Michael Stanton
WirelessBrasil
Ano 2000 Página Inicial (Índice)
26/06/2000
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Segurança na comunicação
governamental
Ao baixar em 13 de junho o decreto 3.505 (o texto se
encontra em
http://www.certisign.com.br/Decreto.zip) o governo federal assumiu
publicamente a importância da segurança da informação na esfera pública,
especialmente a segurança dos sistemas de computação, e da comunicação, seja por
computador ou por outros meios.
Este decreto determina que as ações relativas à segurança de informação no País
sejam tomadas pela Secretaria-Executiva do Conselho da Defesa Nacional.
Deste conselho fazem parte o presidente e vice-presidente da República, os
presidentes da Câmara e do Senado, e os ministros militares, da Justiça, da
Fazenda e das Relações Exteriores.
Entretanto, o primeiro dos pressupostos do decreto é "assegurar a garantia ao
direito individual e coletivo das pessoas, à inviolabilidade da sua intimidade e
ao sigilo da correspondência e das comunicações, nos termos previstos na
Constituição".
Deve-se considerar louvável esta defesa da privacidade das pessoas, que em
alguns países, como EUA e o Reino Unido, é considerada de importância menor do
que facilitar a ação de órgãos do governo, através de escuta clandestina dos
meios de comunicação.
É intenção nossa discutir este assunto em outra oportunidade.
Nesta coluna trataremos de tentar explicar um pouco sobre alguns dos mecanismos
que deverão ser utilizados para alcançar os objetivos do decreto, especialmente
no que trata da dotação dos "órgãos ... da Administração Pública Federal de
instrumentos ... que os capacitem científica, tecnológica e administrativamente
a assegurar a confidencialidade, a integridade, a autenticidade, o não-repúdio e
a disponibilidade dos dados e das informações tratadas, classificadas e
sensíveis".
Historicamente, a confidencialidade na comunicação entre pessoas podia ser
garantida pela realização de encontros reservados.
Para a comunicação à distância, seria necessário enviar mensagens através de
intermediários, e para manter a confidencialidade foram desenvolvidos códigos e
cifras para esconder o conteúdo das mensagens dos bisbilhoteiros que as
interceptassem, como dos próprios intermediários.
A criptografia é a ciência de desenvolver e quebrar tais cifras e vem sendo
utilizada há séculos, principalmente nas áreas diplomáticas e militares dos
governos.
As telecomunicações aumentaram a rapidez e confiabilidade da comunicação remota.
No século 20, o uso da criptografia foi automatizado, para tornar mais rápida e
eficaz sua aplicação.
A segunda guerra mundial incluiu notáveis avanços na aplicação da eletrônica, e
o primeiro computador eletrônico, o
Colossus,
foi desenvolvido pelos ingleses para decifrar as comunicações alemãs, cifradas
pelo aparelho mecânico Enigma.
Durante a guerra fria que seguiu-se à segunda guerra mundial, o uso de
criptografia por computadores ficou sob forte controle governamental.
Foram criados grandes centros de escuta e análise de comunicações, tais como o
General Communications Headquarters - GCHQ (Inglaterra) e a
National Security Agency - NSA (EUA).
A criptografia manteve-se assunto de segurança nacional e nos EUA era proibida a
exportação de hardware e software de computadores que
incorporassem tecnologia criptográfica.
A própria existência destes itens não exportáveis criou pressões contra o
controle.
Com o início do uso das redes de computadores nas áreas comercial e financeira
nos anos 70, tornou-se possível o envio de informações e desejável proteger seu
sigilo.
Com o uso comercial da Internet, a partir do final dos anos 80 esta proteção
seria essencial porque a informação seria transmitida por redes públicas, ao
invés de privadas, e as multinacionais iriam querer proteger a comunicação com
suas filiais no exterior.
Ao mesmo tempo, a abertura comercial da Internet trouxe o comércio varejista,
com o acesso domiciliar aos bancos e ao comércio em geral.
Isto seria impensável sem a proteção do sigilo das transações.
Felizmente, a criptografia já estava se libertando dos controles
governamentais, e teve forte evolução "civil" a partir dos anos 70.
Em 1976 foi proposta a criptografia assimétrica, mais segura do que a
tradicional criptografia simétrica.
Na simétrica, a comunicação confidencial é possível somente se ambos os
correspondentes tiverem conhecimento do segredo (chave) usado para cifrar as
informações.
Seu uso requer a prévia "distribuição" deste segredo, sem o qual será impossível
decifrar a mensagem.
Além disto, um segredo compartilhado deixa de permanecer secreto.
Na criptografia assimétrica, a pessoa cria um par de chaves, uma das quais ela
mantém secreta, e a outra, chamada "chave pública", é informada a seus
correspondentes.
Na comunicação confidencial, o remetente cifra uma mensagem, usando a chave
pública do seu receptor, enquanto o receptor a decifra com sua própria chave
secreta.
A descoberta da criptografia assimétrica, também chamada criptografia de chave
pública, foi a maior avanço em criptografia em séculos.
Além de proteger a confidencialidade, ela pode ser usada para permitir
identificar a adulteração de mensagens recebidas, e para identificar o seu
remetente, através de uma "assinatura digital".
Em 1978 foi criado o algoritmo RSA (dos nomes dos seus autores Rivest, Shamir
e Adleman), que até o momento é a forma mais usada de criptografia assimétrica.
Mas foi apenas nos anos 90 que seu uso se tornou amplo em comunicação entre
desconhecidos, como em transações seguras na WWW, e no correio eletrônico
seguro.
Estas aplicações requerem a intermediação de "cartórios eletrônicos", como
aqueles operados pelas empresas Verisign
ou Certisign, esta última brasileira,
responsáveis pela certificação dos donos das chaves públicas.
Uma das ações previstas no decreto 3.505 é "conceber, especificar e coordenar a implementação da infra-estrutura de chaves públicas a serem utilizadas pelos órgãos e pelas entidades da Administração Pública Federal". Em outras palavras prevê-se a criação dos cartórios eletrônicos necessários para o uso da criptografia assimétrica na comunicação governamental.
Finalmente, observa-se no decreto 3.505 justificada preocupação com a
capacitação de recursos humanos para realizar os trabalhos necessários.
Porém, na composição do Comitê Gestor interministerial criado para prestar
assessoria na implementação das ações previstas no decreto, causa surpresa a
omissão do Ministério da Educação, responsável para o ensino superior em geral,
e pelas universidades federais em particular.
Felizmente, o último item do decreto permite que esta omissão seja corrigida
pelo próprio Comitê Gestor.