FERNANDO NETO BOTELHO
TELECOMUNICAÇÕES - QUESTÕES JURÍDICAS
Março 2007 Índice (Home)
16/03/07
• Novo "super-artigo" de Fernando Botelho: "Portabilidade Numérica"
PORTABILIDADE NUMÉRICA
Fernando Neto Botelho
A Portabilidade Numérica foi aprovada pela Anatel. Em recente reunião de seu Conselho Diretor – a 425ª., ocorrida em 07/março último – a agência reguladora concluiu processo administrativo destinado a preparar ambiente interno-regulatório para edição da norma correspondente. Ela tomará por base proposta formulada pela própria Anatel na Consulta Pública 734, de setembro/2006.
A CP 734 inaugurou o processo administrativo sobre o tema, que se submeteu, com o texto-sugestão da norma, a 63 dias de debate público, durante os quais foram colhidas quase mil contribuições-sugestões. Somaram-se a estas cinco audiências públicas, realizadas em diversos locais do território nacional – São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, e Fortaleza – durante as quais a agência explanou o alcance de sua proposta.
A recente aprovação, pelo Conselho Diretor, equivale ao término da fase administrativa da discussão pública, ou da que deve preceder à edição da norma regulamentar (da portabilidade).
Resta então o derradeiro passo: a expedição do regulamento em si, ou, do RGP-Regulamento Geral da Portabilidade Numérica brasileira.
Mas, afinal, o que é portabilidade numérica ?
Para os menos afeitos à questão técnica e regulatória de telecomunicações, a expressão sugere significados os mais diversos, alguns nem muito precisos quanto a seu alcance material, outros, que permitem certa sensação, induzida pela primeira impressão, de que o empenho regulatório terá se voltado para coordenação do porte, ou do transporte, de números.
Embora não seja isso, não deixa também de sê-lo, sob certo aspecto.
Compreender a portabilidade e localizar limites e resultantes de sua regulamentação equivale a criar mecanismo de controle público e eficiente de sua implantação – que será histórica e inédita no cenário nacional.
Esse, o propósito específico da presente abordagem: convocar, no momento da expedição do RGP-Regulamento Geral de Portabilidade, reflexão sobre pontos neurais de sua estruturação, os quais irão interferir, significativamente, com a vida comunitária e com a vida empresarial de delegatários de serviços de telefonia.
Compreender, refletir, quem sabe, até, alterar pontos importantes da proposta inicial debatida na CP 734, pode evitar que o projeto brasileiro de portabilidade numérica – que, a exemplo de países europeus e do norte da América, deve atingir, depois de implantado, percentuais significativos de migração de terminais e usuários de telefonia, em proporção que se anuncia próxima dos 10% a 15%, ao ano (equivalente a alguns milhões de usuários brasileiros) – faça desaguar, na Justiça, novas e massificadas relações conflituosas das quais a da “tarifa-assinatura” continua a ser um importante e histórico alerta, para gestores da regulação, prestadores dos serviços, consumidores, e integrantes do sistema estatal de solução de conflitos.
Portabilidade Numérica é a denominação “oficial”, ou, a que será atribuída, por regulamento específico, a novo instituto da regulação brasileira de telecomunicações. O instituto ficou hibernado e potencializado na referência genérica dos contratos de concessão e de autorização de certos serviços – que previram abstratos direitos à portabilidade conforme “a regulamentação”.
Agora disciplinada por Regulamento (a ser editado), a portabilidade numérica passa a constituir instituto ao qual se sujeitarão atores da relação jurídico-prestacional de telecomunicações (o poder-público delegante, através de seu órgão regulador; os delegatários-prestadores dos serviços; e os consumidores-usuários destes). A nenhum se assegurará imunidade à nova norma. Daí, a seriedade da conferência da exatidão de seus disciplinamentos.
A Portabilidade Numérica assegura, a usuários de telecomunicações, direito de manutenção de respectivos códigos (numéricos) de acesso, obtidos quando da contratação primitiva, independentemente do prestador ao qual se vinculem por relação contratual.
É também expressão de um direito público – que, por se consagrar, agora, em norma jurídica-regulatória, se transmuta em direito subjetivo, oponível, pelo usuário, ao Estado delegante, consequentemente, a seus delegatários-prestadores executivos.
Nesta correlação, está presente o dever imposto a cada um dos prestadores-particulares executores dos serviços. Resume-se ele no encargo (que a norma lhes atribuirá), de garantirem plena e eficaz satisfação dos usuários-assinantes, na busca da portabilidade.
Noutro modo de dizer, se ao usuário a norma garante a manutenção do primitivo código (numérico) de acesso, a despeito de nova vinculação contratual, é ele, o código em si, que passa, por obra da norma, a integrar o patrimônio, ou, a personalidade jurídica, individual, do usuário, tornando-se elemento oponível ao universo de prestadores do serviço, que deverão se situar, em pólo oposto ao dos usuários, como garantidores de sua portabilidade.
A nova contratação de serviços – atingidos pela portabilidade numérica – confere, assim, pela norma regulamentar nova, eficácia à cláusula até o momento potencializada (cláusula suspensiva) pela delegação. Usuários passam a fruir mecanismos, inclusive judiciais, se necessário, de exigência da manutenção dos seus respectivos códigos de acesso, a despeito das primitivas ou futuras vinculações contratuais.
Não é coisa simples, como se vê, de conceber, e não é também de se configurar, nem tecnológica, nem juridicamente.
Pôr, de um lado, o universo dos consumidores de serviços, e, de outro, o dos prestadores – que, por sua vez, por obra da delegação, inseriram-se em mercado executivo subjeito a regras não só públicas-estatais, mas também privadas-obrigacionais, inerentes à iniciativa livre e competitiva “de mercado” – submetendo, uns e outros, a disciplina segundo a qual deverão migrar, entre eles, códigos (numéricos) de acesso a serviços, não é tarefa fácil.
Por não sê-lo, não deve ser levada a cabo sem adequada reflexão, que meça, para todos, condicionantes e caminhos ponderáveis, razoáveis, a serem seguidos.
A serem atingidos pela norma nova, de migração dos Códigos de Acesso, ou, dos que irão se submeter à regra da portabilidade numérica, estão todos os serviços de telefonia móvel e fixa do país – o SMP-Serviço Móvel Pessoal e o STFC-Serviço de Telefonia Fixa Comutada.
Justamente, portanto, os de maior capilaridade, determinantes de índices de maior teledensidade, maior abrangência social, maior número de assinantes – aproximadamente 150 milhões de usuários (de serviços fixos e móveis de telefonia) - serão os atingidos pelo efeito do regramento inovador, da portabilidade numérica.
Pelo lado dos prestadores (do SMP e do STFC), estarão submetidos todos os delegatários da telefonia fixa – que atuam em regiões do PGO-Plano Geral de Outorgas – além de todos os da telefonia móvel.
Nesta proporção de importância, abordaremos, a seguir, tres aspectos específicos da questão, que pudemos observar no texto normativo proposto na (agora aprovada) CP 734.
Ler a continuação em Portabilidade
Numérica com estes tópicos:
I – A estrutura da portabilidade:
II – O Sigilo de Dados
III – Os Custos da Portabilidade
Conclusão