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Márcia Furukawa Couto |
Universidade de Brasília
Instituto de Ciências Biológicas
Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal
Preenchimento Perceptual em Tricromatas e Dicromatas
Autora: Márcia Furukawa Couto
Tese apresentada como parte dos requisitos para defesa de doutorado no
Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal da Universidade de Brasília
Orientador: Professor Doutor Valdir Filgueiras Pessoa
Brasília, abril 2006
Agradecimentos:
Aos voluntários que participaram deste trabalho, pela infinita paciência.
Ao Professor Doutor Valdir Filgueiras Pessoa pelo apoio e muitas idéias na
orientação deste trabalho.
À Lúcia Furukawa Couto pelas críticas ferozes.
Ao Laboratório de Neurociências e Comportamento.
A versão integral deste trablho, em formato .doc, pode ser obtida aqui: Download arquivo .zip
Preenchimento Perceptual em Tricromatas e
Dicromatas
Resumo:
Introdução: Um objeto estacionário no campo visual periférico desaparece
após alguns segundos de fixação. Esse fenômeno, conhecido como efeito de Troxler,
é atribuído ao preenchimento perceptual. A latência deste efeito é influenciada
por características da imagem (tamanho, estabilidade, excentricidade, bordas,
cor e brilho do objeto). Os objetivos deste trabalho são:
(i) avaliar a latência de preenchimento perceptual usando variados parâmetros de
imagem; e
(ii) comparar esse efeito entre tricromatas e dicromatas.
Métodos: Foram realizados três experimentos. No primeiro experimento o
objeto a ser preenchido foi cinza; no segundo estereoscópico; e no terceiro
colorido de acordo com os canais de oponência azul/amarelo, verde/vermelho e
acromático, testado em duas excentricidades. Em todos os testes variamos a
posição do objeto no campo visual.
Resultados: Para tricromatas e dicromatas houve maior latência de
preenchimento nas posições campimétricas:
(i) horizontais comparadas com verticais; e
(ii) inferiores comparadas com superiores. Não houve diferença entre as posições
estereoscópicas. Tricromatas apresentaram maior declínio centro-periferia nos
canais de oponência azul/amarelo e acromático do que no verde/vermelho,
contrariando características retinotópicas destes canais. Dicromatas
apresentaram declínio centro-periferia não significativo no canal de oponência
azul/amarelo.
Conclusões:
(i) existe forte efeito da posição bidimensional do objeto na latência de
preenchimento perceptual;
(ii) não há influência de variações na posição espacial tridimensional do objeto
na latência de preenchimento para valores de disparidade aqui testados;
(iii) tricromatas apresentam influência de áreas corticais não retinotópicas
para o preenchimento de cor; e
(iv) os dicromatas possuem seu único canal de oponência de cor (azul/amarelo)
mais homogeneamente distribuído no campo visual do que os tricromatas.
Title: Perceptual filling-in: a comparison
between trichromats and dichromats
Abstract:
Introduction: A stationary object at the peripheral visual field disappears
after a few seconds of fixation. This phenomenon, known as Troxler’s effect, is
attributed to perceptual filling-in. The filling-in latency is influenced by the
image characteristics (object size and stability, eccentricity, borders, color
and brightness). The purposes of this investigation are:
(i) to evaluate the influence of different visual parameters on the perceptual
filling-in latency; and
(ii) to compare filling-in results between trichromats and dichromats.
Methods: Altogether there were three experiments with filling-in targets
as follows: (i) the first one was gray; (ii) the second one was stereoscopic;
and (iii) the third one was colored for blue/yellow, red/green and achromatic
opponent channels, tested at two eccentricities. In all the experiments the
filling-in was tested at different visual field positions.
Results: Both trichromats and dichromats showed a longer filling-in
latency for the following visual field positions:
(i) horizontal as compared to vertical;
(ii) inferior as compared to superior. There was no filling-in difference when
the stereoscopic positions were changed. Trichromats presented higher center to
periphery decline for blue/yellow and achromatic than red/green opponent
channels, contrary to their retinotopic characteristics. Dichromats presented a
nonsignificant center to periphery filling-in latency decline for the blue/yellow
channel.
Conclusions:
(i) the object’s visual field position strongly influences the filling-in
latency;
(ii) there is no influence of the object’s three-dimensional space position on
the filling-in latency with the disparity values tested;
(iii) trichromats presented influence of non-retinotopic cortical areas on the
color filling-in; and
(iv) the dichromat’s only color opponency channel (blue/yellow) is more evenly
distributed throughout the visual field than the trichromat’s.
*
Introdução e Revisão da Literatura:
1 - Preenchimento perceptual:
O preenchimento perceptual é uma estratégia largamente utilizada pelo sistema
visual. Trata-se de atividade cerebral que permite o preenchimento de
determinada área do campo visual, tornando:
(i) imperceptíveis os escotomas (áreas cegas) naturais tais como os gerados pela
papila e pela trama vascular e os escotomas adquiridos em lesões das estruturas
anatômicas do sistema visual;
(ii) imperceptíveis também os breves momentos de escuridão durante o piscamento
e os momentos de borramento da visão durante os movimentos sacádicos (Billock,
1997); e
(iii) menos onerosa (do ponto de vista computacional) e mais rápida a visão das
superfícies dos objetos (Ramachandran, 1992), considerando que o processamento
visual de um objeto ocorra em duas etapas: primeiro a aquisição das suas bordas
e em seguida o preenchimento de sua superfície ao invés de processá-la ponto a
ponto.
O preenchimento perceptual é também evidente em fenômenos visuais ilusórios. A
seguir alguns exemplos, tais como o triângulo de Kanizsa, o efeito neon, o
efeito de Craik-O’Brien Cornsweet.
O triângulo de Kanizsa, representado na figura 1A, aparenta ser mais brilhante
do que o ‘fundo’, havendo indução não somente das suas bordas, mas também o
preenchimento da sua superfície.
Figura 1A
No efeito neon as cores se espalham como uma transparência, que pode ser vista
na figura 1B entre as faixas da porção amarela e também entre os discos.
Figura 1B
No efeito de Craik-O’Brien Cornsweet o brilho das
bordas induz alterações na aparência da superfície.
Todas faixas da figura 1C possuem a mesma luminância em sua porção central, mas
uma discreta alteração de brilho nas bordas se espalha por toda faixa (Seghier e
Vuilleumier, 2006; Sasaki e Watanabe, 2004; Davey et al., 1998).
Figura 1C
Sobre a autora:
Márcia Furukawa Couto (marciacouto@gmail.com)
possui graduação em medicina (1985) e residência médica (1987) pela Universidade
de Brasília, especialização pelo Kellogg Eye Center da University of Michigan
(1991), mestrado em Ciências da Saúde pela Universidade de Brasília (1999) e
doutorado em Biologia Animal pela Universidade de Brasília (2006). É membro
titular do Conselho Brasileiro de Oftalmologia. Tem experiência na área de
oftalmologia clínica e cirúrgica com ênfase em estrabismo.