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Leia na Fonte: Band / Colunas
[07/01/14]  A norma rasa da Anatel - por Mariana Mazza

Mais um ano se inicia. Novos planos são traçados e se renova a expectativa de que as promessas passadas sejam, enfim, cumpridas. Esse ciclo de promessas não acontece só com os seres humanos. A administração pública funciona da mesma forma, renovando seu rol de projetos com um orçamento novinho em folha. No mundo das telecomunicações, 2014 certamente será um ano mais de realizações do que de promessas. Infelizmente, nem todas as realizações têm uma boa perspectiva sob a ótica do cansado consumidor.

Uma das ações mais aguardadas é que a Anatel coloque em prática seu novo regulamento de sanções. Ao longo de todo o ano passado, a agência discutiu uma reforma no modelo de punição das companhias telefônicas. Parece bom, não é? Em um dos setores mais reclamados do país, falar em multar as companhias telefônicas sempre parece uma boa medida. Mas o novo regulamento trouxe consigo uma grande polêmica: a possibilidade de fechar acordos com as teles para trocar as penalidades financeiras por projetos de investimento no setor.

Há algum tempo esse método tem sido utilizado informalmente. Na última grande crise no setor, envolvendo as operadoras móveis, a Anatel ao invés de multá-las, exigiu que cada uma delas apresentasse um plano de melhoria do serviço. Assim, as multas surgirão apenas se as companhias não cumprirem as promessas de investimento. A sensação que fica é que foi dada uma segunda chance para as empresas, apesar do enorme volume de reclamações feitas pelos consumidores e pela comprovação de que a operação está aquém dos níveis de qualidade exigidos pela Anatel.

Mas há uma situação ainda mais polêmica que esta. No novo regulamento, a agência reguladora institucionaliza o uso dos Termos de Ajustamento de Conduta (TAC), dispositivos muito utilizados em casos de cartel pelo sistema antitruste. No caso das telecomunicações, os TACs seriam usados para conciliar processos que já estão em andamento dentro da Anatel. Uma forte corrente dentro da agência defende, inclusive, que os acordos sejam aplicados para equacionar processos já encerrados e com multas expedidas. Ou seja, a empresa descumpriu as normas da Anatel, foi multada e, ainda assim, ganha um "prêmio" ao assinar um acordo para não pagar penalidade alguma em troca de uma promessa de investimento. Investimentos estes que, se tivessem sido feitos antes teriam evitado as falhas que geraram a multa. É um absurdo.

Apesar de estranha, há uma forte chance dessa lógica ser aplicada. O motivo é o nível de endividamento das empresas de telecomunicações. O exemplo mais utilizado é o da Oi. Em novembro do ano passado, a companhia valia R$ 8 bilhões. E, segundo dados extraoficiais, a dívida em multas não pagas à Anatel já soma R$ 10 bilhões. Não custa lembrar que esses valores só são tão altos porque as empresas não pagam essas penas há anos (e, em muitos casos, porque a Anatel não as executa). Sendo assim, só um TAC nos moldes sonhados pela agência reguladora será capaz de fechar essa conta.

A distração da Anatel ao batizar o novo regulamento que permitirá esse exercício matemático deu um motivo para os críticos do projeto sorrirem. O Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas está sendo chamado dentro da agência pela sua sigla: RASA. É uma boa sigla para um norma que, ao invés de fechar o cerco contra a má prestação do serviço, poderá beneficiar as companhias que descumpriram as regras do setor ao longo dos anos. A norma RASA da Anatel deve fazer rir até os advogados das empresas de telefonia, embora eles tenham muito o que comemorar. Se não foi uma ironia proposital, o nome dado só pode ser fruto de um ato falho administrativo.

O fechamento desses acordos deve ser o ponto alto de um ano politicamente tumultuado por conta das eleições e da Copa do Mundo. Existem outras promessas de ano novo circulando no setor, como a realização de leilões de radiofrequência e mais meia dúzia de ações complexas demais para serem desenterradas em um ano com uma agenda tão cheia. Boa parte da energia da agência estará voltada em evitar problemas nas comunicações durante a Copa. Já se fala em uma programação orçada em R$ 170 milhões, com foco na fiscalização das companhias em 2014. Os TACs devem entrar nesse pacote de ações pró Copa, como um "incentivo" à conclusão dos projetos de ampliação da infraestrutura. É esperar pra ver.