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Márcia Furukawa Couto |
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2 - Canais Parvocelular, Magnocelular e Koniocelular:
A anatomia do sistema visual de primatas tem sido intensamente estudada em
macacos, cujo sistema visual é semelhante ao do ser humano em muitos aspectos.
A via óptica começa na retina, passa pelo corpo geniculado lateral, chega ao
córtex visual estriado e desta vai para um mosaico de áreas corticais
extraestriadas. A partir de informações anatômicas, fisiológicas e
comportamentais, foram descritas trinta e duas áreas corticais distintas
associadas ao sistema visual. Vinte e cinco são primariamente visuais em
função e as outras sete servem à integração multi-sensorial ou controle motor
guiado pelo sistema visual. Integrando as trinta e duas áreas, foram
identificadas trezentas e cinco vias de interconexão (Van Essen et al., 1992).
As retinas dos primatas tricromatas possuem quatro tipos de fotorreceptores:
(i) bastonetes; (ii) cones S; (iii) cones M; e (iv) cones L. Os cones S
possuem pigmento com pico de sensibilidade para a cor azul, os cones M para o
verde e os cones L para o vermelho. Os fotorreceptores retínicos conectam-se a
células ganglionares ainda na retina através de complexos circuitos nervosos,
de tal modo que cada célula ganglionar possui um campo receptor do qual
participa um número variável de fotorreceptores em duas áreas concêntricas
oponentes (centro “on” e periferia “off” ou centro “off” e periferia “on”). (Hubel
e Wiesel, 1966).
Os axônios das células ganglionares fazem conexão com o corpo geniculado
lateral definindo três vias principais de processamento, que são a
magnocelular, parvocelular e koniocelular. Cerca de 80% das células
ganglionares retínicas são do tipo midget e conectam-se à via parvocelular;
10% são do tipo parasol e conectam-se à via magnocelular (Perry et al., 1984);
9% são do tipo biestratificado e conectam-se à via koniocelular (Kaas et al.,
1978). O corpo geniculado lateral apresenta seis camadas, sendo as duas
ventrais magnocelulares, as quatro dorsais parvocelulares e as camadas
intermediárias koniocelulares. Foram identificadas células koniocelulares
também dentro das camadas parvo e magnocelulares (Hendry e Yoshioka 1994;
Hendry e Reid, 2000).
Propriedades fisiológicas dos neurônios de cada via indicam que elas processam
diferentes informações visuais. Cerca de 90% dos neurônios parvocelulares
apresentam oponência de cor vermelho/verde através da aquisição de informação
de um cone L ou M para o seu campo receptor central e um ou dois cones
antagonistas para o seu campo receptor periférico. Os campos receptores dos
neurônios parvocelulares são menores do que os campos dos magnocelulares,
conferindo a eles alta resolução espacial. Suas respostas ao estímulo são
lentas e mantidas, conferindo a eles baixa resolução de estímulos em movimento
(Livingstone e Hubel, 1987).
Campos receptores de neurônios magnocelulares recebem informação de cones L, M
e provavelmente também dos S. São chamados de “banda larga”, e em geral não
codificam cores, embora alguns deles mostrem alguma sensibilidade a este
parâmetro, ao serem tonicamente suprimidos por luz vermelha difusa e não por
luz branca. Os neurônios magnocelulares são mais sensíveis a variações de
luminância do que os parvocelulares. Respondem bem a estímulos com menos de
10% de contraste luminoso, mas saturam em contrastes menores do que os
parvocelulares. Os magnocelulares possuem menor resolução espacial devido aos
seus campos receptores duas a três vezes maiores do que os campos receptores
dos parvocelulares, em qualquer excentricidade. Os magnocelulares apresentam
ainda menor latência e respostas transitórias ao estímulo, e por isso são mais
sensíveis a altas frequências e processam estímulos em movimento. (Livingstone
e Hubel, 1987).
Os neurônios koniocelulares foram identificados mais recentemente (Kaas et
al., 1978; Casagrande, 1994) e morfologicamente são células muito pequenas
(descritas “pequenas como poeira”). Possuem moderada resolução espacial e
velocidade de condução intermediária. Seus campos receptores recebem
informação de cones S, com a característica de azul “on” e oponência
azul/amarelo (Casagrande, 1994).
Portanto, a via parvocelular possui células sensíveis ao canal de oponência
vermelho/verde, alta resolução espacial (campos receptores pequenos) e baixa
sensibilidade ao contraste e ao movimento (respostas lentas e longas). A via
magnocelular possui células sensíveis ao movimento (respostas rápidas e
transitórias aos estímulos de alta frequência temporal), baixa resolução
espacial (campos receptores grandes) e alta sensibilidade ao contraste
luminoso. A via koniocelular possui células sensíveis ao canal de oponência
azul/amarelo, resolução espacial intermediária e alta resolução ao estímulo em
movimento. Estas características estão bem estabelecidas e separadas entre si
nas vias visuais até o corpo geniculado lateral. Ao nível do córtex visual
primário a segregação é anatomicamente coerente, mas devido a substanciais
interconexões em vários níveis percebe-se que os três sistemas tornam-se
intimamente integrados para fornecerem então informações para o reconhecimento
de objetos e relações espaciais tridimensionais (Van Essen, 1992; Sincich e
Horton, 2005).