Michael Stanton

WirelessBrasil

Ano 2001       Página Inicial (Índice)    


30/09/2001
Redes ópticas no Brasil: a infra-estrutura física

Na coluna de 8 de janeiro abordamos o tema das redes ópticas, ainda no plano das possibilidades eventuais. Descreveu-se como é seria possível conseguir transmitir terabits por segundo por meio de uma única fibra óptica pelo uso de DWDM (Dense Wave Division Multiplexing, ou multiplexação de comprimentos de onda de alta densidade), o que viria a baixar substancialmente os custos de transmissão de longa distância.
O impacto disto na comunicação de longa distância está se tornando evidente em alguns países, pois caem vertiginosamente seus custos ao consumidor, e há companhias telefônicas cujos preços de chamadas não dependem mais na distância até o outro terminal. Basicamente toda a telefonia tende a ter o preço da telefonia local.

O impacto nas aplicações Internet é de outra ordem. Além de possibilitar tempos de resposta mais curtos, basicamente por eliminar gargalos no interior da rede, são viabilizadas aplicações antes impossíveis por simples falta de capacidade das redes.
Aqui falamos principalmente de transmissão de vídeo de alta definição, o que requer vários megabytes por segundo de banda.
A promessa é poder suportar milhares de transmissões simultâneas deste tipo.

Vários países hoje estão montando projetos pilotos de redes ópticas deste tipo para ganhar experiência com sua operação e utilização.
Neste projetos pilotos tipicamente participam instituições de P&D (pesquisa e desenvolvimento), tanto acadêmicas como industriais.
Uma das experiências mais interessantes atualmente é da rede canadense, que foi uma das pioneiras (www.canarie.ca).
Mas há várias outras em fase de planejamento e/ou implantação nos EUA (v. www.cenic.org/ONI.html) e na Europa (v. www.gigaport.nl e www.dante.net/geant/index.html).
Seria possível fomentar também uma iniciativa destas no Brasil?

A resposta é positiva. As condições materiais existem, em termos de recursos físicos e humanos. Felizmente os recursos humanos existem nas instituições em função dos investimentos que vêm sendo realizados durante muitos anos na formação de núcleos de pesquisa e pós-graduação nas universidades.
Equipamentos há, geralmente importados, mas já começam a ser fabricados no país.
O principal empecilho físico seria a falta de conectividade óptica de longa distância.
Porém, há vários anos vêm sendo realizados trabalhos de instalação de cabos ópticos entre as cidades e estados em boa parte do país.
Além das empresas tradicionais de telecomunicações, há uma série de rostos novos atuando nesta área, incluindo empresas de energia e de transportes.

A razão da entrada destas empresas é fácil de explicar.
As redes tradicionais de telecomunicações eram de rádio, e um enlace de vários centenas de quilômetros entre duas cidades necessitava da construção de algumas poucas torres altas ao longo do caminho entre estas cidades, para a montagem das antenas dos equipamentos de rádio, geralmente separadas por distâncias de 60 km ou talvez mais, de modo a ter visada direta das antenas vizinhas.
Com a substituição de rádio por fibra óptica, passou a ser necessário estender fisicamente o cabo de fibra entre as cidades.
Onde antes a construção de um enlace interurbano requeria apenas conseguir acesso a uns poucos terrenos para poder erigir as torres de rádio, agora passou-se a precisar dos direitos de passagem do cabo de ponto a ponto - uma situação inédita para as companhias de telecomunicações de longa distância.
Entretanto, o direito de passagem física entre cidades já havia sido obtida para as linhas de transmissão de energia elétrica, os dutos de gás e petróleo, e as estradas de ferro e de rodagem. E são justamente as empresas que atuam nestas atividades que correram nos últimos anos para explorar suas vantagens naturais de já possuírem caminhos físicos para a instalação de cabos.

