: <wirelessbr@yahoogrupos.com.br>; <Celld-group@yahoogrupos.com.br>
Sent: Saturday, June 04, 2005 11:03 AM
Subject: Re: [Celld-group] Re: [wireless.br] ANATEL: FIM DA ASSINATURA BÁSICA
LEVARÁ A ALTA DE TARIFAS
----- Original Message -----
Sr(a)s,
Tenho uma opinião, como consumidor, sobre a assinatura básica: "é um absurdo"!
Porém observando o contexto macro de nosso país, acho difícil acabarmos com ela
por dois motivos:
- O primeiro mais óbvio é o buraco que provocaria nas empresas do setor.
- o segundo é que imagem a seguinte continha: algo em torno de 30 a 40% do
montante arrecadado com as tarifas de todas as operadoras, vai para os cofres do
Estado Brasileiro. Sabendo a sede com que o governo nos cobra os impostos,
alguém vê a possibilidade do governo abrir mão desse
"valorzinho"?
Eu acho difícil, infelizmente!
Porém se nós não pressionarmos,nada mudará nunca!
Abs.
Tássilu Faria.
Prezados,
Pela importância do foro de debates e pela qualidade das manifestações que vão
sendo a cada dia veiculadas nele, acho que uma opinião técnica poderá ser útil
na composição do cenário global desta questão (polêmica) da
assinatura, até porque vários já se manifestaram quanto à repercussão econômica
da eventual extinção da tarifa, e eu me rendo a elas para não buscar mais
"lenha" para esse específico foco da discussão.
A questão técnica, a que me refiro, é a de que o assunto relacionado com a
alteração que se propõe hoje no Congresso (uma nova lei, que irá proibir a
cobrança de tarifa-assinatura, alterando, para isso, a redação do art. 103 da
LGT) causará uma alteração, significativa, na estrutura jurídica dos contratos
(de concessão) que já foram firmados por prestadores de serviços fixos e móveis
de telefonia.
Esses contratos, a exemplo dos contratos em geral firmados no país - que nós, da
área jurídica, consideramos e nominamos "atos jurídicos perfeitos e acabados" -
são protegidos pela Constituição Federal como elementos
definitivos e, assim, infensos ao alcance de novas leis, por isso, insuscetíveis
de alteração em sua estrutura obrigacional básica, por leis novas.
Razões de ordem política, ideológica, principiológica - que não cabe aqui
analisar - determinam isso, isto é, que contratos firmados no país sejam
cumpridos tal e qual celebrados, a despeito de novas leis que venham a
alterar temas neles tratados.
Dito de outra forma, lei nova, no Brasil, não pode retroagir, para alcançar e
alterar itens contratuais celebrados anteriormente a ela.
Se o fizer, a lei nova passa a contrariar, antes, a própria Constituição Federal
onde está protegido o princípio da intangibilidade do contrato (do "ato jurídico
perfeito"), arriscando-se, por isso, a debates de sua inconstitucionalidade,
que, reconhecida, leva à sua inaplicabilidade (já que, no Brasil, somente as
leis constitucionalmente respaldadas podem ser aplicadas).
Contratos de concessão já firmados - entre o Poder Público (no caso, pela ANATEL)
e empresas prestadoras de telefonia - o foram após intensos processos
licitatórios (concorrência pública) que todos conhecemos e que,
antes mesmo de instrumentos jurídicos, constituem parte da própria história
brasileira de telecomunicações da era "pós-Telebrás".
Essas licitações incluíram, dentre várias condições (ou, várias "regras do jogo"
que propunham para a celebração dos correspondentes contratos), o recebimento,
pelas contratantes-prestadoras, de determinadas tarifas, isto
é, de preços públicos, compostos (ou seja, uma somatória de frações
remuneratórias claramente definida: tarifa-com medição + tarifa-sem medição)
como forma de contraprestação pela absorção e prestação executiva dos serviços à
população, pelas operadoras/contratantes.
