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[12/11/13]  E o TAC subiu no telhado... - por Mariana Mazza

Há anos a Anatel assim como outras agências reguladoras sofre para fazer valer as multas aplicadas contra as empresas por falhas na prestação do serviço e descumprimento de obrigações. Donas de um pesado sistema de contestação das punições, as companhias telefônicas na maioria das vezes conseguem escapar das penas apelando para o Poder Judiciário. É claro que há também falhas administrativas. A quantidade de processos à beira da prescrição na Anatel é chocante. O volume é tão grande que, no passado, chamou a atenção da Advocacia Geral da União (AGU), embora pouco tenha sido feito para, de fato, evitar que os processos caiam no esquecimento sem a devida conclusão.

Nos últimos tempos, a Anatel passou a investir em uma estratégia pouco ortodoxa para solucionar o problema. Há meses a agência trabalha na regulamentação do uso de Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) como a principal ferramenta para conter a degradação do serviço telefônico. Muitos setores usam TACs para corrigir falhas no mercado. Normalmente eles são vistos em casos que envolvem práticas anticoncorrenciais, sendo muito utilizados nas esferas do Ministério da Justiça. Na prática, o TAC permite que a autoridade pública firme um acordo com a empresa que está cometendo a infração, exigindo a correção imediata da falha em troca do congelamento do processo de punição. Caso o termo seja descumprido, ai sim a companhia seria punida com multa.

Este é um instrumento bastante eficiente para condutas com impacto direto no consumidor ao corrigir de forma praticamente imediata a prática que está lesando o usuário. Ao invés de esperar longos meses ou anos para, só então, punir a empresa infratora e, ainda assim, sem a certeza de que o dano causado será remediado, a autoridade pública encurta todo esse processo firmando um acordo.

Mas existe uma pegadinha no TAC sonhado pela Anatel que deixa muitos advogados de cabelo em pé. O alvo preferencial dos termos que estão sendo elaborados pela agência reguladora é a conciliação de punições já definidas e não pagas pelas empresas. Seria um saldão de multas, um mutirão de conciliação. O representante da companhia que por anos protelou o pagamento das penas impostas pela agência seria convidado a se sentar confortavelmente em uma sala na Anatel, assinaria um acordo e apagaria do mapa todo o histórico de dívidas. E o que o Estado ganharia em troca? Uma promessa de investimentos da companhia ex-devedora.

Desde que esta ideia surgiu, há aproximadamente três anos, muita gente de peso criticou a proposta, como o procurador do Ministério Público Federal da Paraíba, Duciran Farena. A demora da Anatel em editar o tal regulamento sugere que a agência tem tido dificuldade em equacionar o projeto. Em tese, uma nova regra deveria valer apenas para situações futuras e não para corrigir o passado. Fosse a proposta de TAC algo negativo para as empresas, é certo que o pelotão de advogados das teles já estaria esperneando há muito tempo. Mas como a proposta tem o poder de passar uma borracha sobre os pecados já cometidos pelas operadoras, há um silêncio sepulcral sobre o assunto.

Mas este silêncio foi quebrado na semana passada pelo Senado Federal. A Comissão de Ciência e Tecnologia aprovou um projeto do senador Vital do Rêgo Filho (PMDB/PB) limitando o uso dos TACs pela Anatel apenas à processos que estão em primeira instância no trâmite da agência. O ponto-chave da proposta é justamente evitar a troca das multas por investimentos, como a reguladora tanto deseja. O relator do projeto, senador Lobão Filho (PMDB/MA), foi bastante direto ao descrever o problema da proposta em elaboração na autarquia. "Ora, se a agência entende que o TAC deve substituir o pagamento de multas, seria um desincentivo às operadoras arcar com investimentos adicionais àqueles necessários para resolver as irregularidades apontadas".

O senador tem toda razão. Por que raios uma empresa irá investir na solução de problemas na oferta de serviços se ela sabe que logo adiante a agência reguladora, ao invés de multa-la, vai assinar um acordo com ela "exigindo" que ela faça os aportes que já deveria ter feito? No fim, as companhias só ganham com os TACs no formato previsto pela Anatel. Economizam investimentos e, ainda por cima, sabem que não serão multadas nunca. Farena usava uma alegoria para exemplificar essa distorção que ainda penso ser a mais clara de todos. Seria o mesmo que um motorista ser parado em uma blitz com os pneus carecas. E, ao invés de receber uma multa por descumprir o Código de Trânsito, receberia uma bronca do policial e seria obrigado a prometer que usará o dinheiro economizado na multa para comprar pneus novos.

O novo projeto legislativo deve ter uma tramitação rápida. A proposta de Rêgo Filho tramita em regime terminativo, o que retira a necessidade de a proposta ser votada em Plenário. Para ser enviada à Câmara basta agora a aprovação da Comissão de Constituição e Justiça. E se os deputados concordarem com a proposta e não alterarem o texto, o projeto sequer precisará voltar ao Senado. Este novo elemento pode adiar por mais tempo a deliberação da Anatel sobre os TACs. As teles, claro, irão pressionar para bloquear a proposta no Senado e agilizar o regulamento da agência reguladora. Muitas empresas possuem dívidas monstruosas e os TACs, como pensados pela Anatel, dariam um refresco nas contas. No caso da Oi, por exemplo, o total em multas não pagas ultrapassa o valor estimado de mercado da companhia: a tele vale aproximadamente R$ 8 bilhões e deve à Anatel R$ 10 bilhões.

O projeto no Senado simplesmente coloca os TACs como mais uma ferramenta para coibir os abusos praticados na prestação do serviço, mas sem o superpoder de apagar as multas já emitidas. A nova proposta mostra que este assunto está longe de ser pacificado e que a conversa de perdoar as dívidas das companhias em troca de uma singela promessa de investimentos futuros não foi engolida pelos senadores.