As estradas de ferro e de rodagem permitem facilmente a instalação subterrânea dos cabos, e tipicamente chegam a pontos próximos dos centros das cidades visitadas.
Os oleodutos e gasodutos tendem a passar mais longe dos centros de população, interligando refinarias ou centros de distribuição dos produtos transportados, tipicamente nas periferias das cidades.
O caso das redes de transmissão de energia elétrica é particularmente interessante, pois seus cabos chegam em última análise a cada prédio de cada cidade, além de possuírem boa conectividade entre cidades.
Isto acontece em países como Brasil, onde a energia freqüentemente é gerada a centenas de quilômetros do consumidor, e existe uma rede nacional para permitir transportar energia entre regiões distintas, por exemplo, da usina hidrelétrica de Tucuruí no Pará para o nordeste do país.
No caso das linhas de transmissão de alta tensão, é usada a técnica interessante de substituir o cabo mais alto, usado para proteção contra raios, por outro recheado com fibras ópticas, chamado de OPGW (OPtical Ground Wire).

Em conseqüência, já existe uma série de alternativas que oferecem a requerida conectividade física por fibras ópticas, e a escala destas iniciativas é consoante com as dimensões do Brasil. Para citar só um exemplo, a rede da empresa Eletronet, que explora as linhas de transmissão das companhias de geração de energia elétrica do governo federal, se estende de Belém do Pará ao Rio Grande do Sul (www.eletronet.com/rede/default.asp).

As conexões de longa distância precisam ainda ser conjugadas com o acesso local, entre o ponto de chegada da conexão de longa distância e o cliente final.
Nas áreas urbanas, também tem diferentes alternativas de provisão desta conexão: as redes de cabos das companhias tradicionais de telecomunicações e da TV a cabo são as mais óbvias.
Mas estas vêm sofrendo a concorrência de outras alternativas, incluindo, mais uma vez, as empresas de distribuição de energia elétrica, com seus postes e suas galerias subterrâneas.
Outras opções incluem as ferrovias subterrâneas e suburbanas, e as companhias de saneamento, pelo menos nas cidades onde existem redes de esgotos.
Finalmente, poderiam atuar nesta área os próprios governos municipais, uma vez que estes detêm o controle do uso do solo, especialmente nas vias públicas.
Em Campinas, por exemplo, é reportado que a prefeitura exige que, de qualquer cabo de fibras lançado nas ruas, algumas fibras sejam reservadas para uso da prefeitura.
Em certas províncias do Canadá, são os próprios municípios que investem em cabeamento de fibra óptica, e acabam provendo os meios de comunicação para as novas tecnologias, com evidente prioridade para as escolas, hospitais e outras entidades de interesse comunitário.
No Brasil, pareceria ser um excelente investimento dos recursos do FUST (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações) a criação de uma infra-estrutura semelhante para uso comunitário.

E como seria pago pelos eventuais usuários o custo desta infra-estrutura criada pelos detentores dos direitos de passagem das cabos ópticos?
O modelo tradicional usado aqui é este detentor instalar seus próprios equipamentos de telecomunicações e vender para os interessados serviços de telecomunicações.
Vivem disto há muitos anos as companhias tradicionais de telecomunicações, e algumas das novas empresas procuram seguir pelo mesmo caminho.
Esta solução é apropriada em alguns casos, mas não em todos.
O outro modelo que vem sendo adotado é a locação de fibras apagadas pelas empresas que são os donos dos cabos. Neste caso, o cliente adquire o IRU (Indefeasible Right of Use - direito de uso irrevogável) de uma ou mais fibras do cabo, por períodos entre 10 e 25 anos.
Basicamente, este cliente estaria comprando uma parte da capacidade física do cabo, que então iluminaria com equipamentos próprios.
Os valores internacionais para IRU são em torno de US$ 2.000 por km para um par de fibras, por período de 25 anos, o que é considerado remunerar adequadamente o capital investido pelo dono do cabo.

A tendência, como ilustrada pelo exemplo do Canadá, é muito clara: algumas das futuras redes serão comunitárias, com a infra-estrutura montada, equipada e operada por uma comunidade de interesse público. No caso da fibra óptica, isto seria obtida por aquisição de IRU do dono do cabo de fibra óptica.
Este modelo tem grande aplicabilidade para atender melhor e mais barato às comunidades servidas do que o modelo atual de comprar serviços de telecomunicações de uma operadora pública, especialmente quando se trata de oferecer acesso a uma rede Internet avançada.
É preciso debruçar sobre estas alternativas e usá-las criativamente para atender adequadamente às necessidades nacionais.