Esse tarifamento composto foi, em curtas palavras, amparado na disposição da lei
que vigorava no momento da licitação (e que ainda vigora hoje - o art. 103/LGT),
expressamente inserido na oferta pública que foi feita dos
serviços pelo Estado brasileiro através de licitações constantes de editais de
publicidade, e, finalmente, inserido em cada contrato celebrado, pelo mesmo
Estado, com as empresas vencedoras de cada processo licitatório.
Estas tarifas são, por isso, cláusulas ou condições internas de cada contrato,
porque cláusulas e condições das próprias licitações e dos editais que foram
publicados.
Alterar, agora, este sistema de tarifamento, isto é, fazê-lo posteriormente às
licitações e aos contratos que foram celebrados e que estão hoje em execução -
seja para reduzi-lo, ou alargá-lo - equivalerá, antes de qualquer
análise econômica-financeira-atuarial, política, social, a modificação da
estrutura interno-obrigacional-contraprestacional-remuneratória, de cada
contrato já celebrado pelo Estado brasileiro com cada operadora, com a
modificação, conseqüente, das regras das licitações e dos editais que continham
o sistema tarifário e que de modo algum propunham ou anunciavam extinção de item
tarifário durante o prazo de cumprimento contratual.
A lei nova irá, em suma, mudar a vertente anterior que o próprio Estado
brasileiro não só anunciou formalmente e legalmente como condição de concessão
dos serviços, mas praticou, contratualmente, com o mercado, em
cada instrumento firmado.
Esse, o primeiro ponto (técnico, insisto, da questão - da extinção da
tarifa-assinatura frente à Constituição Federal). O outro (ainda
técnico-jurídico) é que, mesmo que se possa eventualmente considerar
constitucional e aplicável uma lei retroativamente modificativa de contratos
pré-firmados, não se poderá deixar de considerar que ela, assim, irá alterar
substancial condição da contratação anterior (no caso, o preço público
remuneratório dos serviços de telefonia já contratados).
Se o fizer, atuará, então, sobre contratos pré-celebrados, e, neste ponto, o
fará como a um "fato do príncipe" (usamos esta expressão em direito público),
isto é, como uma alteração unilateral do Estado brasileiro,
portanto não-consensual, das regras contratadas, o que gera, também nos termos
da Constituição e da própria lei nacional sobre licitações públicas, automático
direito (do contratante atingido pela alteração) a mecanismo
compensatório pela alteração, ao qual damos o nome de "re-equilíbrio
econômico-financeiro" de cada contrato alterado.
Noutro modo de dizer, o contrato alterado por lei posterior terá de ser
legalmente re-equilibrado e, se alterado quanto ao sistema de tarifamento nele
contratado, isto é, quanto à remuneração contraprestacional do
contratante, o re-equilíbrio terá de ser proporcional e também econômico em
relação a esta alteração.
A questão resultará, aí, em saber como o Estado brasileiro, alterando os
contratos e tendo o dever de re-equilibrá-los jurídica e economicamente, irá
colher, de seus já suados orçamentos, recursos para quitação do que hoje
equivaleria a algo em torno de 1/3 da receita operacional das prestadoras de
telefonia, que será retirada do sistema tarifário que vigora atualmente.
Vejam, então, que o risco de esse re-equilíbrio ser satisfeito através do uso da
própria recomposição tarifária, isto é, de reajuste da parcela que irá restar da
própria tarifa pública (a tarifa-com medição), é grande, e, se o é, podemos
antever uma intensa possibilidade de a luta por uma nova lei proibitiva da
assinatura terminar desaguando, por via oblíqua (e, insisto, por razão
eminentemente jurídica), sobre o interesse dos próprios consumidores, que, ao
final, terão de suportar reajustes de re-equilíbrio econômico-financeiro - e,
não mais, de custeio apenas da operação - dos contratos alterados pela nova lei.
Isto será, claro, uma decisão soberana da sociedade brasileira, através do
Congresso, mas que precisa ter os item de legalidade também considerados e, quem
sabe, aritmeticamente medidos, pois, tanto se poderá estar programando uma lei
constitucionalmente inaplicável, quanto uma aplicável norma motivadora de novos
reajustes tarifários compensatórios.
Abraços,
Fernando Botelho
Fim da Assinatura Básica (1)
----- Original Message -----
From: "Fernando Botelho" <fernandobotelho@terra.com.br>
To: <wirelessbr@yahoogrupos.com.br>; <Celld-group@yahoogrupos.com.br>
Sent: Saturday, June 04, 2005 11:03 AM
Subject: Re: [Celld-group] Re: [wireless.br] ANATEL: FIM DA ASSINATURA BÁSICA
LEVARÁ A ALTA DE TARIFAS
----- Original Message -----
Sr(a)s,
Tenho uma opinião, como consumidor, sobre a assinatura básica: "é um absurdo"!
Porém observando o contexto macro de nosso país, acho difícil acabarmos com ela
por dois motivos:
- O primeiro mais óbvio é o buraco que provocaria nas empresas do setor.
- o segundo é que imagem a seguinte continha: algo em torno de 30 a 40% do
montante arrecadado com as tarifas de todas as operadoras, vai para os cofres do
Estado Brasileiro. Sabendo a sede com que o governo nos cobra os impostos,
alguém vê a possibilidade do governo abrir mão desse
"valorzinho"?
Eu acho difícil, infelizmente!
Porém se nós não pressionarmos,nada mudará nunca!
Abs.
Tássilu Faria.
Prezados,
Pela importância do foro de debates e pela qualidade das manifestações que vão
sendo a cada dia veiculadas nele, acho que uma opinião técnica poderá ser útil
na composição do cenário global desta questão (polêmica) da
assinatura, até porque vários já se manifestaram quanto à repercussão econômica
da eventual extinção da tarifa, e eu me rendo a elas para não buscar mais
"lenha" para esse específico foco da discussão.
A questão técnica, a que me refiro, é a de que o assunto relacionado com a
alteração que se propõe hoje no Congresso (uma nova lei, que irá proibir a
cobrança de tarifa-assinatura, alterando, para isso, a redação do art. 103 da
LGT) causará uma alteração, significativa, na estrutura jurídica dos contratos
(de concessão) que já foram firmados por prestadores de serviços fixos e móveis
de telefonia.
Esses contratos, a exemplo dos contratos em geral firmados no país - que nós, da
área jurídica, consideramos e nominamos "atos jurídicos perfeitos e acabados" -
são protegidos pela Constituição Federal como elementos
definitivos e, assim, infensos ao alcance de novas leis, por isso, insuscetíveis
de alteração em sua estrutura obrigacional básica, por leis novas.
Razões de ordem política, ideológica, principiológica - que não cabe aqui
analisar - determinam isso, isto é, que contratos firmados no país sejam
cumpridos tal e qual celebrados, a despeito de novas leis que venham a
alterar temas neles tratados.
Dito de outra forma, lei nova, no Brasil, não pode retroagir, para alcançar e
alterar itens contratuais celebrados anteriormente a ela.
Se o fizer, a lei nova passa a contrariar, antes, a própria Constituição Federal
onde está protegido o princípio da intangibilidade do contrato (do "ato jurídico
perfeito"), arriscando-se, por isso, a debates de sua inconstitucionalidade,
que, reconhecida, leva à sua inaplicabilidade (já que, no Brasil, somente as
leis constitucionalmente respaldadas podem ser aplicadas).
Contratos de concessão já firmados - entre o Poder Público (no caso, pela ANATEL)
e empresas prestadoras de telefonia - o foram após intensos processos
licitatórios (concorrência pública) que todos conhecemos e que,
antes mesmo de instrumentos jurídicos, constituem parte da própria história
brasileira de telecomunicações da era "pós-Telebrás".
Essas licitações incluíram, dentre várias condições (ou, várias "regras do jogo"
que propunham para a celebração dos correspondentes contratos), o recebimento,
pelas contratantes-prestadoras, de determinadas tarifas, isto
é, de preços públicos, compostos (ou seja, uma somatória de frações
remuneratórias claramente definida: tarifa-com medição + tarifa-sem medição)
como forma de contraprestação pela absorção e prestação executiva dos serviços à
população, pelas operadoras/contratantes.
Esse tarifamento composto foi, em curtas palavras, amparado na disposição da lei
que vigorava no momento da licitação (e que ainda vigora hoje - o art. 103/LGT),
expressamente inserido na oferta pública que foi feita dos
serviços pelo Estado brasileiro através de licitações constantes de editais de
publicidade, e, finalmente, inserido em cada contrato celebrado, pelo mesmo
Estado, com as empresas vencedoras de cada processo licitatório.
Estas tarifas são, por isso, cláusulas ou condições internas de cada contrato,
porque cláusulas e condições das próprias licitações e dos editais que foram
publicados.
Alterar, agora, este sistema de tarifamento, isto é, fazê-lo posteriormente às
licitações e aos contratos que foram celebrados e que estão hoje em execução -
seja para reduzi-lo, ou alargá-lo - equivalerá, antes de qualquer
análise econômica-financeira-atuarial, política, social, a modificação da
estrutura interno-obrigacional-contraprestacional-remuneratória, de cada
contrato já celebrado pelo Estado brasileiro com cada operadora, com a
modificação, conseqüente, das regras das licitações e dos editais que continham
o sistema tarifário e que de modo algum propunham ou anunciavam extinção de item
tarifário durante o prazo de cumprimento contratual.
A lei nova irá, em suma, mudar a vertente anterior que o próprio Estado
brasileiro não só anunciou formalmente e legalmente como condição de concessão
dos serviços, mas praticou, contratualmente, com o mercado, em
cada instrumento firmado.
Esse, o primeiro ponto (técnico, insisto, da questão - da extinção da
tarifa-assinatura frente à Constituição Federal). O outro (ainda
técnico-jurídico) é que, mesmo que se possa eventualmente considerar
constitucional e aplicável uma lei retroativamente modificativa de contratos
pré-firmados, não se poderá deixar de considerar que ela, assim, irá alterar
substancial condição da contratação anterior (no caso, o preço público
remuneratório dos serviços de telefonia já contratados).
Se o fizer, atuará, então, sobre contratos pré-celebrados, e, neste ponto, o
fará como a um "fato do príncipe" (usamos esta expressão em direito público),
isto é, como uma alteração unilateral do Estado brasileiro,
portanto não-consensual, das regras contratadas, o que gera, também nos termos
da Constituição e da própria lei nacional sobre licitações públicas, automático
direito (do contratante atingido pela alteração) a mecanismo
compensatório pela alteração, ao qual damos o nome de "re-equilíbrio
econômico-financeiro" de cada contrato alterado.
Noutro modo de dizer, o contrato alterado por lei posterior terá de ser
legalmente re-equilibrado e, se alterado quanto ao sistema de tarifamento nele
contratado, isto é, quanto à remuneração contraprestacional do
contratante, o re-equilíbrio terá de ser proporcional e também econômico em
relação a esta alteração.
A questão resultará, aí, em saber como o Estado brasileiro, alterando os
contratos e tendo o dever de re-equilibrá-los jurídica e economicamente, irá
colher, de seus já suados orçamentos, recursos para quitação do que hoje
equivaleria a algo em torno de 1/3 da receita operacional das prestadoras de
telefonia, que será retirada do sistema tarifário que vigora atualmente.
Vejam, então, que o risco de esse re-equilíbrio ser satisfeito através do uso da
própria recomposição tarifária, isto é, de reajuste da parcela que irá restar da
própria tarifa pública (a tarifa-com medição), é grande, e, se o é, podemos
antever uma intensa possibilidade de a luta por uma nova lei proibitiva da
assinatura terminar desaguando, por via oblíqua (e, insisto, por razão
eminentemente jurídica), sobre o interesse dos próprios consumidores, que, ao
final, terão de suportar reajustes de re-equilíbrio econômico-financeiro - e,
não mais, de custeio apenas da operação - dos contratos alterados pela nova lei.
Isto será, claro, uma decisão soberana da sociedade brasileira, através do
Congresso, mas que precisa ter os item de legalidade também considerados e, quem
sabe, aritmeticamente medidos, pois, tanto se poderá estar programando uma lei
constitucionalmente inaplicável, quanto uma aplicável norma motivadora de novos
reajustes tarifários compensatórios.
Abraços,
Fernando Botelho